Africa

No turbilhão político que vive o Egito, todo cuidado é pouco, até no futebol

No ano passado, o jogador Ahmed Abdel-Zaher, ainda no Al Ahly, não deixou de expressar sua insatisfação com o momento político conturbado que vive o Egito, fazendo o sinal da Rabaa, característico dos islamitas que se opõem aos militares que tomaram o poder no país. Isso causou problemas para o atleta na época, que acabou emprestado para o futebol líbio. Aparentemente ninguém mais quer arranjar encrenca por gestos dentro de campo.

Na segunda-feira, em rodada do Campeonato Egípcio, Atef El-Afi apitava o confronto entre El-Gouna e El-Entag El-Harby e, perto do final do jogo, foi sinalizar que daria quatro minutos de acréscimo. Pronto para levantar quatro dedos para indicar quantos minutos seriam acrescidos, El-Afi lembrou que este é justamente o sinal da Rabaa e, em vez disso, levantou dois dedos de cada mão, como se estivesse fazendo um duplo sinal de paz.

O árbitro garantiu que nunca alguém da Federação Egípcia falou sobre o assunto, proibindo algum gesto entre os árbitros, mas ele quis apenas evitar um estresse desnecessário. “Ninguém da Federação pediu para nós (árbitros) fazermos algum sinal específico. Só queria evitar usar algo que pudesse ser interpretado como sinal político. Não há lugar para política no futebol, e eu apenas não queria ser mal interpretado”, contou El-Afi, em entrevista ao site egípcio FilGoal.

Em 2012, os egípcios foram às urnas para a primeira eleição democrática da história do país. Mohamed Morsi foi o eleito, mas ficou no poder por pouco mais de um ano, até ser deposto em julho do ano passado em um golpe militar. Desde então, a situação política do Egito vive grande instabilidade, centenas de pessoas foram mortas em 2013 em confrontos com as forças armadas, e o futebol no país não fica completamente alheio a tudo isso.

A torcida do Al Ahly, que desempenhou papel importante na queda de Hosni Mubarak em 2011, por exemplo, envolveu-se em diversas confusões com a polícia egípcia no ano passado, sem falar no próprio jogador do time, Abdel-Zaher, que deu a cara a bater com sua comemoração polêmica e teve de deixar o país. Com coisas tão graves acontecendo, é difícil fechar os olhos e ignorar, mesmo em uma praça esportiva. A precaução do árbitro, no entanto, é completamente compreensível. É preciso ter muita coragem para se arriscar com o atleta do Al Ahly fez.

Foto de Leo Escudeiro

Leo Escudeiro

Apaixonado pela estética em torno do futebol tanto quanto pelo esporte em si. Formado em jornalismo pela Cásper Líbero, com pós-graduação em futebol pela Universidade Trivela (alerta de piada, não temos curso). Respeita o passado do esporte, mas quer é saber do futuro (“interesse eterno pelo futebol moderno!”).
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