Brasileirão Série A

Demissão de Diniz do São Paulo vai além dos problemas em campo: tem muito tumulto causado pela nova gestão

Fernando Diniz foi demitido do São Paulo, depois de um ano e quatro meses. Contratado em 27 de setembro de 2019, ele viveu momentos de muita pressão no clube e não conseguiu se manter no cargo depois da pior série de resultados à frente da equipe. A sua saída envolve fatores fora e dentro de campo. Fora de campo, o clube vive bastidores tumultuados com a troca da presidência, em dezembro, e mudanças internas que foram feitas. Em campo, o time viu seus problemas se agravarem e, ao contrário de outras vezes, a equipe não conseguiu reagir e o técnico também não conseguiu mudar o rumo, como tinha conseguido ao longo desse período, depois de momentos de eliminação e pressão intensas.

O início: chegada conturbada

Diniz chegou ao São Paulo depois de poucos meses com Cuca no comando do time. Foi quando Vagner Mancini esperava ser efetivado, de coordenador para técnico, como tinha acontecido meses antes. Naquele ano de 2019, o São Paulo começou sob o comando de André Jardine, em seu primeiro trabalho como treinador efetivo, depois de muito sucesso na base – curiosamente, assumindo o time a cinco rodadas do fim, após a precipitada demissão de Diego Aguirre, no final de 2018. Só que a eliminação na fase preliminar da Libertadores para o Talleres pesou contra e ele foi demitido.

Vagner Mancini assumiu interinamente, por um mês e meio, enquanto o São Paulo esperava a recuperação de Cuca, que estava com um problema de saúde. Mancini foi bem no comando, deu lugar a Cuca e o técnico assumiu o time na semifinal do Campeonato Paulista, eliminando o Palmeiras nos pênaltis e perdendo a final para o Corinthians. No Brasileiro, a trajetória foi errática e o time acabou não engrenando. Depois de uma derrota para o Goiás por 1 a 0 no Morumbi, com o time em sexto na tabela, Cuca pediu demissão alegando que não conseguia extrair mais nada da equipe.

A saída de Cuca fez com que Vagner Mancini imaginasse que seria colocado como técnico, pelo bom rendimento no curto período que teve à frente do time antes da chegada de Cuca. Não foi o que aconteceu. Depois de consultar os jogadores, a diretoria trouxe Fernando Diniz, o preferido do elenco. Ele assumiu o cargo no dia 27 de setembro, pronto para estrear já no dia 28 contra o badalado Flamengo, no Rio. Mancini deixou o clube.

O São Paulo terminou em sexto na tabela no Brasileiro de 2019, sem mudar a posição desde a saída do treinador anterior. Foi o suficiente para se classificar diretamente à fase de grupos da Libertadores, porque entre os cinco primeiros estavam Flamengo, campeão da Libertadores, Athletico Paranaense, campeão da Copa do Brasil.

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Temporada 2020 de eliminações e liderança

O início de trabalho em 2020 foi promissor, com o São Paulo conseguindo bom desempenho e bons resultados no Campeonato Paulista. Ainda assim, a campanha na Libertadores preocupava, com um início terrível: perdeu do Binacional na estreia, fora de casa. Tinha, porém, vencido a LDU em casa com autoridade. O mundo parou pela pandemia da COVID-19 e não se sabia como e nem quando tudo voltaria.

A volta do futebol aconteceu em julho, com as quartas de final do Campeonato Paulista. A derrota pra um time do Mirassol montado às pressas, já que a maioria dos jogadores só tinha contrato até maio, foi ridícula. Jogando muito mal, os comandados de Diniz perderam por 3 a 2. Eliminados, a pressão sobre o técnico aumentou.

Em agosto, começou o Campeonato Brasileiro. Entre altos e baixos, o time ia bem, conquistava pontos e figurava dentro do G4. Mas na Libertadores, a eliminação se tornou inevitável depois de empate com o River no Morumbi, derrota por goleada para a LDU fora e nova derrota para o River Plate na Argentina. O jogo contra o Binacional, no Morumbi, serviu apenas para assegurar o terceiro lugar no grupo e a classificação para a Sul-Americana.

A eliminação na Libertadores aumentou mais a pressão sobre Diniz, que já era grande. Os rumores sobre a sua demissão voltaram a acontecer, com mais força. O elenco abraçou o técnico e Raí, diretor de futebol, segurou a pressão e pediu à diretoria para não atender aos pedidos pela saída do treinador, por dizer que acreditava no trabalho. A diretoria o manteve, com o time brigando nas posições de cima da tabela. Na Copa do Brasil, o São Paulo enfrentou o Fortaleza, e sofreu para avançar. Empatou por 3 a 3 em Fortaleza, empatou por 2 a 2 no Morumbi (depois de abrir 2 a 0) e só avançou nos pênaltis, de forma cardíaca. As críticas a Diniz aumentaram.

