Champions League

Keylor Navas adicionou mais uma noite decisiva à sua gigantesca história na Champions

Os melhores reforços no futebol não são necessariamente os mais caros ou os mais midiáticos. Os €15 milhões desembolsados pelo Paris Saint-Germain para contratar Keylor Navas, afinal, possuem um significado bem maior do que indicam, considerando o salto dado pelo clube dentro da Champions League nas últimas duas temporadas. O costarriquenho chegou como um “especialista” no torneio, um protagonista no Real Madrid tricampeão, mesmo subestimado na Espanha. E a diferença que faz aos parisienses é tremenda. Se o PSG tinha encaminhado sua classificação contra o Barcelona no Camp Nou, a situação só foi segura o suficiente no Parc des Princes graças ao camisa 1. Com este empate por 1 a 1, Navas adicionou mais uma grande noite de Champions ao seu recheado currículo na competição, com direito a pênalti defendido contra Messi e outros milagres.

Navas é um dos melhores goleiros do mundo na última década, ainda que muita gente negue sua importância por falta de um sobrenome europeu. O costarriquenho foi um dos melhores da posição na Copa de 2014, foi um dos melhores de La Liga mesmo no Levante e, depois de se transferir ao Real Madrid, se transformou num dos arqueiros mais decisivos da Champions. O tricampeonato continental dos merengues entram bastante em sua conta, sobretudo pelas partidas gigantescas que fez em momentos de provação. Desdenhado pelos dirigentes no Bernabéu e quase repassado como moeda de troca ao Manchester United, deu sua volta por cima para ser um goleiro à altura do feito madridista naquela dinastia europeia.

Apesar de tudo, o Real Madrid voltaria a virar as costas para Navas, quando contratou Thibaut Courtois. O costarriquenho ainda ficou mais uma temporada no clube e salvou o time quando o belga não começou bem, mas, diante da falta de créditos com Zinédine Zidane, já era hora de buscar um novo clube e encontrar um lugar onde fosse devidamente valorizado. O Paris Saint-Germain parecia o destino perfeito. Por sua história e seu talento, afinal, o novo reforço era um goleiro do tamanho das ambições dos parisienses. O PSG chegou a contar com Salvatore Sirigu em grande fase, mas não necessariamente era um camisa 1 que representasse a megalomania da diretoria. Gianluigi Buffon até passou por lá, mas só quis ficar um ano. Navas era esse cara, mesmo “sem grife”, mas com uma reputação construída através de trabalho.

Navas já tinha feito uma temporada de estreia imponente no PSG. E quis o destino que o goleiro reencontrasse o Real Madrid no Bernabéu, pela fase de grupos da Champions. O empate por 2 a 2 foi o de menos, em mais uma exibição monstruosa do costarriquenho, evitando um placar muito mais elástico contra os antigos companheiros. Saiu de campo ovacionado pelas arquibancadas, num reconhecimento aos seus ótimos 90 minutos, mas também como uma prova de carinho da torcida – uma torcida que não necessariamente queria a sua saída e que se lembrava, muito melhor que a diretoria, da contribuição do arqueiro em sua passagem pelo clube.

Nos mata-matas da Champions 2019/20, Navas não foi tão preponderante na caminhada do PSG até a inédita final. Teve talvez sua melhor atuação contra a Atalanta, mas sequer ficou em campo até o fim e, lesionado, se ausentou da semifinal contra o RB Leipzig. Já na decisão em Lisboa, o goleiro realizou ao menos duas defesaças contra o Bayern de Munique, mas não conseguiria evitar o tento de Kingsley Coman. Em sua quarta decisão, seria derrotado pela primeira vez. Mas sua importância estava lá, expressa, especialmente pela maneira como impunha respeito contra qualquer adversário. Encarar Navas pela frente nunca é fácil.

