Eliminatórias da Copa

Oito seleções em ascensão que fecharam a Data Fifa de novembro embaladas

Após dias intensos no futebol de seleções, apontamos algumas seleções que se destacaram pelo desempenho recente

A Data Fifa de novembro marca o fechamento do ano no futebol de seleções. E alguns times têm motivos para se animar, diante daquilo que apresentaram em campo nas duas últimas semanas. A próxima temporada será bastante importante, com a realização de Copa América, Copa Africana de Nações, Copa da Ásia, Eurocopa e até mesmo a Liga das Nações da Concacaf. Assim, aproveitamos o final da pausa internacional para destacar oito times dos diferentes continentes que estão em ascensão e ofereceram motivos para se animar pelos resultados alcançados nestas partidas mais recentes.

(Icon Sport)

– Uruguai

O Uruguai fechou a Data Fifa como a seleção que apresentou o melhor futebol da América do Sul. E a margem de evolução da Celeste é tremenda, após a estagnação vivida no ciclo passado, entre o fim da história de Óscar Tabárez e o opaco trabalho de Diego Alonso. Marcelo Bielsa consegue deixar sua impressão digital nos charruas tão cedo. O treinador promoveu um trabalho de renovação do elenco, com muitos testes e observações desde os primeiros amistosos. Já nas Eliminatórias, formou a base principal e potencializou o time com um estilo bastante intenso. É uma versão uruguaia com muita pegada, mas isso sem negligenciar os aspectos defensivos do jogo. O que se nota é um time fulminante, que fez uma senhora partida contra a Argentina na Bombonera e não deu chances à Bolívia no Centenário.

O mais interessante é notar como o Uruguai está bem servido em diferentes setores. Ronald Araújo é a liderança na defesa e jogou demais como lateral. O meio-campo se revê repleto de talentos, com Manuel Ugarte limpando os trilhos, enquanto Federico Valverde e Nicolás de la Cruz dão qualidade na ligação. Já na frente, Darwin Núñez e Facundo Pellistri estão voando baixo. É interessante notar como a Celeste se vale mesmo de nomes de ligas menos badaladas, como o zagueiro Sebastián Cáceres e o ponta Maximiliano Araújo, ambos em atividade no Campeonato Mexicano. Além do mais, são importantes as recuperações de lideranças que andam sofrendo com lesões, como José María Giménez na zaga e Rodrigo Bentancur no meio. Como cereja do bolo, a volta de Luis Suárez ainda ofereceu uma carta na manga no banco de reservas.

(Icon Sport)

– Costa do Marfim

A Costa do Marfim deixou no passado seu momento de maior badalação, especialmente com a aposentadoria da geração encabeçada por Didier Drogba e Yaya Touré. Os Elefantes não se classificaram para as duas últimas Copas do Mundo, sequer presentes na fase final do qualificatório para 2022. Também não fazem muito barulho na Copa Africana de Nações desde o título em 2015. Entretanto, há bons sinais da recuperação dos marfinenses neste próximo ciclo. O técnico Jean-Louis Gasset assumiu em 2022 e conta com a ascensão de vários nomes no elenco. Prova disso se viu de maneira inapelável nas Eliminatórias: 9 a 0 em Seychelles, além dos 2 a 0 sobre Gâmbia, um dos adversários mais perigosos do grupo. Em amistosos recentes, os marfinenses chegaram a bater de frente com oponentes como Marrocos e África do Sul. E, vale lembrar, a próxima CAN acontece em casa.

A Costa do Marfim tem um remanescente das últimas glórias em Serge Aurier, dono da braçadeira de capitão. A defesa se encorpa com jovens como Odilon Kossounou, Wilfried Singo e Ousmane Diomande. Também auxilia a chegada recente de talentos que antes defenderam a seleção francesa na base, como Evan Ndicka e Willy Boly. O meio-campo dos Elefantes é fantástico: Ibrahim Sangaré, Franck Kessié e Seko Fofana podem formar um trio de tratores. O time conta com uma coleção de bons pontas, com Simon Adingra e Jérémie Boga à frente pelo ótimo início de temporada, mas também talentos do nível de Wilfried Zaha, Maxwell Cornet, Christian Kouamé e Max Gradel. Na frente, Sébastien Haller é a referência e conta com a explosão de Karim Konaté no Red Bull Salzburg. Há um grande número de opções, a ponto do time jogar com Adingra e Boga nas alas durante os 9 a 0 sobre Seychelles. E os veteranos de outros tempos seguem nos bastidores: Kolo Touré, Didier Zokora e Boubacar Barry fazem parte da comissão técnica.

