Libertadores

Torcedores do Palmeiras vão processar agência por ‘terror’ e ingresso errado na Argentina

Palmeirenses passaram horas retidos pelo polícia e mal conseguiram assistir ao jogo pela semifinal da Libertadores

Um grupo de aproximadamente 30 torcedores do Palmeiras se organiza para entrar com uma ação conjunta na Justiça. O alvo é a agência Turisport, contratada por eles para venda de pacotes de transporte aéreo, traslado e venda de ingressos para o primeiro jogo da semifinal da Copa Libertadores entre Boca Juniors e o clube alviverde, na última quinta-feira (28), em Buenos Aires. 

Em contato com a Trivela, os torcedores relataram terem recebido ingressos destinados à torcida do Boca para a partida. Além disso, afirmam que não tiveram a escolta policial prometida para se deslocar do ponto de encontro definido pela agência, no bairro da Recoleta, para Puerto Madero, ponto de encontro dos palmeirenses determinado pela polícia. Tampouco houve apoio presencial de funcionários da companhia, conforme também estava acertado.

No trajeto entre La Recoleta e Puerto Madero, os ônibus com palmeirenses foram alvos de latas, garrafas e outros objetos. Vidraças ficaram trincadas.

No dia do jogo, um grupo de quase 90 torcedores ficou retido no bairro de Puerto Madero por quase três horas, impedido de partir para La Bombonera, enquanto os ônibus que deviam levá-los partia com menos de uma dúzia de torcedores para o local do jogo.

— Os policiais nos cercaram e depois nos levaram para um ônibus qualquer, onde ficamos quase uma hora sem saber o que seria feito com a gente — contou Guilherme Molina, 37.

— A Polícia revistou os ingressos, constatou que eram para torcedores do Boca Juniors e nos manteve esperando, enquanto todos partiam para o jogo — relata Caio Iglesias, 28, um dos prejudicados. 

— Ficamos sem poder ir para lugar nenhum, sem poder ir embora, sem poder pegar um táxi, nada — contou à Trivela Tomaz P., 29. 

Os torcedores aguardaram sem informações e contato com a Turisport. Quando seus ônibus enfim chegaram, o grupo partiu e chegou enfim a La Boca. Mas lá ainda, perto da região turística do Caminito, aguardaram sem informações, até serem levados ao estádio.

— O ônibus que nos levou para La Boca não foi o que contratamos. Era um coletivo de dois andares. No de baixo, só havia pessoas com colete de quem ia trabalhar no estádio, com dizeres como “fiscalização”, “orientação” — contou Tomaz V. 

Quando chegaram ao estádio, já com o jogo em andamento, após diversas barreiras policiais, os torcedores ficaram ainda retidos por um período, sendo liberados para entrar no setor de visitantes apenas no início do 2º tempo. “Como num passe de mágica”, disse Caio Iglesias.

Ingresso de sócio do Boca vendido como de torcedor visitante aos palmeirenses (Caio Iglesias/Acervo pessoal)

— Nossos ingressos nem passaram na catraca. Um funcionário do estádio ia recolhendo um a um, enquanto liberava a entrada com um crachá — disse Tomaz V. — Muitos nem entraram. E dos que entraram, uma parte nem conseguiu passar do túnel para ver o jogo. Só viu o segundo tempo quem saiu correndo para conseguir lugar.

— Eu mesmo só vi o jogo por ser alto. Eu levantava meu celular e filmava. Vi pela tela, o que acontecia no campo — conta Guilherme Molina.  

Valores díspares

Tomaz e o amigo Caio Iglesias, 28, pagaram R$ 4500 à vista cada, por meio de pix, apenas pelo traslado e pelo ingresso. O valor de face dos ingressos, que eram destinados a sócios do Boca Juniors, marcava 4 mil pesos – o equivalente a R$ 58,40 pelo câmbio oficial de hoje.

— Nossos ingressos nem passaram pelas catracas. Um funcionário do estádio recolhia nossos ingressos e usava um cartão seu para liberar a entrada — contou Tomaz.

Já Molina, que contratou o serviço com muita antecedência, pagou R$ 5600 por hotel, aéreo e ingresso.   

Desde segunda-feira, a Turisport vem procurando os torcedores para acordos extrajudiciais. 

— Eles estão oferecendo créditos em viagens futuras e ingressos para a final da Libertadores — disse Iglesias à reportagem. — Mas não há como confiar, depois de tudo que aconteceu.

Ônibus de torcedores do Boca que cruzou com palmeirenses e os alvejou (Tomaz P./ Acervo pessoal)

Recomendação de outros torcedores

Caio e Thomas souberam da Turisport no dia em que os torcedores que conseguiram comprar ingressos pelo Avanti foram retirar seus bilhetes fisicamente no clube. 