Veio, então, um momento chave para a manutenção do técnico e uma subida do time: uma vitória por 4 a 1 sobre o forte Flamengo no Maracanã. Resultado que enfraqueceu o técnico Domenec Torrent, que seria demitido pouco depois, enquanto Diniz ganhou fôlego. Os jogos contra o Flamengo, aliás, foram cruciais para Diniz. Esse primeiro foi uma loucura, com dois pênaltis perdidos pelos rubro-negros e um aproveitamento excepcional de chances dos tricolores. Viriam outros dois.

Nas quartas de final da Copa do Brasil, o São Pulo pegou um dos piores adversários possíveis: o Flamengo. E conseguiu uma vitória por 2 a 1, fora de casa, graças a uma falha do goleiro Hugo Souza, que surpreendeu. Foi a primeira vez que Rogério Ceni, ídolo do time paulista, dirigiu o Flamengo, onde assumiu o lugar de Torrent. No jogo de volta, no Morumbi, o São Paulo não deu a menor chance, venceu por 3 a 0. Avançou na competição e ganhou força para a briga no Campeonato Brasileiro.

No Brasileirão, o São Paulo disparou depois da goleada sobre o Flamengo no Maracanã. Do dia 6 de setembro, quando venceu o Fluminense por 3 a 1, até o dia 9 de dezembro, quando venceu o Botafogo por 4 a 0, o time engrenou 17 jogos sem derrota, com 10 vitórias e sete empates.

Eleições e mudanças na diretoria

O São Paulo passava por eleições e, no dia 12 de dezembro, Julio Casares venceu o pleito. Substituiria Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, a partir do primeiro dia de 2021. Embora fosse da situação, Casares tinha ideias diferentes de Leco e era apoiado por um grupo que queria a demissão de Fernando Diniz desde a eliminação no Campeonato Paulista. Mais do que isso: queria a saída também de Raí como diretor do futebol.

Tudo isso já criou um ambiente complicado, mas o que mais complicou foi a saída de Alexandre Pássaro, gerente de futebol. A saída dele era um ponto inegociável para a nova gestão. Raí ganhou sobrevida até fevereiro, tal qual Diniz. Pássaro deixou o clube, o que desagradou os jogadores e a comissão técnica. Foi ele quem negociou a redução dos salários na pandemia e era uma linha de confiança entre o elenco e a diretoria. Era quem segurava a onda de possíveis problemas, eventuais atrasos de direitos de imagem, ou mesmo ouvia pedidos para blindar o vestiário, o que ele fazia.

Casares também trocou a equipe de comunicação do clube. Trouxe Muricy Ramalho para trabalhar como coordenador de futebol. O ex-técnico, ídolo do clube, se tornou mais um ponto de pressão sobre a comissão técnica. Somado tudo isso, o vestiário ficou mais suscetível a interferências políticas de diretores, os jogadores se sentiram mais desprotegidos e Raí se tornou apenas uma figura decorativa, já que tinha aviso prévio para deixar o cargo de diretor depois do fim do Campeonato Brasileiro.

Não é uma coincidência que desde que começaram as mudanças na gestão, a partir da eleição, no dia 12 de dezembro, o São Paulo tenha vencido só duas partidas. Informações passaram a vazar com mais frequência, o ambiente tumultuado criava ainda mais dificuldades para o São Paulo resolver os problemas em campo, que começaram a ficar mais graves.

O começo do fim

No dia 13 de dezembro, no clássico contra o Corinthians, na Neo Química Arena, em Itaquera, onde nunca venceu, o São Paulo foi derrotado por 1 a 0. Mais do que perder, o time foi superado em todos os aspectos pelo rival, que jogou mais e poderia ter vencido até de forma mais tranquila do que o placar mínimo. Foi um abalo, que começaria a ruir o time.

Um dos pontos mais críticos da caminhada de Diniz no São Paulo foi a semifinal da Copa do Brasil. Em dois jogos muito diferentes, o time enfrentou o Grêmio. No jogo de ida, em Porto Alegre, uma boa atuação, mas derrota por 1 a 0, perdendo algumas chances claras. Havia convicção que, jogando no mesmo nível, em casa, o time poderia vencer e avançar. No segundo jogo, no Morumbi, um 0 a 0 que Rento Portaluppi anulou e travou o time paulista, que ficou tal qual peixe fora d’água, se debatendo, impotente em reagir a uma estratégia defensiva bem sucedida. O desempenho ruim na partida, com nova eliminação, novamente aumentou a carga sobre a comissão técnica.

Dali em diante, o time passou a sofrer mais. Duas estratégias diferentes passaram a ser usadas contra o São Paulo de Diniz, ambas envolvendo pressão. O Grêmio, com a meia pressão que exerceu no seu jogo, tinha uma postura bastante defensiva e não pressionava lá no alto, mas sim na intermediária. Deixava os defensores receberem a bola, mas pressionava jogadores como Daniel Alves. Mas havia outro jeito de enfrentar o São Paulo que também teve sucesso, como as rodadas seguintes mostrariam.

