Copa do Mundo

As histórias cruzadas dos jogadores da França com origem marroquina e de Marrocos com origem francesa

Aproveitamos as semifinais da Copa do Mundo para traçar as ligações de Marrocos e França através dos jogadores de suas seleções

França e Marrocos farão um duelo de carga histórica evidente nas semifinais da Copa do Mundo. Durante quatro décadas, a maior parte do território marroquino foi transformada em “protetorado” pelos franceses, de 1912 a 1956. O período de domínio pode não ter deixado marcas tão violentas como em outros países do norte da África, em especial a Argélia, mas há um elo que permanece mais de 60 anos depois da independência. Além disso, a população imigrante voltou a aproximar os dois países nas últimas décadas. A França é o principal destino da diáspora marroquina, com comunidades expressivas sobretudo no sul francês e na região metropolitana de Paris. Naturalmente, tais movimentos se refletem no futebol. Se por um lado os craques nascidos em Marrocos faziam parte da seleção francesa até os anos 1950, os filhos de imigrantes se espalharam pelas duas equipes nacionais ao longo dos últimos 30 anos.

Marrocos manteve sua soberania como estado independente por um período longo durante a intensificação da colonização na África. Foi apenas na segunda metade do Século XIX que o domínio dos europeus no atual território marroquino começou a se expandir. França e Espanha tinham interesses na região, o que culminou numa invasão militar francesa mais contundente a partir da primeira década do Século XX, num momento de enfraquecimento do sultanato marroquino. Depois de cinco anos de ações militares, o império francês encerrou a independência do estado de Marrocos e instituiu o chamado “Protetorado Francês no Marrocos”, que também concedia porções do território ao controle dos espanhóis.

A colonização francesa no Marrocos não rompeu totalmente com as estruturas vigentes, dado o próprio histórico local como estado independente. Mesmo o sultanato acabou preservado com poderes limitados, numa relação de conveniência inclusive para suprimir minorias étnicas, sobretudo de origem amazigh. O domínio da França se exercia principalmente pela exploração econômica e pela penetração cultural nos principais centros urbanos. E o futebol se tornou um elemento a mais nesse contexto. O esporte começou a se estruturar no território marroquino na virada do século, especialmente na cidade de Casablanca, com a criação dos primeiros clubes. Já a formação das primeiras competições regionais se inicia em 1916.

Se por um lado o Protetorado Espanhol de Marrocos absorveu os clubes locais à própria estrutura do Campeonato Espanhol, o Protetorado Francês de Marrocos tinha o seu campeonato local – embora os times também participassem da Copa da França. A liga nacional teve seu pontapé inicial na virada da década de 1910 para a de 1920 e se baseava em torneios locais das principais cidades sob domínio francês – Casablanca, Rabat, Marraquexe e Fez/Meknès. As competições absorviam equipes ligadas aos colonos franceses, mas também abertas aos árabes e outras populações locais. O talento nativo não passaria despercebido pela Federação Francesa de Futebol, que controlava a chamada Liga de Marrocos de Futebol, a entidade responsável por gerir a modalidade no protetorado.

Larbi Ben Barek, o pioneiro

Ben Barek com trajes típicos de Marrocos, em 1945, ao lado de Helenio Herrera

A partir da década de 1930, os jogadores nascidos nas colônias passaram a ser absorvidos pelo recém-criado Campeonato Francês, já profissionalizado, e também pela seleção da França. O time da Copa de 1938, por exemplo, tinha dois jogadores de origem africana: Abdelkader Ben Bouali, nascido na Argélia, e Raoul Diagne, da Guiana Francesa, embora filho de senegalês. Em comum, o fato de ambos virem de famílias ricas e influentes. Ainda havia Mario Zatelli, de origem franco-italiana, que nasceu na Argélia e cresceu no Marrocos. Entretanto, alguns abriam portas através do mais puro talento. Não havia como fechar os olhos para Larbi Ben Barek, o primeiro marroquino a estourar no futebol francês.

Nascido em 1917 e criado na cidade de Casablanca, Larbi Ben Barek cresceu já dentro do contexto do protetorado. O futuro atacante era órfão de mãe e seu pai o abandonou durante a adolescência. Apoiado pelo irmão mais velho, o garoto precisou se virou desde cedo e viu um caminho na prática de esportes. Trabalhou como carpinteiro e como faxineiro, enquanto conciliava seu gosto por diferentes modalidades. Chegou a praticar natação e atletismo, mas foi o talento com a bola nos pés, moldado desde os oito anos, que impulsionou sua carreira. A partir da década de 1930, Ben Barek passou a atuar por times de Marrocos criados pelos franceses. Fez sucesso primeiro pelo Idéal Club Marocain, antes de passar pela Union Sportive Marocaine, ambos de Casablanca. O craque era reconhecido como um dos melhores jogadores em atividade no protetorado, com títulos conquistados na liga local e também em competições regionais que envolviam as outras colônias francesas no norte da África.