– Comores

Comores é um paraíso do futebol alternativo na África. Os Celacantos não são exatamente uma novidade, depois da classificação surpreendente para a Copa Africana de Nações de 2022, na qual ainda aprontaram para cima de Gana e avançaram às oitavas de final. Pois o trabalho em alto nível se mantém e o time sustenta os 100% de aproveitamento nas Eliminatórias para a Copa do Mundo, num grupo cheio de seleções de mais peso. Os comorenses atuaram nas duas partidas em casa, mas deram show de jogadas coletivas nos 4 a 2 sobre a República Centro-Africana e arrancaram um memorável 1 a 0 contra os fregueses ganeses. É interessante notar como a crescente continua, mesmo com a saída do técnico Amir Abdou, que provocou a revolução em oito anos à frente de Comores. O atual comandante é o italiano Stefano Cusin, que já trabalhou em diversos países. Uma pena só que os comorenses não se classificaram para a próxima Copa Africana de Nações.

Comores nem contou com a estrela da geração nesta Data Fifa, o centroavante El Fardou Ben Nabouhane, ídolo do Estrela Vermelha e atualmente no Apoel Nicósia. O elenco, ainda assim, tem boa experiência nas ligas europeias – muitos dos atletas são descendentes de comorenses nascidos na França. O craque dos últimos jogos foi Myziane Maolida, que anotou um golaço contra Gana. O atacante pertence ao Hertha Berlim, mas está escanteado por indisciplina. Outro nome importante é o meia Youssouf M'Changama, referência técnica dos Celacantos e atualmente na Ligue 2 com o Troyes. Quem também brilha é o ponta Faïz Selemani, que ganha um dinheiro no Al Hazem da Arábia Saudita. Já na defesa, o lateral Saïd Bakari é titular absoluto do Sparta Roterdã. Não são figuras tão badaladas, mas formam um conjunto tão forte quanto surpreendente no país insular.

(Icon Sport)

– Jamaica

A Jamaica tem cancha para voltar à Copa do Mundo depois de 28 anos. Os Reggae Boyz se fortaleceram nos últimos tempos, a partir de uma abertura maior aos descendentes de jamaicanos que nasceram em outros países. Vários figurões da Premier League passaram a pintar nas convocações, o que naturalmente chama mais atenção. Acima disso, a federação local parece disposta a desenvolver um trabalho mais sério na afirmação do time. Por isso mesmo, conta com o técnico Helmir Hallgrímsson, no cargo desde setembro de 2022. O comandante dirigiu a epopeia da Islândia rumo à Euro 2016 (ao lado de Lars Lägerback) e à Copa do Mundo de 2018. Já começa a colher os frutos na Jamaica, com a caminhada às semifinais da Copa Ouro e agora a classificação ao Final Four da Liga das Nações, que também bota o time na Copa América de 2024. Foi uma prova de força contra o Canadá. Depois da derrota por 2 a 1 em Kingston, os Reggae Boyz arrancaram uma enorme virada por 3 a 2 em Toronto e avançaram pelos gols fora.

O potencial da Jamaica se nota desde o gol, onde Andre Blake usa a braçadeira de capitão e possui enorme rodagem no Philadelphia Union – com três prêmios de melhor goleiro da temporada na MLS. A defesa se vale de jogadores rodados no futebol inglês, em especial Ethan Pinnock, titular absoluto do Brentford e recém-convocado à seleção. Se o meio-campo se pauta em volantes da Championship, com Daniel Johnson e Joel Latibeaudiere, a qualidade dos meias é espetacular. Bobby Decordova-Reid, Demarai Gray e Leon Bailey são as principais opções dos jamaicanos. Mais à frente, Michail Antonio é o figurão no comando do ataque, mas ainda não reproduziu nos Reggae Boyz tudo o que faz no West Ham. Com sua lesão nesta Data Fifa, quem destruiu foi Shamar Nicholson, autor de três gols nos dois jogos contra o Canadá. O camisa 11 é mais um que ganha tarimba nas grandes ligas, levado nesta temporada pelo Clermont.

