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Agüero não estará nos livros dessa Copa, mas foi um dos personagens mais legais da Argentina campeã

Agüero não parecia ter qualquer vaidade para festejar seus companheiros, em especial Messi, a quem carregou nos ombros por todo o gramado

Toda seleção campeã do mundo costuma ter o seu jogador “bom de grupo”. Aquele cara que não faz a diferença necessariamente em campo, mas que auxilia demais no ambiente favorável de um time vencedor. Algumas figuras célebres das Copas se encaixam nessa ideia – e talvez o mais unânime seja a versão boa gente de Lukas Podolski em 2014. Pois se a Argentina pudesse, certamente entregaria uma medalha ao seu 27° homem: Sergio Agüero, onipresente no ambiente albiceleste, mesmo tendo indo ao Catar para curtir. E curtiu demais ao lado dos velhos amigos.

Pesa muito a vivência que Agüero tem com o grupo, claro. O atacante pode não ter sido na seleção tudo o que foi nos clubes, mas sempre teve uma relação ótima com a maioria absoluta dos jogadores – especialmente com Lionel Messi, seu compadre. O título da Copa América de 2021, em partes, premiou essa representatividade de Kun ao futebol argentino. Mas, se o veterano precisou encerrar a carreira de forma repentina por causa de um problema cardíaco, ele seguiu acolhido no vestiário da Albiceleste. Estava ainda mais solto, sem os compromissos com o jogador, para ser o cara que deixa o ambiente mais leve.

E deu para ver bem como Agüero se empenhou nisso. Durante os jogos, estava nas arquibancadas, sofrendo. Não foram poucos os vídeos em que o ex-atacante aparecia cantando com a torcida ou vibrando pelo time, sem nem querer olhar para os pênaltis de Messi. Nos corredores do Mundial, Kun também manteve sua imagem como boa praça ao lado de quem passasse. E sem deixar de gravar suas lives, a ponto de conversar ao vivo com os jogadores enquanto estavam concentrados. Também fez análises pertinentes sobre futebol – como, por exemplo, destacar minuciosamente os pontos fortes da Arábia Saudita antes mesmo da derrota.

Já nos últimos dias, Agüero estava cada vez mais absorvido como o tal 27° jogador. Entrou no gramado para comemorar a classificação contra a Holanda, com roupa social e tudo. Passou a participar dos treinamentos, inclusive cobrando pênaltis para Emi Martínez defender. Já às vésperas da decisão, a AFA decidiu readmitir de vez o medalhão: seria ele a dividir o quarto com Messi na concentração antes da partida contra a França, como em tantos outros momentos da Albiceleste. Em vez de ser pé frio, Kun foi um verdadeiro talismã. Pôde experimentar também desse momento.

E depois da conquista, claro, Agüero estava em campo. Parecia mais feliz do que qualquer outro pelo título mundial da Argentina. Feliz como um torcedor pelo feito do país, feliz como companheiro pelo sucesso dos velhos amigos. Várias fotos e vários vídeos do gramado em Doha mostram o veterano em sua própria loucura, tocando um bumbo ou aloprando qualquer um. Mas nada é mais simbólica do que a imagem em que carrega Messi em seus ombros, com a taça nas mãos do craque. “O melhor do mundo tem que levar a Copa do Mundo. Te amo, amigo”, escreveu em suas redes sociais.

Os companheiros, é claro, fizeram questão que Agüero erguesse a taça também no pódio e o festejaram como se ele fosse mais um campeão. E ele continuou fora da casinha nos vestiários. Era mais um a puxar as brincadeiras e a celebração. Baforava um charuto da vitória. Era como se nunca tivesse parado de jogar, como se nunca tivesse deixado a seleção. Saiu do estádio até no mesmo ônibus, dividindo banco com Messi. O camisa 10 com sua medalha, o antigo camisa 19 com seu crachá. Outra declaração de amor: “O melhor do mundo, é o melhor amigo. Te amo”.

O nome de Agüero não estará nos livros dessa Copas. Esse vai ser o Mundial que ele não disputou. E o mais legal é perceber que o atacante não tem qualquer vaidade por isso. Seu contentamento é genuíno, especialmente por ver tanta gente que ele conhece bem, sobretudo Messi, chegando no topo do mundo. No fim das contas, ele também se sente assim. E se não há medalha, bem que a Fifa poderia instituir o “Troféu Bom de Grupo” para 2026 – mais importante que o prêmio de fair play, convenhamos. Agüero teria sido hors-concours em 2022.

 

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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