Na década de 1930, Marrocos formou a sua primeira seleção, ainda sem caráter oficial. A equipe chegou a enfrentar o segundo quadro da França e Ben Barek chamou atenção por seu talento, estampando manchetes em Paris. Não demorou para que os clubes profissionais da metrópole oferecessem um contrato ao atacante. Assim, ele se juntou ao Olympique de Marseille em 1938. Seria uma sensação naquela sua primeira temporada, num time já forte dos marselheses, que vinha do vice-campeonato nacional. O atacante primava por sua habilidade, pelo faro de gol, pela inteligência na movimentação e também pelas qualidades atléticas. Sobrava em campo e seria apontado como um dos melhores da liga em seu primeiro ano, com novo vice do OM. Ganhou o apelido de “Pérola Negra”, comparado a José Leandro Andrade e Leônidas da Silva – outros dois craques negros do futebol que se consagraram nos estádios franceses, o primeiro nas Olimpíadas de 1924 e o segundo na Copa de 1938.

Como “posse francesa”, Ben Barek também seria convocado aos Bleus. Recebeu a nacionalidade em novembro de 1938, apenas cinco meses depois de seu desembarque. Não teve tempo para disputar a Copa do Mundo, mas ganhou destaque principalmente num amistoso contra a bicampeã Itália, em dezembro de 1938. O garoto de 21 anos fazia sua estreia e, ao lado de Raoul Diagne, como jogadores negros num país fascista, receberam vaias dos torcedores em Nápoles. A resposta viria em campo, com uma boa atuação, apesar da derrota por 1 a 0. O atacante firmou-se como um dos principais nomes dos Bleus em 1939, com seu primeiro gol anotado num empate contra a forte Hungria.

A Segunda Guerra Mundial encurtou a passagem de Ben Barek pelo Olympique de Marseille. Com a eclosão do conflito e a interrupção do futebol francês, o atacante retornou a Marrocos. A liga local seguiu em atividade e o craque vestiu a camisa não apenas da US Marocaine, mas também do Wydad Casablanca, pelo qual ainda atuou no time de basquete. O retorno do marroquino à França aconteceu em 1945, quando desembarcou em Paris para defender o Stade Français. Trajado em roupas típicas de Marrocos, evidenciava também como sua história na França não o fazia negligenciar as raízes, inclusive como muçulmano praticante. Colocava-se também como uma figura de interesse cultural e político. Este seria o seu período de maior reconhecimento dentro de campo, mesmo que chegasse à casa dos 30 anos. Ben Barek encadeou ótimas temporadas e rendeu muito bem sob o comando do técnico Helenio Herrera – que, embora argentino, se mudou com a família na infância para Casablanca e por lá teve seus primeiros contatos com o futebol.

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O fluxo aumenta nos anos 1940 e 1950

Mahjoub, ao centro, em ação pela França

A esta altura, Ben Barek não estava sozinho entre os jogadores marroquinos no Campeonato Francês. Pelo menos 12 atletas do Campeonato Marroquino foram contratados pelas equipes da França na segunda metade dos anos 1940, com a vantagem de terem permanecido em atividade durante a época da guerra. Mustapha Ben M'Barek teve relativo sucesso no Bordeaux, convocado para um amistoso dos Bleus em 1950. Mas não chegava ao impacto do Pérola Negra. Ben Barek voltou à seleção francesa em 1945 e disputou 12 amistosos até 1948. Os Bleus registraram vitórias importantes no período, inclusive contra a Inglaterra em 1946. Entretanto, o atacante deixaria de compor as convocações depois de se transferir ao Atlético de Madrid em 1948/49. Foi justamente o auge de sua carreira, quando conquistou dois títulos de La Liga sob as ordens de Helenio Herrera. Assim, o craque fez falta nas Eliminatórias para a Copa de 1950, com os franceses superados pela Iugoslávia.

O fluxo de jogadores de origem marroquina no Campeonato Francês seguiu na primeira metade da década de 1950. Foram pelo menos mais 12 reforços, num momento em que o Campeonato Marroquino também possuía uma estrutura fortalecida, com a eclosão de novos clubes locais. Eram tempos também em que a luta pela independência transparecia no futebol, com o enfraquecimento dos times ligados aos colonizadores franceses e a ascensão de equipes enraizadas na comunidade árabe. O próprio sultanato financiava algumas agremiações.

Ben Barek retornou para o Campeonato Francês em 1953, de volta ao Olympique de Marseille 14 anos após sua primeira passagem. O veterano já beirava os 36 anos quando auxiliou os marselheses a alcançarem a final da Copa da França em 1953/54. Eliminaram o poderoso Stade de Reims, mas não resistiram a um forte Nice, que também tinha vários laços marroquinos – os quais detalharemos adiante. Apesar da boa forma de Ben Barek no Vélodrome, ele não seria chamado para a Copa do Mundo de 1954. Em compensação, faria história de outra maneira, num jogo importante diante do aumento das tensões pelas independências.

