Não foi perfeito, mas foi monstruoso: É um prazer ver Neuer voando sob as traves
Às vezes a gente até se esquece do quanto Manuel Neuer é bom sob as traves. Natural, diante de suas obrigações nos últimos anos. O estilo de jogo proposto no Bayern de Munique e na seleção exige que o goleiro atue adiantado. Tornou-se clichê exaltar o alemão como o “goleiro-líbero”, de saídas arrojadas de sua área. Com seus times priorizando a posse, na maioria das vezes o camisa 1 acaba confrontado em contra-ataques ou nas bolas paradas. Raros foram os jogos nos últimos tempos em que foi bombardeado. No entanto, se Neuer aparece entre os melhores de sua posição nas últimas décadas, é muito mais por suas qualidades “tradicionais” na meta – aquilo que escancara desde os tempos de Schalke 04. Por isso mesmo, o jogo desta quarta foi tão importante para o craque de luvas. Não terminou perfeito, de fato. Mas serviu para relembrar o monstro que, por vezes, anda sumido.
VEJA TAMBÉM: Tudo desandou muito rápido para o Bayern contra um Real Madrid implacável
Quem mais gostou de relembrar a grandeza de Neuer, certamente, foram os torcedores do Bayern de Munique. Não que Sven Ulreich seja mau goleiro. Entretanto, o substituto nem de longe passa a mesma confiança. O titular permaneceu afastado do time desde o final de março. Sofreu uma lesão no pé e precisou ser submetido a uma cirurgia. Retornou justamente nesta quarta, em fogueira imensa contra o Real Madrid na Allianz Arena. Para mostrar que o tempo parado não o prejudicou em nada.
Desde o primeiro tempo, Neuer fez questão de escancarar que estava de volta. Aos 17 minutos, operou o primeiro milagre. Karim Benzema cabeceou firme, em direção ao chão, mas ele conseguiu desviar a bola com a ponta dos dedos, ajudado ainda pelo travessão. Já pouco antes do intervalo, após Arturo Vidal abrir o placar, o camisa 1 se esticou todo para espalmar o chute de Cristiano Ronaldo. O primeiro encontro com seu rival (e seu algoz) na noite. Inclusive, nos acréscimos, os dois chegaram a se estranhar em uma disputa pelo alto. Entreolharam-se, encararam-se, mas depois trocaram sorrisos.
Cristiano riu melhor no início do segundo tempo, em uma bola cruzada na qual o goleiro pouco pôde fazer. Só que, a partir de então, Neuer virou um paredão. Lance após lance, ia evitando a virada do Real Madrid. Bale cabeceou forte, no alto, e o alemão estava lá para desviar por cima do travessão. Benzema saiu de frente para o gol e bateu rasteio, mas o camisa 1 desviou com os pés. E no novo duelo com Cristiano Ronaldo, o ápice. A redonda veio limpa, pronta para o Bola de Ouro encher o pé. Melhor que um pênalti. Ele soltou a bomba. Neuer, de maneira impressionante, esticou o braço e salvou. Como um goleiro de handebol. Com uma confiança imensa. Como quem anteviu a jogada, antecipando o ponto exato onde o chute viria, com o punho firme e parado, esperando para rebatê-la. Se qualquer goleiro do mundo iria com as mãos abertas de encontro à bola para espalmar (e provavelmente não conseguiria, dependendo de uma agilidade tremenda), o arqueiro exemplificou por que é diferente. Foi mais rápido que o tempo. Fez o quase impossível parecer fácil.
VEJA TAMBÉM: Dois abraços, um tapa: Os segundos monumentais entre dois monumentos, Buffon e Iniesta
Só que a noite brilhante de Neuer ganhou um asterisco dois minutos depois, justamente diante de Cristiano Ronaldo. Quase da linha da pequena área, o camisa 7 se adiantou à marcação e desferiu a sapatada. A bola era à queima-roupa, mas veio em cima do goleiro e ele não defendeu. No placar, 2 a 1 Real. Poderia ter feito melhor? Sim. Seu erro foi tentar evitar o rebote. Posicionou-se para encaixar, mas a colocação das pernas acabou traindo o atraso de seus braços. Se fizesse o que outro goleiro menos confiante tentaria, rebatendo com os pés ou com uma manchete, provavelmente salvaria o lance. Uma falha, mas que não apaga todos os créditos por ter evitado um prejuízo maior.
Para quem acompanha Neuer além de seu estrelato, a noite em Munique relembrou outra jornada na Liga dos Campeões. Justamente em sua primeira participação no torneio continental, em sua segunda temporada como titular na equipe principal do Schalke 04. Em 5 de março de 2008, às vésperas de completar 22 anos, o promissor goleiro pegou tudo e mais um pouco diante do Porto. Evitou um prejuízo maior que a derrota por 1 a 0 em 120 minutos e se agigantou nos pênaltis, colocando os Azuis Reais nas quartas de final. Seu time não seria páreo ao Barcelona, mesmo vendendo caro a eliminação. De qualquer maneira, a partir daquele momento não havia mais dúvidas que aquele jovem se colocaria entre os melhores de sua posição. Foi e vai além.
A situação do Bayern de Munique na visita a Madri será delicada. Precisará buscar ainda mais o ataque e, primordialmente, contar com Robert Lewandowski na linha de frente. No entanto, a confiança aumenta quando Neuer retorna fazendo o que fez nesta quarta. Em uma Liga dos Campeões na qual os goleiros vêm se destacando, de Gianluigi Buffon (óbvio) a Kasper Schmeichel, de Marc-André ter Stegen a Jan Oblak, o alemão oferece uma das atuações mais impressionantes. Agora, se concentra em outro embate com o Real Madrid. Em 2012, decidiu nos pênaltis. Em 2014, acabou goleado. O destino dos bávaros, mais uma vez, está em suas mãos.