Torcedor do São Paulo foi morto pela PM há um ano e ainda não há consequências; veja
O são-paulino Rafael dos Santos Tercílio Garcia foi atingido na cabeça por munição "bean bag", que teria partido da arma de um cabo da Polícia Militar
Em 24 de setembro de 2023, o São Paulo comemorou sua grande glória em mais de uma década com o título da Copa do Brasil sobre o Flamengo. Um dia histórico, de redenção à torcida que tanto sofreu nos anos anteriores, mas que também é lembrado por um triste fato.
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Durante confusões no entorno do Morumbis logo após a conquista, o torcedor Rafael dos Santos Tercílio Garcia foi morto após sofrer um tiro da bala “bean bag” (saco de feijão, em tradução livre) na nuca.
Segundo investigação da Polícia Militar paulista, finalizada em dezembro do ano passado, o tiro partiu da escopeta do cabo Wesley Carvalho Dias da Silva, que responde em liberdade após ser indiciado por homicídio culposo (sem intenção de matar).
— Choro todo dia. Só vou ficar em paz quando o culpado for punido. É uma falta de respeito total. — lamentou Vilma Custódio dos Santos, mãe de Rafael, ao jornal Folha de São Paulo.
O torcedor nem tinha conseguido entrar no estádio para acompanhar o time. Apaixonado pelo clube, Rafael queria celebrar o título nos entornos do Morumbis para estar na atmosfera da decisão.
— Tanto faz se [o jogo do São Paulo] era aqui ou fora, Rafael estava junto. Ele era tão fanático que eu acho que roupa normal ele quase não tinha. Mas roupa do São Paulo ele tinha muito. — disse Vilma, ao Fantástico, em 2023.
A confusão aconteceu entre o cruzamento das ruas Jules Rimet e Sérgio Paulo Freddi, onde a PM tentou impedir que alguns membros da torcida invadissem o estádio.
Rafael foi atingido pelo tiro a curta distância e, apesar de levado a um hospital, não resistiu.
As bean bags têm sido utilizada pela PM paulista como forma de substituir as balas de borracha e são feitas de um tecido sintético que envolve pequenas bolas de metal.
Ao contrário do que teria feito o cabo Wesley Carvalho Dias da Silva, os disparos de bean bag devem ser feitos a seis metros e nunca em direção a cabeça, segundo manual da PM.
O são-paulino tinha deficiência auditiva e fazia parte da ala “Surdos e Mudos” da torcida organizada Independente Tricolor, a maior do clube paulista.
Então, por que, passados 365 dias da morte do torcedor são-paulino, ninguém foi responsabilizado?
Investigação por morte de torcedor do São Paulo não avança
A investigação da Polícia Militar, indiciando o cabo por homicídio culposo, foi encaminhada à Justiça Militar em dezembro de 2023.
A defesa de Wesley Carvalho Dias da Silva discordou do indiciamento por entender que o cabo não cumpriu as exigências para ser réu por homicídio culposo.
— O homicídio culposo é configurado por atos de negligência, imprudência ou imperícia no uso do armamento ou no procedimento policial, atos que em momento algum o cabo Wesley cometeu. — disse João Carlos Campanini, advogado do PM, à Folha em fevereiro.
Ao mesmo tempo que a PM apurava, o Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil, iniciou sua investigação, que perdura até hoje e agora está junto do inquérito da PM.
Ainda segundo a Folha, o DHPP pediu cinco vezes para que a investigação fosse prorrogada entre 30 de outubro de 2023 a 27 de agosto de 2024.
A Polícia Civil aguardava até o último mês a entrega de um laudo 3D vindo do Instituto de Criminalística (IC), da Polícia Científica, para poder dar andamento a investigação.
— Se tratando de investigação conduzida por delegacia especializada, surpreende a morosidade para conclusão do laudo pericial de reprodução simulada dos fatos, levantamento 3D. Já passou um ano do lamentável fato que vitimou Rafael e a família aguarda uma resposta definitiva e a aplicação das devidas responsabilidades. — afirmou à Folha o advogado da família de Rafael, Tiago Ziurkelis, emendando:
— Vamos aguardar a conclusão do levantamento 3D, para atribuir o grau da responsabilidade e a tipificação penal.
Em nota à Folha, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) de São Paulo afirmou que os laudos da perícia já foram concluídos, aguardando a análise do DHPP para conclusão do inquérito policial, que será encaminhado ao Ministério Público.
— O prazo inicial para a conclusão de um IPM é de 40 dias, podendo sofrer prorrogações caso haja a necessidade de produção de provas ou laudos mais complexos. Cada investigação, portanto, tem sua peculiaridade e dura o tempo necessário para o total esclarecimento dos fatos para que a devida responsabilização seja aplicada. — justificou a lentidão da investigação, em nota, a gestão do governador Tarcisio de Freitas (Republicanos).