Em outubro de 1954, após um terremoto na Argélia, a federação francesa resolveu fazer um amistoso entre a França e uma seleção do Norte da África para angariar fundos. Ben Barek era o astro do time que reunia marroquinos, argelinos e tunisianos. Pois os africanos venceram, em 3 a 2 que teve gol do Pérola Negra no Parc des Princes. Uma semana depois, o atacante teve a chance de disputar seu último amistoso pelos Bleus. A França carimbou a faixa da campeã Alemanha Ocidental com uma vitória por 3 a 1. Depois de sua última temporada no Olympique, Ben Barek retornou à África. Acumulava a função de treinador e jogador, quando pendurou as chuteiras pelo FUS Rabat já aos 41 anos.

A Copa do Mundo de 1954, mesmo sem o grande astro marroquino, teve um representante do protetorado na seleção da França. Era o meio-campista Abderrahman Mahjoub, outra cria da US Marocaine, que assinou com o Racing de Paris em 1951. Sua fama era tanta na capital que passou a conhecido como “O Príncipe do Parque”, em referência ao Parc des Princes. Emprestado ao Nice em 1953, Mahjoub entraria em grande forma e seria um dos destaques no time campeão da Copa da França em 1954. Foi na mesma época em que ganhou suas primeiras convocações, presente no Mundial da Suíça. O meia participou da vitória sobre o México, mas somaria apenas sete partidas pelos Bleus, convocado até 1955. Naquela altura, outros sobrenomes africanos também apareciam no elenco francês. Um exemplo era o argelino Abdelaziz Ben Tifour, mais um ídolo do Nice. Já entre os marroquinos, os gols do atacante Abdesselem Ben Mohammed pelo Bordeaux o fizeram ser convocado em 1953, mas o antigo ídolo do Wydad Casablanca só jogou um amistoso pela França.

A eclosão de Fontaine

Just Fontaine

E em meio à abertura da seleção francesa em sua preparação à Copa de 1954, o mais célebre dos nomes franco-marroquinos chegou à equipe nacional: Just Fontaine. Diferentemente dos demais conterrâneos, “Justo” não tinha necessariamente origens étnicas africanas. O centroavante nascido em Marraquexe representava a divisão do protetorado: sua mãe era espanhola e o pai era francês, funcionário da indústria estatal de tabaco. Fã de Larbi Ben Barek, o garoto começou a atuar nos juvenis do Sporting Athlétique de Marrakesh, mas se mudou para Casablanca por causa dos estudos, quando tinha 17 anos. Seguiu os passos do velho Pérola Negra e estourou de vez no Campeonato Marroquino com a US Marocaine. Nesta época, também defendeu a seleção do protetorado de Marrocos – o que gerou ruídos entre os franceses. Já depois de três anos no futebol local, seria fisgado pelo Nice em 1953.

Fontaine era mais um companheiro de Mahjoub e Ben Tifour no Nice que conquistou a Copa da França em 1954, diante do Olympique de Ben Barek. Naquela mesma temporada, o centroavante recebeu sua primeira chance na seleção da França. Fontaine tinha apenas 20 anos quando estreou, e meteu logo uma tripleta nos 8 a 0 sobre Luxemburgo pelas Eliminatórias. Apesar do desempenho arrebatador, ele não seria chamado para a Copa de 1954. Nesta época, enquanto cumpria o serviço militar, o atacante se juntou à seleção do exército francês. E também faria seu nome em competições internacionais militares. Isso sem contar também o impacto com o Nice, pelo qual faturou o Campeonato Francês em 1955/56.

O grande salto na carreira de Fontaine aconteceu a partir de 1956. O atacante assinou com o Stade de Reims, vice da primeira edição da Champions. Era a aposta dos alvirrubros para substituir o craque Raymond Kopa, vendido ao Real Madrid. Não eram jogadores da mesma posição ou de mesmas características, mas ninguém reclamou quando Fontaine passou a empilhar gols na região da Champanha. Seriam 30 tentos no Francesão 1956/57, além de mais 34 em 1957/58, quando arrebatou a taça e a artilharia. Neste momento, o nativo de Marraquexe já era um nome permanente nas convocações da França. E não deixaria a equipe nacional, diferentemente do que se via com seus colegas do norte da África naquele mesmo período histórico.

A independência também das seleções

Hassan Akesbi

A segunda metade da década de 1950 marcou a intensa luta pela independência nas colônias francesas do norte da África. Não à toa, muitos jogadores de origem africana deixaram as convocações dos Bleus e apoiaram a causa nacional. Marrocos e Tunísia se libertaram do domínio francês a partir de 1956, em processos menos conflituosos com a metrópole. As mais terríveis consequências aconteceram ao redor da Argélia, que precisou travar uma guerra para ganhar sua soberania apenas em 1962. E, neste processo, os jogadores argelinos tiveram papéis de heróis.

