Uefa planeja Champions com 36 clubes, classificação via ranking e sistema suíço

Parece inevitável que a Champions League mude a partir de 2024, quando acaba o acordo atual de competições da Uefa com os clubes. O fantasma de uma Superliga independente parece afetar as discussões e houve discussões sobre possíveis mudanças, entre as quais estão o aumento da fase de grupos para 36 times, além de algumas vagas definidas via ranking. Embora aceitem algumas mudanças, parte das propostas preocupa as ligas nacionais.
Houve uma reunião nesta sexta-feira entre a Uefa e as ligas nacionais, além da European Clubes Association (ECA), que reúne 232 dos principais clubes da Europa. A entidade que dirige o futebol europeu apresentou planos de um novo formato para a Champions League a partir de 2024, com uma liga de 36 times substituindo a atual fase de grupos e com um total de 10 jogos por equipe.
A disputa seria no chamado “sistema suíço”, usado em outras modalidades, como o xadrez. É um sistema não eliminatório com um número definido de rodadas, que neste caso seria de 10, e que os times só enfrentam outros com pontuação igual ou similar à sua. Por exemplo: a rodada inicial seria sorteada. Na segunda, o sorteio seria dirigido: quem venceu na primeira rodada só enfrenta quem também venceu; quem perdeu só enfrenta quem perdeu; e assim por diante. A classificação se dá por pontos, tal qual a fase de grupos.
Seria uma forma de fazer a Champions ter muitos duelos de grandes times, para valorizar a competição. O European Leagues diz no seu comunicado que o sistema suíço “é uma melhora comparado a propostas mais radicais que emergiram em 2019”. Isso porque a ideia de Andrea Agnelli, presidente da Juventus e da ECA, era um modelo de liga fechada, com acesso e rebaixamento, o que tem sido chamado de Superliga. A ideia de um sistema suíço, dentro de propostas tão exclusivas quanto a Supeerliga, parecem até viáveis. Ubiratan Leal explica como funciona o sistema suíço no vídeo abaixo:
Isso significaria quatro jogos extras em relação aos seis atuais da fase de grupos, o que poderia ser um problema sério para muitas ligas. A Inglaterra, por exemplo, tem um calendário muito congestionado. Uma competição como a Copa da Liga ficaria seriamente ameaçada. As preocupações com o aumento do número de jogos em um calendário já muito congestionado é legítima, já que este é um problema enfrentado atualmente.
O grupo European Leagues, que reúne 37 ligas de 30 países diferentes, se reuniu na sexta-feira para discutir as propostas apresentadas. Embora tenha gostado de alguns aspectos propostos, o grupo mostrou preocupações sérias com outros. “O European Leagues levantou grandes preocupações sobre mais rodadas em um sistema tão flexível em um calendário já muito congestionado”, diz comunicado do grupo.
Apesar de não ter gostado da ideia do aumento de seis para 10 jogos na fase inicial da Champions League, o grupo consideraria se a mudança fosse para oito jogos no total, segundo fontes informaram ao Guardian, jornal inglês.
Outro ponto que causou insatisfação das ligas é um novo sistema de classificação. A proposta da Uefa é ter três vagas via ranking, que levaria em conta o histórico de resultados. Ou seja, clubes grandes, com histórico vencedor, teriam uma outra chance de se classificar à Champions League. Manchester United, Real Madrid ou mesmo Milan teriam uma chance extra de chegar ao torneio.
As ligas preferem que todas as quatro vagas sejam usadas para dar uma vaga direta a esta fase para campeões de outros países, hoje não contemplados com vagas diretas, e não que as vagas acabem ficando, indiretamente, com clubes das cinco grandes ligas, que estariam sempre à frente no ranking.
“Questionamos também o possível impacto do acesso, assim como os componentes comerciais no equilíbrio esportivo e financeiro das ligas domésticas. Finalmente, discutimos diversas opções em relação à redistribuição financeira”, diz ainda o comunicado do Europan Leagues.
Para definir os times que avançariam às oitavas de final, a proposta é a seguinte: os oito primeiros colocados se classificam diretamente; os 16 times seguintes disputam um playoff para definir os outros oito classificados. Seria uma espécie de “wild card”, como acontece em esportes americanos. Os oito que vencerem os playoffs se unem aos oito previamente classificados para as oitavas de final, que seguiria normalmente como é atualmente: quartas de final, semifinal e final em jogo único.
Tudo isso implica um aumento significativo do calendário. Atualmente, são 125 jogos na Champions League (contando fase de grupos e fase eliminatórias) e este número subiria para 225. Aqui está o principal motivo de preocupação das ligas nacionais, que temem perder relevância – além das preocupações em relação a um potencial desequilíbrio se não houver uma distribuição de renda melhor que a atual.
Ainda não se sabe como seria a distribuição de dinheiro desta nova Champions League. Há ligas que defendem que ao menos parte da premiação dada individualmente aos clubes seja redistribuída dentro da própria liga, como a Holanda começou a fazer. Parte da premiação que os clubes do país recebem são redistribuídos para os outros clubes da primeira divisão. Uma tentativa de impedir que os clubes frequentemente na Champions League se tornem tratores que amassem os rivais nas ligas locais, algo que acontece com frequência nas ligas menores, mas que também acontece, em menor medida, em ligas maiores.
As propostas precisarão ser discutidas com todos os envolvidos, incluindo aqui não só os clubes, as ligas e a Uefa, mas também os torcedores. Afinal, são os torcedores o motivo da existência do futebol e são eles que precisam ser cativados para que o torneio siga sendo adorado como é atualmente. Se hoje já há preocupações em relação ao impacto da Champions League nas ligas locais, esse novo modelo levanta ainda mais preocupações. É preciso discutir com calma e com transparência para que as decisões não sejam um atropelamento dos interesses dos mais ricos sobre os demais, que é basicamente o que a ideia de uma Superliga pretende fazer.
Há uma enorme pressão contra a ideia de uma Superliga, não só das associações como a European Leagues, mas também de grupos de torcedores. Na semana passada, o Football Supporters Europe divulgou comunicado chamando a ideia de impopular, ilegítima e perigosa”. O que dá para perceber é que a Uefa está sentindo a pressão dos clubes e sabe que precisa dar a eles alguma coisa para matar a ideia de uma Superliga que se separe da entidade. Encontrar esse equilíbrio entre tantas partes exigirá muita habilidade de negociação.