A nova versão da Tuna Luso, que luta contra a transfobia em parceria com festival de música
Tradicional clube de Belém e hoje na Série D, a Tuna Luso aproveita parceria com o festival Psica para rejuvenescer a torcida e promover ações de inclusão social

O que o atual maior festival de música do Norte do Brasil tem a ver com a tradicional Tuna Luso? Agora, tudo. Neste começo de 2025, o clube de origem lusitana de Belém oficializou uma importante acordo com o Psica. E a parceria vai muito além do futebol e faz jus a ideia da atual diretoria do clube de uma “nova Tuna”.
A Trivela esteve em Belém, visitou o Estádio Francisco Vasques, o Souza, e conversou com representantes da Tuna Lusa e do Psica para entender como esta parceria pode colocar o clube paraense em evidência no futebol brasileiro. Dentro e fora de campo.
No começo da temporada, em uma das primeiras ações da nova gestão da Tuna Luso, comandada por Miltoniel Santos, o clube anunciou o Psica como novo patrocinador do clube. O festival de música, já tradicional em Belém e que vem crescendo no cenário nacional, está estampando a barra frontal da camisa da Tuna.
Mas, como falado, a parceria entre Psica e Tuna Luso vai além do campo. Na primeira grande ação entre as partes, a Tuna disponibilizou uma lista “trans-free” para a partida contra o Paysandu, pela terceira rodada do Campeonato Paraense, no fim de janeiro.
A ação, que também contou com a parceria da Rede Paraense de Pessoas Trans, permitiu a entrada gratuita de pessoas trans, travestis e não binárias no clássico com o Paysandu. No jogo, que aconteceu em 28 de janeiro, um dia antes do Dia Nacional da Visibilidade Trans, os jogadores da Tuna Luso ainda entraram em campo com uma faixa contra a transfobia. A lista “trans-free” já é uma tradição no festival Psica e, agora, também será disponibilizada em jogos da Tuna.
No mesmo jogo com o Papão, na Curuzu, os jogadores da Tuna Luso ainda entraram com uma faixa contra a transfobia. O Psica também apoiou esta parte da ação e teve a sua marca estampada na faixa.

DJ, vice-presidente da Tuna é responsável por parceria
O responsável por colocar a Tuna Luso nessa “nova era” foi Roberto Figueiredo. DJ e produtor cultural, ele foi eleito vice-presidente do clube no fim de 2024 e faz parte da nova gestão do clube, comandada por Miltoniel Sobral, e que assumiu o clube neste começo de temporada. Dono de um tradicional bar de Belém, Roberto é sócio do clube desde 2002. Agora, ele é o primeiro negro eleito para a direção da mais que centenária Tuna Luso, clube de origem portuguesa.
— A Tuna é um time de 1903, criado por portugueses, tudo muito tradicional. Hoje está tendo pela primeira vez um representante negro, que pensa fora da caixinha deles, que tem uma visão completamente diferente, muito mais cabeça aberta. Eu não vim para ficar dentro desse quadrado. Eu já pulei esse muro da Almirante Barroso (avenida em que fica o estádio e a sede da Tuna) — comentou Roberto Figueiredo à Trivela.
— É por isso que falamos muito da nova Tuna. Com a minha chegada na Tuna, outras pessoas chegaram. O Psica chegou. A gente insiste nesse nome de “nova” para as pessoas entenderem que tem um pensamento novo, por mais que os outros dois que estão me acompanhando já estejam lá há mais tempo que eu. Mas eu estou levando essa modernidade, ideia de novas pessoas — completou o dirigente da Tuna.