Nomes como Ben Tifour, Rachid Mekhloufi e Mustapha Zitouni eram cotados para a Copa de 1958. Preferiram fugir da França via países vizinhos na Europa e voltaram ao norte da África. Na mesma época em que se jogaria o Mundial na Suécia, eles passaram a formar o time da Frente de Libertação Nacional, que se tornou um embaixador da causa argelina em amistosos ao redor do mundo e serviu de base à formação da seleção após a conquista da independência. Aquele elenco contava inclusive com um marroquino de nascimento, Abdellah Settati, do Bordeaux, filho de pai argelino.

Os primeiros amistosos do time da FLN aconteceram contra Tunísia e Marrocos. Neste momento, os Leões do Atlas começavam a construir a identidade de sua seleção, após a primeira partida oficial como estado independente acontecer em 1957. Ainda não foi uma equipe párea aos argelinos, com sete derrotas em sete duelos contra a FLN. De qualquer maneira, os marroquinos se valiam não apenas da tradição do futebol local, como também do intercâmbio com o futebol francês. O primeiro técnico do país não poderia ser outra pessoa além de Larbi Ben Barek, que dirigiu Marrocos de 1957 a 1958. Além disso, o time convocava atletas em atividade no Campeonato Francês.

Abderrahman Mahjoub, aquele mesmo da Copa de 1954, atuou por sua segunda seleção diferente a partir de 1960 – em tempos nos quais o meio-campista era ídolo do Racing de Paris e do Montpellier. O zagueiro Mustapha Bettache também se uniu aos Leões do Atlas, em tempos nos quais era uma referência do Nîmes. Já a estrela nestes primórdios de Marrocos era o atacante Hassan Akesbi. Nascido em Tangier, cidade de administração internacional que chegou a ser invadida pela Espanha, o centroavante começou no FUS Rabat, antes de desembarcar no Nîmes em 1955. A partir de então, virou um dos maiores goleadores do futebol francês, mas se manteve fiel à seleção marroquina.

Diante do cenário, Fontaine poderia ter optado por defender a seleção marroquina. Porém, as origens étnicas ligavam o centroavante também à França – mesmo que nunca tenha negado publicamente seu amor a Marrocos. “Claro que me sinto marroquino! Sou, digamos assim, meio francês e meio marroquino. ‘Noss-noss', como dizem em árabe”, comentaria em 2011, ao site Le Buteur. E naquele mesmo ano de 1956 em que acontecia a independência é que Fontaine começou a fazer estrago pelos Bleus de forma constante. Tornaria-se um nome mais frequente nas convocações, até chegar na Copa de 1958 em alta.

Na época, Fontaine acabou tratado como um “exemplo”, depois do caso dos jogadores que abandonaram a seleção para se juntar ao time da FLN. O marroquino era mencionado ao lado de Kopa, de origem polonesa, como atletas que “não viraram as costas para a França, mesmo com raízes estrangeiras”. Entretanto, o ex-centroavante tinha uma consciência política privilegiada e dava razão aos argelinos em sua causa: “Todo mundo entende os motivos pelos quais eles deixaram a seleção. Eu os entendia melhor que os outros, porque joguei por Marrocos na época do protetorado. É uma pena para as suas carreiras, mas eles tinham uma missão a cumprir e cumpriram. Eles eram argelinos acima de tudo e sentiam a alma argelina, não francesa”, avaliava Fontaine, ainda declarando que a situação dos marroquinos era diferente porque o protetorado oferecia condições melhores de vida que o colonialismo praticado na Argélia.

Fontaine avaliava também que a França perdeu força sem Ben Tifour, Mekhloufi e Zitouni. Entretanto, o centroavante não sentiu pressão maior pelas ausências e resolveu jogar por vários. Arrebentou desde sua estreia no Mundial. Foram três gols contra o Paraguai, dois diante da Iugoslávia, um contra a Escócia. Os Bleus avançaram para as quartas de final, quando o centroavante balançou as redes mais duas vezes nos 4 a 0 sobre a Irlanda do Norte. A eliminação ocorreu na semifinal, em que o gol solitário de Fontaine não evitou a queda contra o Brasil. Todavia, a decisão do terceiro lugar permitiu que o artilheiro assinalasse mais quatro gols contra a Alemanha Ocidental e, com 13 tentos, registrasse o recorde histórico em uma só edição das Copas.

Curiosamente, a carreira de Fontaine não progrediu muito mais do que isso. O centroavante continuou acumulando títulos no Stade de Reims, onde teve o retorno de Kopa e com o qual disputou a final da Champions em 1959. Porém, as seguidas lesões o fizeram pendurar as chuteiras relativamente cedo, em 1962, aos 28 anos. Presente nas fases qualificatórias da Euro 1960, Fontaine se despediu da seleção da França com absurdos 30 gols em 21 partidas. Àquela altura, passou a se dedicar à luta pelos direitos dos jogadores, depois de ser um dos fundadores da UNFP – a União Nacional dos Futebolistas Profissionais. Já sua lacuna no Stade de Reims seria ocupada por um marroquino: Hassan Akesbi, tirado do Nîmes e que teve bons números nos alvirrubros, mas sem as mesmas glórias de seu conterrâneo.