– Panamá

O Panamá sabia que a bonança pela classificação à Copa do Mundo de 2018 era um ponto fora da curva. Diferentemente do que acontece tantas vezes, a Maré Vermelha chegou ao Mundial no ocaso de sua geração mais badalada. Assim, muitos veteranos se despediram da equipe nacional pouco depois do torneio e um processo de renovação amplo precisou ser empreendido. Os panamenhos não foram à Copa de 2022, mas fizeram uma campanha digna nas Eliminatórias. Ainda assim, a empolgação atual se deve ao ótimo 2023: chegaram ao Final Four da Liga das Nações, foram vice-campeões da Copa Ouro e deram um banho na Costa Rica nestas quartas de final da nova Nations. Enfiaram 6 a 1 no agregado, com 3 a 0 na ida em San José, antes dos 3 a 1 da volta no Rommel Fernández. Quem conduz o time desde 2020 é Thomas Christiansen, dinamarquês radicado na Espanha, que chegou a atuar na base do Barcelona e como profissional foi artilheiro da Bundesliga pelo Bochum. Como treinador, vinha de passagens por Apoel Nicósia, Leeds United e Union St. Gilloise.

O Panamá costuma atuar com três zagueiros. Entre eles está Fidel Escobar, remanescente de 2018, com destaque também à ascensão de Andrés Andrade no LASK Linz. O esquema é importante para liberar os laterais, duas das figuras mais importantes do time. Michael Murillo se transferiu recentemente ao Olympique de Marseille e Yoel Bárcenas é um dos mais experientes, no Mazatlán. A faixa de capitão fica com o volante Aníbal Godoy, outro presente no Mundial de 2018, mas quem encanta na meia-cancha é Adalberto Carrasquilla. O camisa 8 se aponta como o craque da geração, aos 24 anos, entre os protagonistas do Houston Dynamo. Já o ataque tem José Luis Rodríguez no Famalicão, enquanto José Fajardo defende o DC United e fez boas partidas na Nations. Menção especial também aos centroavantes, Ismael Díaz e Cecilio Waterman, ambos em atividade na América do Sul – por Universidad Católica do Equador e Cobresal, respectivamente.

(Icon Sport)

– Turquia

Ainda não dá para saber direito o que esperar da Turquia, num momento em que a troca de treinador é bastante recente. Stefan Kuntz não agradava e perdeu seu emprego em setembro, após o tenso empate em casa com a Armênia e a derrota no amistoso contra o Japão. Todavia, a situação nas eliminatórias da Euro estava aberta e Vincenzo Montella chegou para logo garantir a classificação em outubro. O treinador vinha respaldado pelo bom trabalho no Adana Demirspor e teve ótimos resultados na campanha do qualificatório, com vitória sobre a Croácia em Osijek e empate com Gales em Cardiff. Todavia, o que realmente gerou muita empolgação ao seu redor foi o amistoso contra a Alemanha nesta Data Fifa. A vitória por 3 a 2 foi sensacional, não apenas pela maneira como os turcos buscaram o ataque em Berlim, mas também pelo domínio da sua torcida nas arquibancadas do Estádio Olímpico. Foi um belo aperitivo para a Euro 2024 nos estádios alemães.

Algo interessante sobre a Turquia é a maneira como os clubes locais fortalecem o desempenho recente. Há talentos em atividade no exterior, com destaque sobretudo ao meio-campo recheado por Hakan Çalhanoglu, Orkun Kökçü e Salih Özcan. Também são importantes as ascensões de garotos como Arda Güler no Real Madrid e Kenan Yildiz na Juventus. De qualquer maneira, a espinha dorsal se vale de nomes conhecidos de Montella na Süper Lig. O goleiro Ugurcan Çakir é ídolo do Trabzonspor. A defesa conta com o lateral Ferdi Kadioglu voando no Fenerbahçe e o zagueiro Abdülkerim Bardakci em ótima forma no Galatasaray. Ismail Yüksek e Kaan Ayhan são outras duas boas opções para o meio nos gigantes de Istambul, assim como os meias Irfan Can Kahveci e Kerem Aktürkoglu. E ainda pintam jogadores em eclosão no Adana Demirspor, como o ponta Yusuf Sari. Vale mencionar outros bons jogadores que podem se recuperar, como Çaglar Söyüncü, Merih Demiral e Enes Ünal.

