Seleção chilena contraria a federação e realiza tributo a indígena assassinado no sul do país

Na última quarta-feira, o mapuche Camilo Catrillanca foi assassinado no sul do Chile com um tiro na cabeça. O rapaz de 24 anos, neto de um líder indígena, estava dirigindo seu trator em uma área rural quando foi atingido. A polícia afirma que ladrões cometeram o crime. Contudo, a explicação não parece suficiente para muita gente. A região de Araucanía é palco de antigos conflitos por terras mapuche, envolvendo fazendeiros e grandes empresas. Além disso, durante os últimos meses, uma força militar especial atua no local sob ordens do governo. Enquanto os policiais negam a existência de imagens sobre o assassinato, o governo confirmou que elas foram destruídas. Desde a morte de Catrillanca, diferentes protestos aconteceram ao redor do país, com prédios incendiados no interior e manifestações massivas em Santiago. O presidente Sebastián Piñera prometeu empenho máximo nas investigações. Já a ONU cobra o Ministério Público por uma atuação mais incisiva.
Diante desse contexto, o futebol não se manteve alheio à discussão da sociedade. A seleção chilena enfrentou Honduras nesta terça, em Temuco, coincidentemente a capital de Araucanía. O elenco solicitou à federação chilena que um minuto de silêncio fosse respeitado em memória a Catrillanca. O pedido foi negado, mas não terminou acatado pelos jogadores. Antes que a bola rolasse no Estádio Bicentenário Germán Becker, titulares e reservas de ambas as seleções se abraçaram ao redor do círculo central, respeitando o seu próprio minuto de silêncio. O ato recebeu os aplausos da torcida. “Foi uma reflexão, um chamado à paz e à tranquilidade. Esperamos que tudo se solucione da melhor maneira possível”, declarou Gary Medel, capitão da seleção chilena.
Já o veterano Jean Beausejour foi além. Com origens mapuches, além de haitianas, o lateral resolveu utilizar seu sobrenome indígena na camisa: Coliqueo. “É uma homenagem à toda minha família mapuche. Tinha a ideia desde o princípio e foi uma coincidência ante tudo o que está passando. O gesto é um sinal de paz, não de divisão. Sentimos que a seleção deve ser mais transversal. Não queremos que esse conflito continue. A pressão social sobre as autoridades no caso Catrillanca é correta. Soube que um superintendente renunciou. Acreditamos que a seleção é uma das poucas coisas que nos unem, é um chamado à reflexão para que exista justiça e que os responsáveis pelo crime tenham a sentença correspondente. Creio que as instituições, como a federação, precisam se manter um pouco à margem, mas estou feliz pela coragem dos meus companheiros neste gesto”, disse.
Os chilenos terminaram a partida goleando por 4 a 1, com dois gols de Arturo Vidal, além de um anotado por Nicolás Castillo e outro por Alexis Sánchez. Os próprios clubes chilenos se envolveram no episódio. Durante a manhã de terça-feira, o Colo-Colo também havia pedido à federação que o tributo fosse realizado no jogo da seleção. Vale lembrar que o nome e o escudo do clube homenageiam um antigo líder mapuche que foi figura central na Guerra de Arauco, em que os indígenas enfrentaram o exército da coroa espanhola por mais de dois séculos para combater a invasão de suas terras. Os mapuche venceram o conflito no final do Século XVIII e se mantiveram independentes por 111 anos, até a Ocupação de Araucanía realizada pela república chilena em 1883.
Há alguns dias, o mapuche Camilo Catrillanca foi assassinado pela polícia chilena em um episódio ainda mal esclarecido. Jogadores do Chile queriam minuto de silêncio no amistoso de hoje. Não levaram. Jean Beausejour protestou usando seu sobrenome mapuche na camiseta: Coliqueo. pic.twitter.com/k1iiLg1AJ3
— Impedimento (@impedimento) 21 de novembro de 2018