As distâncias aumentam

Gérard Soler

A partir da década de 1960, o fluxo de jogadores entre Marrocos e França se reduziu. O fim das relações coloniais dificultava um pouco mais as transferências, enquanto o próprio Campeonato Marroquino se fortalecia com sua estrutura independente. Ainda assim, algumas estrelas de origem marroquina fizeram sucesso por mais tempo no Campeonato Francês, como Mahjoub e Akesbi – que permanece ainda hoje como 11° maior artilheiro da história da liga, com 173 gols. Já a seleção de Marrocos atingiu a primeira prateleira do futebol a partir da década de 1970, quando disputou sua primeira Copa do Mundo em 1970, esteve também nas Olimpíadas de 1972 e conquistou a inédita Copa Africana de Nações em 1976. Nenhum jogador daqueles elencos era nascido na França e somente dois deles atuariam depois em times franceses, sem muito impacto.

A seleção francesa, enquanto isso, voltou a ter um jogador nascido em Marrocos. Gérard Soler era natural de Oujda, com origens francesa e espanhola. Nascido em 1954, pouco antes da independência, cresceu mesmo na França e começou sua carreira na região de Paris. O atacante seria um dos grandes nomes do Sochaux na década de 1970, antes de brilhar também com a camisa do Bordeaux. Seriam nove anos frequentando as convocações, como coadjuvante, mas a ponto de disputar a Copa do Mundo de 1982. Embora tenha feito sua carreira inteira no futebol francês, depois de sua aposentadoria ele chegaria a desempenhar de um cargo diretivo no Wydad Casablanca.

Já a partir da década de 1980, a relação entre Marrocos e França se reflete de maneira mais clara na seleção marroquina. A começar por Just Fontaine, que voltou à sua terra natal como técnico, ao dirigir o time de 1980 a 1981. O ex-centroavante era o segundo comandante dos Leões do Atlas de etnia francesa nascido no Marrocos, caso também de Guy Cluseau, nativo de Rabat, que dirigiu o time em dois momentos distintos nas décadas anteriores. E se nos anos 1980 os treinadores que impulsionaram os marroquinos eram brasileiros, em especial o carioca José Faria, dentro de campo o intercâmbio futebolístico com a França voltou a se notar.

A seleção de Marrocos que disputou as Olimpíadas de 1984 e a Copa de 1986 contava com dois irmãos que jogavam na França: Abdelkrim Merry e Mustapha Merry, nascidos em Casablanca nos anos 1950. Mais velho, Abdelkrim (que era mais conhecido pelo apelido Krimau) se firmou como um atacante talentoso mas inconstante do Campeonato Francês. Teve seus melhores momentos num forte Bastia, antes de rodar por diferentes clubes da primeira divisão, incluindo Lille, Metz e Saint-Étienne. Já era um veterano quando disputou o Mundial no México. Já o caçula Mustapha Merry aproveitou os caminhos desbravados pelo irmão e se mudou para o futebol francês na virada dos anos 1980. Era um atacante menos prolífico, mas que teve seu auge no Valenciennes.

Contratado pelo Racing Besançon pouco antes da Copa de 1986, o meio-campista Azzedine Amanallah foi outro representante do Campeonato Francês naquele elenco. E o sucesso de Marrocos no México, em campanha que alcançou as oitavas de final, rendeu bons contratos a vários jogadores com clubes europeus – inclusive franceses. Destaques do time como os meias Abdelaziz Bouderbala e Mustafa El Haddaoui acabaram atraídos para a Division 1. Suas ligações com a França, ainda assim, não passava da proposta profissional. Algo diferente do que se notaria em pouco tempo, com raízes mais profundas.

Os imigrantes e seus descendentes

Mustapha Hadji

Apesar das relações coloniais estabelecidas desde a década de 1910, as correntes migratórias de Marrocos rumo à França continental eram pequenas durante o período do Protetorado. Alguns milhares de trabalhadores marroquinos foram incentivados a se estabelecerem no território francês, já a partir do período entre guerras, mas não representavam uma comunidade tão expressiva em números. Tal fluxo se ampliou um pouco mais após a Segunda Guerra Mundial, apesar do contexto de independência marroquina. De qualquer maneira, foi a partir da segunda metade da década de 1970 que realmente o número de imigrantes vindos de Marrocos se expandiu. Trabalhadores que procuravam melhores condições de vida e formavam suas famílias nos subúrbios das grandes cidades da França.

A diáspora marroquina, de uma maneira geral, se dispersou muito além das antigas metrópoles. A França ainda possui o maior grupo de imigrantes e descendentes, seguida pela Espanha, mas há comunidades marroquinas com mais de 100 mil pessoas em países como Israel, Holanda, Bélgica, Itália, Estados Unidos, Alemanha, Emirados Árabes Unidos e Canadá. O total de pessoas de origem marroquina vivendo em território francês se aproxima de 1,5 milhão, atrás apenas dos argelinos. O futebol, como de costume, serviria como um caminho para a integração.