(Icon Sport)

– Eslováquia

A Eslováquia se confirmou na terceira Eurocopa consecutiva, com uma campanha muito boa em seu grupo das eliminatórias. O time perdeu apenas seus compromissos contra Portugal, e por placares apertados. De resto, sete vitórias e um empate numa chave razoavelmente equilibrada, com Luxemburgo, Islândia, Bósnia & Herzegovina e Liechtenstein como desafiantes. A Data Fifa contou com uma excelente virada por 4 a 2 sobre a Islândia em Bratislava, no jogo que confirmou a classificação, além dos 2 a 1 sobre a Bósnia em Zenica. Talvez os eslovacos não apareçam necessariamente como candidatos a surpresa na Euro 2024, mas parecem capazes de buscar os mata-matas. A federação ainda apostou em um treinador diferente, com o comando do italiano Francesco Calzona desde agosto de 2022. Este é o seu primeiro trabalho como técnico principal, mas por anos ele acompanhou a Maurizio Sarri como seu assistente desde as divisões de acesso e também mais recentemente foi auxiliar de Luciano Spalletti no Napoli.

Outro trunfo da Eslováquia é o seu elenco bem equilibrado. Martin Dúbravka é um goleiro bastante experiente. A defesa possui a solidez de Milan Skriniar, além de contar com outros bons zagueiros à disposição, como Denis Vavro e Dávid Hancko – este deslocado normalmente à lateral. O meio-campo tem um termômetro em Stanislav Lobotka, em alta com o Napoli. Dão apoio figuras como Ondrej Duda e László Bénes, além do veteraníssimo Juraj Kucka. Já o ataque não possui nomes tão celebrados, mas Lukás Haraslín fez uma baita Data Fifa. Ainda conta com a companhia de Ivan Schranz e Róbert Bozeník na linha de frente, além de Tomás Suslov e Róbert Mak entre as opções. A segurança defensiva, de qualquer maneira, foi mais importante para render os bons resultados nas eliminatórias da Eurocopa.

– Malásia

Oito seleções começaram a segunda fase das Eliminatórias Asiáticas com 100% de aproveitamento. Sete delas são barbadas: Japão, Austrália, Coreia do Sul, Arábia Saudita, Catar, Iraque e Emirados Árabes Unidos, todas do Pote 1 do sorteio. A surpresa fica para a Malásia, que veio do modesto Pote 3 e consegue botar o terror. Os malaios ainda não encararam Omã, o cabeça de chave, mas somaram seis pontos contra Quirguistão e Taiwan. O triunfo sobre os quirguizes em Kuala Lumpur, aliás, foi épico: os malaios perdiam por 3 a 1 e foram buscar os 4 a 3, selados aos 48 do segundo tempo. É uma injeção de ânimo para o time que disputará a Copa da Ásia pela quarta vez em sua história. Não participava do torneio continental desde 2007, quando foi uma das sedes, enquanto a última classificação em campo havia ocorrido em 1980.

Os Tigres são comandados por Kim Pan-gon, sul-coreano que veio respaldado por uma estadia de cinco anos à frente de Hong Kong e que também fez um trabalho longo como vice-presidente de desenvolvimento da federação da Coreia do Sul. Um dos trunfos da Malásia é sua forte liga local, uma das mais representativas do sudeste asiático. São 11 convocados do Johor Darul Ta'zim, dono dos últimos dez títulos nacionais. Um deles é o ponta Arif Aiman, de 21 anos, grande responsável pelo milagre contra o Quirguistão. Os Tigres também se fortalecem por uma política de buscar jogadores de origem malaia nascidos em outros países. O elenco nesta Data Fifa tinha atletas nascidos em Inglaterra, Austrália, Finlândia e Singapura. Um caso curioso é do zagueiro Dion Cools, autor de dois gols contra os quirguizes. Nasceu na Malásia, mas cresceu na Bélgica, terra de seu pai. Também há alguns naturalizados que ganharam chances após longas passagens pelo Campeonato Malaio. É o caso de dois brasileiros, o meia Endrick e o atacante Paulo Josué.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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