Maurício Noriega: Botafogo tem muito a aprender com o Fortaleza
Em pleno ataque de nervos, o líder e ainda favorito ao título nacional precisa da paciência e da confiança no trabalho que marcam o maior time do Nordeste hoje
A classificação do Fortaleza para a final da Sul-americana deixa a sensação de que o primeiro título internacional do futebol do Nordeste brasileiro nunca esteve tão próximo. A história de reconstrução e afirmação do Leão do Pici deve ser vista como um ensinamento para o Botafogo, líder e ainda grande favorito à conquista do Campeonato Brasileiro. Em meio a um injustificável ataque de nervos, o Fogão coloca em risco sua história de reconstrução.
A resiliência e a confiança demonstradas pelo Fortaleza em seu projeto foram determinantes. Méritos para o presidente Marcelo Paz, que segurou o treinador argentino Juan Pablo Vojvoda quando o time frequentou a zona de rebaixamento do Brasileirão por 14 rodadas, ano passado. Vojvoda também mostrou comprometimento com o projeto e a instituição ao recusar ofertas que vieram de clubes maiores. Ao não se deixar seduzir como havia feito Rogério Ceni, que largou o Fortaleza pelo Flamengo, Vojvoda deu sustentação ao trabalho e pode ser apontado hoje, sem exageros, como um dos maiores, senão o maior treinador da história do clube.
O Fortaleza tem planos de migrar para o modelo SAF (Sociedade Anônima do Futebol), adotado pelo Botafogo em sua retomada. Além da diferença de projetos e modelos, existem alguns pontos nos quais o Botafogo deveria se inspirar no Fortaleza.
O primeiro deles parece ser o próprio dono do clube, o empresário norte-americano John Textor. Ainda noviço no mundo do futebol, Textor não tem a experiência e o conhecimento do ambiente demonstrados por Marcelo Paz, que inclusive atuou como comentarista esportivo entre 2012 e 2013. Textor e seu grupos de gestores de futebol são extremamente suscetíveis ao comportamento da torcida e dos jogadores do Botafogo. Tiveram dificuldades para lidar com os chiliques dos treinadores portugueses que passaram pelo clube. O segundo erro não foi do clube, mas de quem a instituição contratou. A Luís Castro faltou o comprometimento demonstrado por Vojvoda ao projeto do Fortaleza. A Bruno Lage faltou controle emocional para lidar com uma oscilação prevista e anunciada. O terceiro erro pode ser o mais grave. O Botafogo pode estar repetindo a insanidade do rival Flamengo, que entregou a chave do vestiário para os jogadores e perdeu o controle do time. A conferir.
Nos confrontos semifinais diante do Corinthians, o trabalho coletivo do Fortaleza sepultou velhas teses de peso de camisa e supostas estratégias defensivas para levar decisões para as penalidades. Fato é que o time paulista estava pendurado desde a classificação que não mereceu diante do Estudiantes. O Corinthians desenvolveu alergia à bola. Seus jogadores parecem ter urticária quando a redonda fica muito tempo em seus pés. Mano Menezes terá muito trabalho para evitar que o rebaixamento entre em pauta.
O Botafogo precisa agora lidar com a precipitada ira de sua torcida. O time segue com vantagem administrável e precisa acreditar no que foi construído até agora. A lição das 14 rodadas na zona de rebaixamento do Fortaleza precisa ser aprendida. O que ficou evidente é que quando trouxe Lage o Bota pareceu apostar mais na nacionalidade que na racionalidade. Porque o auxiliar Cláudio Caçapa estava ali, conhecia o trabalho de Castro, era conhecido pelos jogadores, não precisava de adaptação e nem trazia ideias diferentes.
O tempo dirá se o Botafogo vai sucumbir aos nervos ou beberá da fonte serena do Fortaleza.