A partir da década de 1990, jogadores marroquinos que emigraram para a França na infância ou que já nasceram no novo país passaram a despontar no Campeonato Francês. É o caso de Mustapha Hadji, um dos maiores símbolos dos Leões do Atlas. O armador nasceu em Ifrane, uma comunidade rural ao sul do Marrocos, em 1971. Mudou-se com a família quando tinha dez anos e viveu primeiro em Saint-Étienne, antes de se mudar para a região fronteiriça com a Alemanha. Foi por lá que o craque despontou, com a camisa do Nancy, mas sem se desligar das origens.

Mustapha Hadji foi convocado por Raymond Domènech para as seleções de base da França quando tinha 21 anos. Teria a chance de ser companheiro de outra promessa de origem africana, o filho de argelinos Zinédine Zidane. Porém, o novato manifestou o desejo de vestir a camisa de Marrocos. Não seria uma má escolha, pensando que os Bleus logo depois perderam a vaga na Copa de 1994 e os Leões do Atlas se classificaram. O meia vestiu a 7 no Mundial dos Estados Unidos. Hassan Kachloul e Smahi Triki eram outros nascidos em Marrocos e criados na França naquele time de 1994. Também apareciam membros de outras correntes migratórias: o meio-campista Rachid Azzouzi cresceu na Alemanha e o lateral Nacer Abdellah cresceu na Bélgica.

Hadji precisou lidar com as críticas por renegar a seleção da França. Depois de deixar o Nancy em 1996, o meia faria o restante de sua carreira no exterior – em clubes como o Sporting, o Deportivo de La Coruña, o Coventry City e o Aston Villa. Na época da Copa de 1998, o camisa 7 tinha mais companhias entre os franco-marroquinos. O meio-campista Gharib Amzine já fazia parte da geração de filhos de marroquinos, nascido na região da Borgonha, perto da fronteira com a Suíça. Aquele time também contava com o primeiro filho da imigração na Holanda. E os Leões do Atlas acabavam dirigidos por um francês: Henri Michel. O treinador dos Bleus na Copa de 1986 assumira a equipe marroquina em 1995 e seria responsável por um dos períodos de maior qualidade dentro de campo, mesmo que a classificação aos mata-matas do Mundial de 1998 não tenha acontecido. Era o primeiro francês a assumir o Marrocos desde Fontaine.

Regragui e as gerações dos tempos de seca

Regragui encara Drogba

A virada do século marca a eclosão no número de jogadores de futebol com ascendência no Marrocos e em outros países do norte da África que nasceram ou cresceram na França. São os filhos de imigrantes que tiveram melhores condições para se dedicar ao esporte, enquanto também viam na bola uma ferramenta de ascensão social. Assim, os descendentes de marroquinos tornaram-se bastante comuns na seleção de Marrocos e alguns também apareceram na França. É interessante notar, porém, que os nativos franceses dos Leões do Atlas costumam ser menos numerosos do que nos vizinhos Argélia e Tunísia, ao passo que também se misturam aos descendentes de outras diásporas marroquinas pelo mundo – em especial da Bélgica e da Holanda.

Marrocos não se classificou às Copas do Mundo de 2002 a 2014, mas a presença de jogadores nascidos ou criados na França se tornou mais frequente nesse período. A começar por Youssouf Hadji, irmão mais novo de Mustapha, que tinha apenas dois anos quando se mudou com a família e seguiria os passos do irmão no Nancy. O atacante compôs os Leões do Atlas na campanha mais importante nesse período sem Mundiais, durante o vice na Copa Africana de Nações em 2004. Aquele time ainda contava com Abdeslam Ouaddou e Jaouad Zairi, outros dois nativos de Marrocos que emigraram à França quando crianças. De qualquer forma, mais notáveis eram os cinco jogadores que já tinham nascido em cidades francesas, descendentes de marroquinos.

Eleito o melhor lateral direito daquela competição, Walid Regragui vestia a camisa 2 dos Leões do Atlas. O atual treinador da seleção é natural de Corbeil-Essones, nos subúrbios de Paris. Filho de pais de origem amazigh, o garoto costumava passar dois meses por ano na cidade de sua família em Marrocos. Regragui recebeu grande incentivo dentro de casa para concluir seus estudos e obteve um diploma universitário, em ciências econômicas e sociais. Até por conta disso, sua carreira levou um tempo para deslanchar. Já tinha 23 anos quando assinou com o Toulouse e finalmente apareceu num time de elite, treinado por Alain Giresse. Ao mesmo tempo, a partir de 2001, passou a frequentar as convocações dos Leões do Atlas.