— Eu fui até lá para tentar comprar de alguém que tivesse conseguido comprar e tivesse desistido — contou Thomas. 

— Nisso, uma pessoa me abordou e disse que havia uma agência que tinha ingressos para vender. Eu então fiz contato com o Caio e decidimos comprar — afirmou.

Ambos sócios do Avanti, eles não conseguiram comprar ingressos no dia em que as vendas abriram, mas decidiram reservar hotel e passagens assim mesmo, na esperança de conseguirem ingressos. De modo que a Turisport “caiu do céu” naquele momento. 

No site da companhia, é possível ver que a empresa comercializou pacotes com ingressos de visitantes para os jogos do Palmeiras contra o Atlético-MG e o Deportivo Pereira, em Belo Horizonte e na Colômbia respectivamente.

A agência também já anuncia pacotes para as finais da Sul-Americana e da Libertadores, além do Mundial de Clubes e do Super Bowl 2024, que será jogado em Las Vegas, nos EUA.     

Conversas robotizadas

Os torcedores prejudicados não conseguiram contato com a Turisport até a noite de sexta-feira (29), um dia depois do jogo. Por meio do WhatsApp, a companhia pedia desculpas pelo ocorrido e pela falta de contato, além de se dizer surpresa com tudo que aconteceu. 

A promessa da agência era que os contatos para uma compensação seriam feitos a partir da segunda-feira, dia 2. De fato, a companhia iniciou algumas tratativas na data estipulada.  

A Trivela teve acesso a prints das conversas entre os torcedores e a Turisport, com as ofertas de acordo extrajudicial. 

— Mas não é possível manter um diálogo. Você pergunta e o que vem parece ser uma resposta automática, não é possível argumentar — afirma Caio Iglesias. 

— Sendo bem transparente, eu estou menos preocupado com ter meu prejuízo ressarcido do que com ajudar para que as pessoas responsáveis sejam punidas — diz Guilherme Molina.

Palmeiras não tem relação com empresa

O Palmeiras não tem qualquer ligação com a Turisport. Todos os ingressos destinados pelo Boca Juniors à torcida alviverde foram comercializados pela agência oficial Palmeiras Viagens, pelo sistema do Avanti e por meio de um guichê para conselheiros do clube na sede social. 

Outro lado: “Sofri um golpe”

A Turisport foi procurada pela reportagem para expor o seu lado da história. Armando Raymundo Neto, 34, dono da agência, concedeu entrevista à Trivela por telefone, na qual afirmou ter sido enganado por um fornecedor da Argentina que afirmava ter acesso a ingressos para visitantes.  

“Eu caí num golpe”, disse ele, que alega que desconhecia o fato de que apenas o Palmeiras tinha direito à comercialização oficial de ingressos de visitante. Ele também confirma que não tinha qualquer relação comercial com o clube alviverde. E não sabe explicar como alguns clientes dele tinham ingressos legítimos de visitante. 

— Na urgência de entregar ingressos para esse pessoal que não entrou, eu quase comprei a carga de ingressos novamente, de outro fornecedor. Mas, quando ele não quis me fornecer o endereço da empresa, achei suspeito e desisti — conta. 

— Entregamos a maior parte do que negociamos, como hotel, parte aérea e transfer. Mesmo assim queremos ressarcir tanto quanto for possível para amenizar as perdas dos nossos clientes — alega Armando.

Armando, que estava na Argentina no dia 28 e diz ter atuado com uma equipe de sete pessoas para desembaraçar a questão e conseguir a entrada dos torcedores, afirma desconhecer o fato de que ônibus que prestaram serviços à sua empresa foram apedrejados: 

— Eles foram escoltados, até onde sei. Meu fornecedor de ônibus na Argentina foi contratado com escolta — disse.  

— Estamos tentando um meio termo para compensar as pessoas prejudicadas. Foi um erro operacional, não agimos de má-fé. Estou há pouco tempo nesse mercado, será um prejuízo grande, mas é a minha prioridade — diz. 

O CNPJ da Turisport está ativo desde abril. 

Foto de Diego Iwata Lima

Diego Iwata LimaSetorista

Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero, Diego cursou também psicologia, além de extensões em cinema, economia e marketing. Iniciou sua carreira na Gazeta Mercantil, em 2000, depois passou a comandar parte do departamento de comunicação da Warner Bros, no Brasil, em 2003. Passou por Diário de S. Paulo, Folha de S. Paulo, ESPN, UOL e agências de comunicação. Cobriu as Copas de 2010, 2014 e 2018, além do Super Bowl 50. Está na Trivela desde 2023.
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