Já nesta Champions, Keylor Navas também não precisou assumir o protagonismo na fase de grupos, apesar de boas defesas. Na primeira partida contra o Barcelona, se portou como um mero espectador. Realizaria uma boa intervenção quando o placar estava zerado, mas se contentaria em assistir de longe ao baile de Kylian Mbappé. Muito diferente seria o cenário desta quarta, porém. No Parc des Princes, o goleiro acabaria bastante ameaçado, especialmente num primeiro tempo em que a defesa parisiense não estava tão sólida.

Na pressão incessante do Barcelona, Navas evitou o gol enquanto pôde. Realizou duas defesas excelentes logo cedo, primeiro ao espalmar o chute no mano a mano com Ousmane Dembélé, depois ao desviar o míssil disparado por Sergiño Dest, ainda contando com o auxílio da trave. Do outro lado, Navas viu Mbappé abrir o placar cobrando pênalti. Ainda assim, não pôde descansar um instante sequer. Voltaria a fazer intervenções seguras contra Dembélé e Sergio Busquets. Também sofreu o gol de Lionel Messi, numa atípica pancada de fora da área, em que a curva para fora da bola tirou o goleiro de sua zona de ação.

Navas, contudo, não demorou a se redimir. E o momento decisivo viria na marca da cal, contra Messi, um velho conhecido desde seus tempos de Espanha. Até esta quarta, o costarriquenho havia enfrentado o Barcelona 14 vezes. Tomou 29 gols, oito deles anotados por Messi. Realizou grandes atuações contra os antigos rivais, mas também viu a consagração do camisa 10 de perto. Nos 11 metros, os dois tinham se encarado quatro vezes. Em todas elas, o argentino mandou a bola para dentro, inclusive no primeiro duelo das oitavas no Camp Nou. Seria diferente desta vez.

Messi não cobrou bem. Navas, independentemente disso, venceu o duelo particular com competência. Deixou a perna e conseguiu desviar o chute, ainda contando com um toque no travessão. Na comemoração, apontou ao banco de reservas, dedicando o lance ao reserva Sergio Rico – que atravessa momentos delicados em sua família. Se o Barcelona não conseguia construir um cenário favorável à virada, a responsabilidade era do goleiro. No segundo tempo, ele acabaria menos exigido. O PSG acertou sua marcação, com 45 minutos fantásticos de Marquinhos. Porém, quando foi necessário, o costarriquenho estava lá para construir um muro diante de sua meta. Faria nova defesaça contra Busquets aos 25, evitando que os blaugranas acordassem. Depois do jogo, vários companheiros homenagearam Navas nas redes sociais. Reconhecimento necessário, que também prova o carinho e o respeito nos vestiários.

Na última semana, em entrevista à revista do PSG, Navas comentou como o ambiente no clube o favorece. O costarriquenho apontou que, no Real Madrid, sentia como se parte do clube não acreditasse em seu potencial. Em Paris, pelo contrário, o apoio é massivo. “Eu sinto o afeto de todos aqui. Sempre serei grato aos torcedores do Real Madrid pelo apoio incondicional que me deram e continuaram me dando, assim como aos meus companheiros. Mas no PSG as coisas são um pouco diferentes. Todos confiam em mim e tento recompensá-los a cada jogo”, disse. É um exemplo dentro do clube, por sua humildade e seu trabalho árduo a cada treinamento.

Dentro de campo, Keylor Navas faz acontecer, e o sonho de conquistar a Champions segue em pé graças à qualidade do goleiro. Aos 34 anos, ele preserva seu alto nível, mesmo que alguns apostassem em sua queda, dado o estilo explosivo sob as traves. Hoje, parece claro como o veterano permanece entre os melhores. E, respaldado no Parc des Princes, é um dos fatores para que o PSG tente cumprir seu principal objetivo. Contra o velho rival Barcelona, Navas carimbou uma classificação tão almejada pelos parisienses, e que não tinha sido possível ao longo da última década.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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