Outros colegas de Regragui naquele time de 2004 fizeram até mais fama no futebol. A começar por Marouane Chamakh, o grande protagonista da geração de Marrocos sem Copas. O centroavante nasceu em Tonneins, no sudoeste da França, filho de pais marroquinos. Defendeu brevemente a França Sub-19, mas logo optou pelos Leões do Atlas quando se firmava como destaque do Bordeaux. Ainda tinha a companhia no setor ofensivo de Houssine Kharja, mais um protagonista de Marrocos naqueles tempos de seca. O meia cresceu em Paris e passou pela base do Paris Saint-Germain, embora os principais momentos de sua carreira tenham acontecido na Itália, inclusive passando por Internazionale e Roma. O atacante Nabil Baha, nascido no nordeste da França, e o lateral Jamal Alioui, de Saint-Étienne, completavam a legião de franco-marroquinos na CAN 2004.

Marrocos passou por uma entressafra grande no futebol depois daquela final perdida na Copa Africana. Além da ausência nos Mundiais, a equipe teve quatro participações na CAN sem passar da fase de grupos, enquanto sequer esteve presente no torneio em 2010 e 2015. Tempos difíceis, em que os descendentes nascidos na França não eram tão numerosos nos Leões do Atlas quanto na vizinha Argélia, mas garantiam uma dose mínima de talento. Entre os nativos franceses estavam Abdelhamid El Kaoutari, Youssef El Arabi e Abdelaziz Barrada. Já Adel Taarabt nasceu no próprio território marroquino, antes de se mudar com a família para a Provença quando tinha nove meses.

Nesse período, Marrocos chegou inclusive a perder alguns convocáveis que acabaram atraídos por outras seleções africanas. Muitos imigrantes marroquinos que se estabeleceram na França formaram famílias misturando origens, não só com franceses, mas também com outras nacionalidades. São jogadores que poderiam optar por uma terceira seleção, além de França ou Marrocos, e acabaram persuadidos a seguir esse outro caminho. Filho de pai argelino, Riyad Mahrez costumava frequentar o país desde a infância, mas também poderia ter um destino distinto no futebol por causa da mãe marroquina. Em 2014, às vésperas da Copa, preferiu jogar pelas Raposas do Deserto. É um caso parecido com o de Ismaël Bennacer, filho de pai marroquino e mãe argelina. O meio-campista das seleções francesas de base foi sondado pelas duas federações africanas em 2016. Preferiu a Argélia, que ofereceu uma convocação à seleção principal, enquanto Marrocos o chamaria para os juniores.

As últimas Copas do Mundo

Romain Saïss (Alexander Hassenstein/Getty Images)

Desde a última década, alguns descendentes de marroquinos também se firmaram na seleção principal da França. Se os nomes marroquinos nas categorias de base são mais frequentes, foram poucos os que chegaram ao nível adulto dos Bleus. Filho de marroquinos nascido na região fronteiriça com a Suíça, Younès Kaboul estreou pela seleção francesa em 2011 e não chegou a figurar em nenhuma grande competição. Acumulou seis partidas pela equipe principal, antes de deixar as listas de Laurent Blanc. Não teve o mesmo sucesso de Adil Rami, pinçado pelos Bleus a partir de 2010.

Rami é natural da Provença, filho de pais marroquinos. Quando começava a despontar no Lille, o zagueiro foi convidado para se juntar à seleção de Marrocos para a Copa Africana de Nações de 2008, em tempos nos quais Henri Michel estava de volta aos Leões do Atlas. Entretanto, o jovem foi bastante honesto com o treinador e enfatizou que desejava mesmo atuar pela França. Cumpriria seu desejo em pouco tempo, tornando-se importante sobretudo a partir da chegada de Didier Deschamps. Rami esteve presente na Eurocopa em 2012 e em 2016. Já o ápice de sua carreira aconteceu em 2018, como reserva, mas um personagem carismático na conquista da Copa do Mundo. Naquele mesmo torneio, ao menos, outros descendentes de marroquinos voltavam a botar o país de seus pais no mapa das Copas.

A França se tornou a base principal de Marrocos para reaparecer na Copa do Mundo em 2018, após 20 anos de ausência. Oito jogadores franceses de nascimento impulsionavam os Leões do Atlas, então treinados por Hervé Renard, um francês com ascendência polonesa. A principal liderança daquele time era Mehdi Benatia. O zagueiro nasceu nos subúrbios de Paris, com pai de Marrocos, mas a mãe da Argélia. Passou por Clairefontaine e jogou na seleção francesa sub-17, até aceitar um chamado para jogar pelos Leões do Atlas ainda na base. Sua estreia pelo time adulto aconteceu em 2009 e, pelo nível atingido, poderia muito bem ter se encaixado na defesa dos Bleus em seu auge.

