Copa do Mundo

Quando deixou de tocar uma nota só, Willian ajudou a dar samba no segundo tempo

A entrada de Douglas Costa no intervalo do jogo contra a Costa Rica mudou a cara da seleção brasileira. E, aparentemente, a permanência de Willian como titular se deu mais pela lesão do eventual substituto do que pelo que vinha fazendo na Copa do Mundo. Novamente, o camisa 19 não se saiu bem contra a Sérvia. E parecia ser mais do mesmo no primeiro tempo contra o México, o samba de uma nota só, tentando as jogadas de linha de fundo. O roteiro se repetia ad infinitum: finta para a direita, cruzamento rasante, corte da zaga e lá corria o ponta para cobrar mais um escanteio. Faltava aproximação e apoio pela direita, claro. Mas faltava também a Willian se impor com liberdade, mostrando o seu talento. Aconteceu, enfim, no segundo tempo em Samara. A vitória sobre o México surgiu a partir de uma partidaça do ponta, buscando e se mexendo, ajudando demais o Brasil.

O talento do Willian não se nega. Basta ver o que aconteceu diversas vezes com o Chelsea nos últimos anos, por mais que Antonio Conte tenha insistido em barrá-lo recentemente. Ou mesmo nos amistosos preparatórios da Seleção. O camisa 19 atuou na ponta direita, mas também mais solto, muitíssimo bem nas vitórias sobre Áustria e Croácia. Aquela parecia a garantia que poderia fazer uma boa Copa do Mundo. No entanto, a partir da estreia contra a Suíça, o seu futebol minguou, limitado seja em influência ou em repertório. Destoava em um time desequilibrado.

Atacar mais pela esquerda não é necessariamente um problema – como, por exemplo, aconteceu nesta vitória sobre o México. Problema maior é não oferecer mais pela direita. Danilo foi nulo quando jogou e Fágner oscilou em alguns momentos no apoio. Paulinho, de quem se esperava este papel na triangulação, quase sempre partia para o meio da área, para aproveitar sua característica na finalização. Cabia a Willian, isolado e muitas vezes com marcação dupla, tentar tirar o coelho da cartola. Mas ele também não se ajudava, na sequência de movimentos que todo mundo sabia qual seria, e que nunca dava certo. Faltava mais.

Um passo importante ao Brasil contra o México foi acertar a sua marcação. Quando o time passou a atuar com duas linhas de quatro sem a bola, com Paulinho se colocando ao lado de Casemiro e Coutinho abrindo pela esquerda, o México deu menos trabalho. E isso também facilitou o trabalho de Willian. Tinha mais a aproximação de Fágner, avançando e auxiliando à frente, por mais que encontrasse claras dificuldades na marcação. Willian protegia mais o lateral e ficava mais claro o seu papel, até se arriscando um pouco mais pelo centro. Mas foi o intervalo que realmente mudou a chavinha na tarde (e na Copa) do ponta.

Uma das vantagens de ter Willian bastante aberto pela direita é pegar a defesa desmontada a partir das inversões de Marcelo. Sem o lateral titular, esse tipo de bola acontece com uma frequência muito menor. E certamente Tite deu passe livre ao camisa 19 flutuar durante o segundo tempo. Foi quando se viu o melhor do ponta, o Willian do Chelsea, o Willian dos últimos amistosos. Deixou de ser o jogador de um tipo de lance só, aproveitando a passagem, puxando pelo meio, ajudando a organizar. Isso ficou evidente no lance do gol, em que Neymar também fez diferente. A arrancada do camisa 10 pelo meio ajuda a desmontar a defesa mexicana. Willian já estava mais centralizado e aproveitou o corredor para receber o inteligente passe de calcanhar do craque. Então, invadiu a área em velocidade e deu o cruzamento na medida ao companheiro, excelente em sua infiltração por entre os zagueiros. Foi o lance decisivo em Samara.

Só que Willian não se limitou a isso. O ponta continuou gastando a bola, aparecendo em partes diferentes do campo, puxando os ataques. O jogo do Brasil continuava mais concentrado pela esquerda? Sim, mas também porque o camisa 19 por vezes aparecia por lá e ajudava a desmontar a marcação mexicana. Em meia hora no segundo tempo, Willian jogou mais do que no restante da Copa do Mundo. Sua própria confiança aumentou, e isso era visível, tentando muito mais. Chamou o jogo para si, driblou, quebrou as linhas, deu passes importantes, chutou a gol. Pode não ter acertado tudo o que fez, mas jogou demais. Jogou como se espera, e como justifica os créditos que possui nesta equipe. É este o ponta técnico e incisivo que precisa continuar durante a Copa.

A atuação de Willian contra o México faz com que a ausência de Douglas Costa se sinta menos. E que o substituto retorne, será importante ao Brasil justamente por oferecer a alternativas ao segundo tempo, algo fundamental para mudar jogos complicados na Copa do Mundo. Desta vez, ao menos, a mudança não precisou de nenhuma plaquinha à beira do campo, embora fosse como se um camisa 19 repetitivo saísse para a entrada de um 19 criativo. Foi vital essa alteração de postura e necessita se manter na sequência da competição. Em uma Seleção que amadurece e que cresce a cada partida no Mundial, Willian deu um empurrão a mais à equipe.

Abaixo, dois campinhos: um com as participações do Willian no primeiro tempo e outro no segundo. A mudança de atitude é óbvia:

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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