A chegada do Psica na Tuna Luso é o maior exemplo dessa “nova Tuna”. O festival já havia tentado uma parceria com o clube em 2023, mas gestão do clube na época não demonstrou interesse neste patrocínio “alternativo”.
— Quando a gente fechou com o Psica, a ideia era essa, ir atrás de um público mais jovem. Para eles entenderem que eles podem adentrar aquele espaço, que eles tem espaço na Tuna. A gente vem pensando nisso há um ano e meio. Não estamos falando mais de futebol só. Estamos indo para a cultura, entretenimento, trazendo um grupo que não frequenta a Tuna, de gays, trans, negros — explicou Roberto Figueiredo.
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Por que o Psica escolheu a Tuna Lusa?
Para Gerson Junior e Jeft Dias, irmãos que comandam o Psica, a presença de Roberto Figueiredo foi essencial para o festival virar parceiro da Tuna Lusa. Mas, antes disso, já havia um desejo de juntar duas paixões da dupla: música e futebol. E tudo se encaixou para valorizar e dar outra cara para o tradicional clube de Belém.
— O Roberto é um parceiro nosso de muito tempo, um cara super conhecido, importante para o cenário cultural de Belém. Ele já movimenta a cena há décadas. E a gente conheceu ele nesse contexto, em eventos — disse Gerson Junior à Trivela.
— Nós, como festival, temos nossas diretrizes e valores. E levar isso para a Tuna, com essa gestão que tem esses valores, é muito importante. Estamos levando diversidade cultural para dentro de um clube de futebol que foi criado por portugueses. A gente consegue com a Tuna porque tem uma diretoria que é aberta para essas novas visões e os torcedores não tem essa visão tão homofóbica e transfóbica de que “não quero no nosso estádio”. É uma visão mais agregadora — completou um dos idealizadores do Psica.
Além de qualquer retorno financeiro ou de visibilidade que o Psica possa ter com a entrada no futebol, Gerson, assim como Roberto Figueiredo, também reforçou como esta parceria pode ser essencial para renovar o público da Tuna Luso.
— Tentamos trazer outra cara para a Tuna. Aproximar de volta a Tuna com a periferia. E levamos a Tuna para dentro do festival. Isso é muito importante. A Tuna precisa de torcedores. E a Tuna é um time que todo mundo gosta aqui em Belém, independente de ser Remo ou Paysandu. Todo mundo tem um carinho pela Tuna. A gente acaba juntando e trazendo de volta essas pessoas que estão afastados do futebol de volta para o campo. É muito importante essa parceria. Damos um novo ar. E como produtora de eventos é bom estar presente no futebol também — ressaltou Gerson.

Com quase 15 anos de existência, o Psica vem crescendo a cada ano. Em 2024, o festival teve nomes como Liniker, João Gomes, Pablo Vittar, BaianaSystem, Skatalites e Fafá de Belém (cantando o clássico disco “Água”). Foram três dias de shows, sendo um deles gratuito, e cerca de 100 mil pessoas no Mangueirão.
Mais ações da parceria entre Tuna Luso e Psica
A listra trans-free foi apenas a primeira das ações que a Tuna Luso e o Psica vão realizar com esta nova parceria. E muitas delas vão, de fato, além do futebol. O festival, que é o segundo maior patrocinador do clube, atrás apenas do banco Banpará, também vai apoiar as outras modalidades esportivas do clube paraense, como o vôlei, a natação e o futsal.
O Souza também entrar na rota desta parceria. O festival e o clube já planejam uma série de eventos musicais que devem ocorrer ao longo do ano no estádio da Tuna, com shows de artistas nacionais, em uma espécie de “mini-Psica”. Para isso, o Psica também deve ajudar com a parte estrutural necessária para o local receber os shows.
No futebol, além do dinheiro investido no patrocínio para estampar a marca do Psica na camisa da Tuna, o festival também vai apoiar as categorias de base do clube. As partes planejam um projeto para o festival “apadrinhar” jogadores das categorias inferiores e ajudar financeiramente alguns desses garotos.

E o futebol da Tuna Luso?
Depois de um ano sem série, a Tuna Luso voltará a disputar a Série D do Campeonato Brasileiro em 2025. Mais do que isso. O clube de Belém conseguiu ter o calendário praticamente cheio na temporada. Além do Campeonato Paraense, a Tuna já disputou a Super Copa Grão-Pará e ficou com o vice-campeonato, perdendo para o Paysandu.
Além disso, o time cruz-maltino também disputou a Copa do Brasil. Na primeira fase, a Tuna eliminou o Sampaio Corrêa ao vencer por 1 a 0, no Souza. Na segunda fase, o time de Belém acabou eliminado pelo CSA, fora de casa. Com a participação na competição, a Tuna garantiu R$ 1,83 milhão em premiação.
Em 2025, a Tuna Luso celebra 40 anos do título da Taça de Prata, equivalente a segunda divisão do futebol brasileiro na época. A Tuna foi o primeiro clube do Norte a conquistar um título nacional. A comemoração, é claro, será celebrada ao longo do ano. O vice-presidente Roberto Figueiredo, é claro, também quer fazer Águia Guerreira voltar a alçar voos mais altos no futebol, assim como fez com a cultura de Belém. E, se há alguma dúvida sobre a sua função que ele exerce, Roberto deixa claro qual o seu objetivo.
— Eu sou um cara que persiste e acredita. Me defino como um cara que nunca desiste da vida, da minha cidade e, agora, da Tuna. Que venha com grandes novidades e volte para o lugar que nunca deveria ter saído — finaliza Roberto Figueiredo.