Se a carreira de Benatia teve seus melhores momentos na Alemanha e na Itália, o nome daquele time de Marrocos mais celebrado na França é o de Younès Belhanda. O armador é da região sudeste do país, filho de marroquinos, e teve uma bela fase no Montpellier. Formava uma baita parceria com Olivier Giroud na conquista da Ligue 1 em 2011/12. Nesta época, já tinha se decidido por Marrocos. Até jogou pelo sub-20 da França, mas em 2010 estreou pelos Leões do Atlas. Outro destaque na Rússia foi Amine Harit. O meia dos subúrbios de Paris passou por todos os níveis dos Bleus do sub-18 ao sub-21, mas decidiu por Marrocos na seleção principal. Costumava passar as férias em Casablanca e até frequentava os jogos do Wydad na infância. Justificaria sua opção como um jeito de “representar sua família da maneira mais apropriada”.

A defesa de Marrocos em 2018 incluía também Manuel da Costa, filho de pai português e mãe marroquina nascido no nordeste da França. Era torcedor do Porto na infância e jogou pela base de Portugal, além de ter sido chamado por Felipão à seleção adulta, mas sem entrar em campo. Depois de ficar longe das convocações lusitanas por seis anos, ainda elegível por Marrocos, abriu as portas para os Leões do Atlas a partir de 2014. Youssef Aït Bennacer, Khalid Boutaïb e Fayçal Fajr eram outros franceses de nascimento sob as ordens de Hervé Renard, nenhum deles com passagens pelos Bleus na base. Por fim, Romain Saïss é o único francês nativo que se repete nos elencos de Marrocos em 2018 e 2022. Justamente o capitão da atual jornada.

A mãe de Saïss nasceu na França, enquanto seu pai saiu de Marrocos. O zagueiro do sudeste da França era torcedor fanático do Olympique de Marseille desde a infância e acabou influenciado a seguir carreira numa família de jogadores amadores. Saïss ainda passou um bom tempo nas divisões de acesso do Campeonato Francês, só estreando na Ligue 1 com 25 anos. A esta altura, já tinha sido convocado pela primeira vez por Marrocos e não passou perto de defender os Bleus. Virou um nome importante na zaga principalmente no ciclo anterior à Copa de 2018 e, além de se colocar como o parceiro ideal de Benatia, herdou a braçadeira de capitão.

Boufal e sua mãe (Alexander Hassenstein/Getty Images/One Football)

Em 2022, depois do corte de Harit, somente outro jogador nascido na França defende Marrocos. É o ponta Sofiane Boufal, um dos maiores talentos do time. O camisa 17 nasceu na região metropolitana de Paris e foi criado pela mãe marroquina, empregada doméstica, que educou sozinha os filhos depois do divórcio do marido. E o contato com o país de origem da família também se manteve através de seu pai, que voltou a viver no Marrocos. Com a mudança para a cidade de Angers na infância, o meia se desenvolveu no próprio Angers, então na segunda divisão. Foi outro descoberto por Marrocos antes de entrar em qualquer tipo de radar da França, convocado a partir de 2015. Se não foi à Rússia, no Catar exibe o seu melhor com Walid Regragui, depois de ganhar moral já nos tempos de Vahid Halilhodzic.

Já do outro lado, Boufal e Saïss terão um adversário de mesma origem em Matteo Guendouzi. O meio-campista é o único jogador descendente de marroquinos na atual seleção da França. Sua mãe é francesa, enquanto o pai é franco-marroquino. Quando defendia as seleções de base dos Bleus, o volante recebeu o convite para jogar por Marrocos. Seu pai chegou a se encontrar com Hervé Renard, mas o jovem preferiu declinar a oportunidade. Seriam quatro anos de espera até finalmente estrear pela França no nível adulto e, com tantos desfalques, acabar chamado à Copa do Mundo.

Talvez essa disputa por talentos abarque outros nomes no futuro. Revelação do Monaco e contratado pelo Nice na atual temporada, Sofiane Diop é descendente de senegaleses e marroquinos. Por enquanto, o meia de 22 anos defende as seleções francesas de base, mas seria um acréscimo e tanto para os Leões do Atlas. Outro observado com atenção é Kays Ruiz-Atil, meia de 20 anos do Auxerre. Tem ascendentes espanhóis e marroquinos, mas, depois de jogar pelas seleções de base de Marrocos, defendeu também a França no Sub-20.

Independentemente do caminho até a seleção, o que precisa ser valorizado é o sentimento. Algo que Walid Regragui bem resumiria, sobre um debate que ele conhece tão bem. Acima do multiculturalismo dos Leões do Atlas e das diferentes origens, o técnico enfatiza a entrega pela seleção: “Sempre batalhei no Marrocos para dizer que todo marroquino com a nacionalidade é marroquino se ele quiser lutar e morrer por essa camisa, seja ele da França, da Bélgica, de Marrocos ou de qualquer lugar. Um exemplo: eu nasci na França, mas ninguém tem coração mais marroquino que eu. Quando você vem para a seleção, tem que dar 100%”. E ninguém ousa refutar que todos os marroquinos estão dando 100% no Catar, sejam eles nativos ou filhos da diáspora. Nesta quarta, os franco-marroquinos terão uma motivação a mais.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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