Copa do Mundo

A confiança de Júlio César foi maior do que o temor do resto da Seleção

Estava nas mãos dele, Júlio César. Os pênaltis podem ser a cova para qualquer um dos jogadores de linha. Para o goleiro, é a chance de redenção. O camisa 12 do Brasil estava pleno de consciência. A tensão era evidente em seu rosto, claro, como era no de qualquer um que não gostaria de se transformar em um novo vilão da Seleção, dentro do país, 64 anos depois. Naquele momento, ao menos, era impossível que Júlio se tornasse um novo Barbosa, não ele. E foi transbordando confiança que o goleiro foi para a marca da cal. Para ser herói e honrar também a memória de tantos grandes que vestiram aquela camisa. Inclusive de Barbosa.

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Muita coisa certamente se passou na cabeça de Júlio César antes daqueles pênaltis. O goleiro havia sido apontado como um dos vilões em 2010, na dolorosa eliminação para a Holanda na África do Sul. Errou, ele sabe disso. E tinha a chance de se redimir em 2014, por mais que a desconfiança pesasse. O camisa 12 não começou a Copa tão bem, sem tempo de bola. Porém, cresceu no torneio. Chegou ao seu ápice contra o Chile.

Júlio César se saiu muito bem em todas as vezes que foi exigido. Fez uma defesa espetacular em um chute à queima-roupa de Aránguiz no primeiro tempo. Saiu do gol de maneira precisa, passando confiança a uma defesa que não parecia plena desse sentimento. Não teve culpa no gol de Sánchez e deu uma sorte enorme na bomba de Pinilla que explodiu no travessão, aos 14 minutos do segundo tempo da prorrogação. Não era o dia do atacante chileno. Era do goleiro brasileiro.

Antes da disputa de pênaltis, a maioria dos jogadores do Brasil parecia querer correr para a cama e chorar, ao invés de encarar Claudio Bravo. Júlio César é quem chamou a responsabilidade de motivá-los, de tentar acordá-los – algo que também deveria ser feito por Thiago Silva, um dos mais tensos. O discurso do camisa 12 nas entrevistas, muitas vezes, pesa para uma autodefesa exagerada do time. Neste momento, no entanto, ele foi fundamental para fazer seus companheiros crescerem. Júlio bateu no peito. A Seleção pôde confiar nele.

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Na Copa América de 2004, Júlio César havia sido decisivo nos pênaltis contra Uruguai e Argentina. Na Copa das Confederações de 2013, deu a injeção de ânimo na semifinal contra os uruguaios, ainda no tempo normal. Nunca em um momento tão grande, nunca em uma Copa do Mundo. Mas Júlio César defendeu duas cobranças, de Pinilla e Sánchez. Fez com que as críticas por 2010 e a desconfiança dos últimos meses desaparecessem, ao menos por um instante. Tornou-se o grande responsável por colocar o Brasil nas quartas de final.

O papel de Júlio César é fundamental. E isso ficou claro na partida de hoje. A Seleção conta com um grande goleiro, por mais que não tenha demonstrado isso muitas vezes nos últimos quatro anos. Principalmente um líder, que não veste a braçadeira, mas deveria. O goleiro foi o herói não só da classificação, foi também quem salvou a pele de seus companheiros. A confiança que lhe valeu nos pênaltis, e que superou o medo evidente em todos os outros.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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