Goleadas, perda da liderança e falta de vitórias

O Red Bull Bragantino foi quem destruiu o São Paulo de forma violenta. Já em 2021, o São Paulo foi demolido por uma pressão sufocante do Bragantino, que resolvia os lances em poucos toques na bola. Exerceu uma pressão gigantesca por poucos minutos, suficientes para fazer os gols que já colocaram o time em uma imensa vantagem. Venceu por 4 a 2, mas poderia ter feito mais gols. Se tivesse feito seis não seria nenhum exagero.

Taticamente perdido, mentalmente derretido, o time ainda viu o emocional ir abaixo pela discussão feroz entre Tchê Tchê e Diniz. As palavras violentas do técnico contra o jogador acabariam sendo resolvidas depois, mas as marcas ficaram.

O desentendimento, segundo pessoas do São Paulo, foi resolvido. Técnico e jogador se entenderam. Mas começou a haver mais questionamento interno também, com alguns jogadores incomodados com diferenças de tratamento entre o técnico e Daniel Alves em relação a outros jogadores.

O nervosismo era visível em campo. O time que jogava com confiança e jogava se impondo desmoronou. Depois de perder do Bragantino, perdeu do time reserva do Santos por 1 a 0. Depois, empatou por 1 a 1 com o Athletico Paranaense, sem jogar bem. Veio, então, o maior golpe na gestão Diniz: o duelo direto com o Internacional, no Morumbi, com o São Paulo podendo perder a liderança em caso de derrota. Mais do que perder, foi goleado por 5 a 1, a maior derrota na história do time no Morumbi. Um jogo que o Inter emulou o que fez o Bragantino, pressionando muito no início do jogo, gerando erros, fazendo os gols e colocando uma boa vantagem.

Enquanto isso, o São Paulo negociava com um novo diretor de futebol, até fechar com Rui Costa, ex-Grêmio, Chapecoente e Atlético Mineiro, na última semana. Mais um motivo de instabilidade para um time já abalado por todos os lados.

Com o time em frangalhos, os resultados continuaram a não vir. Empate por 1 a 1 com o Coritiba e depois chegamos à derrota por 2 a 1 para o Atlético Goianiense, neste domingo. Com isso, o time completou seis jogos sem vencer. A última vitória foi no dia 26 de dezembro, mais de um mês antes. A diretoria então resolveu demitir Diniz, a cinco rodadas do fim do Brasileiro. Raí, que sairia ao final da competição, decidiu sair junto.

Diniz deixa o São Paulo em quarto lugar no Campeonato Brasileiro, com 58 pontos, mesma pontuação do Flamengo, que tem um jogo a menos. Para garantir a participação na próxima fase de grupos da Libertadores, precisa ficar entre os quatro primeiros colocados. O Fluminense tem 53, em quinto, enquanto o Palmeiras tem 52, com um jogo a menos, mesma pontuação do Grêmio, este com o mesmo número de jogos.

Agora, o São Paulo deve ter um treinador interino para as cinco rodadas finais, enquanto a diretoria provavelmente já deve ter Rui Costa trabalhando para trazer um novo técnico para a temporada que já começa em fevereiro.

Diniz teve o melhor elenco da sua carreira até aqui, teve alguns bons momentos e entregou mais do que se esperava deste time do São Paulo, pensando em termos de Campeonato Brasileiro 2020. Os fracassos nos torneios eliminatórios, do Paulista à Libertadores, passando por Sul-Americana e Copa do Brasil, foram minando o seu trabalho. A derrocada no Brasileirão tirou todo o crédito que ele tinha, ainda mais com uma diretoria que nunca quis mantê-lo. Sua saída era certa, a não ser que ele revertesse o cenário de modo improvável e conquistasse o título, algo que está claro que não acontecerá.

O São Paulo precisará encontrar um novo técnico, mas precisa também resolver os problemas de bastidores. Sem ter um bom ambiente de trabalho, qualquer técnico que vier poderá sofrer. Ainda mais porque se sabe que a situação financeira do clube não é boa e é provável que o elenco para a próxima temporada seja enfraquecido, com a saída de alguns jogadores com valor de mercado para potenciais vendas. Quem for assumir o time terá um trabalho muito duro pela frente.

Foto de Felipe Lobo

Felipe Lobo

Formado em Comunicação e Multimeios na PUC-SP e Jornalismo pela USP, encontrou no jornalismo a melhor forma de unir duas paixões: futebol e escrever. Acha que é um grande técnico no Football Manager e se apaixonou por futebol italiano (Forza Inter!). Saiu da posição de leitor para trabalhar na Trivela em 2009, onde ficou até 2023.
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