Shakhtar Donetsk: Prepare-se para dizer esse nome

Em junho desse ano, surgiu a notícia de que o São Paulo poderia perder sua dupla de zaga (Fabão e Rodrigo) para um clube da Europa, mais precisamente da Ucrânia. A notícia não chegou a surpreender, já que é cada vez mais freqüente a saída de jogadores brasileiros para países não tão famosos no futebol, como Bulgária, Catar e a própria Ucrânia. O que pegou pra muita gente foi o nome do time interessado nos zagueiros. A equipe em questão era o quase impronunciável Shakhtar Donetsk.
O nome pegou muita gente, mas algumas pessoas que nunca tiveram contato com o futebol já o conheciam. É que Shakhtar Donetsk é o nome de uma música do cantor Joe Strummer, do seu álbum Global A Go-Go. A canção fala de um imigrante de origem ucraniana que chega à Inglaterra atrás de nova vida.
Apesar da obra de Strummer falar sobre um imigrante – e ter por conseqüência uma característica ´´rebelde´´- a origem do Shakhtar não segue essa linha. O clube foi fundado em 1936, através de um decreto do governo soviético (do qual a Ucrânia ainda fazia parte) que estabelecia que os mineiros de Donetsk precisavam de um clube de futebol para aprimorar seus treinamentos físicos. Já que a ordem veio de cima, não havia como fugir dela, e o clube foi fundado.
E se ´´Shakhtar´´ parece impronunciável, o que dizer dos dois primeiros nomes do clube, ´´Ugolshchiki´´ e ´´Stakhanovyets´´? Não sabemos se o motivo foi a dificuldade em dizer o nome do time nas arquibancadas, mas o fato é que esses nomes tiveram vida curta, e o atual é usado desde 1946. Ou melhor – apesar de já ser chamado de Shakhtar desde esse ano, o Donetsk só fez parte do nome da equipe a partir de 1961. É que até esse ano a cidade-sede do clube tinha o simpático nome de Stalino, em homenagem ao não menos simpático presidente da URSS Josef Stalin. Quando em 1961 a cidade se renomeou, a equipe passou a ser chamada definitivamente de Shakhtar Donetsk.
Rei de Copas
Já como Shakhtar, o clube fez relativo sucesso nos campeonatos da antiga URSS, que disputou até 1991, ano do desmembramento do império soviético. Era difícil para um time de fora da Rússia se sagrar campeão da URSS – e na Ucrânia, havia ainda o Dínamo Kiev, um dos maiores clubes soviéticos de todos os tempos. Com todas essas dificuldades, o Shakhtar não conseguiu levantar em nenhuma oportunidade o caneco do Campeonato da URSS. Por outro lado, o time se especializou em outro tipo de competição, as Copas. Foram quatro conquistas, em 1960/61, 1961/62, 1979/80 e 1982/83. É o segundo clube da Ucrânia com mais conquistas na Copa, perdendo apenas para o poderoso Dínamo.
Veio a independência da Ucrânia, e a fama do Shakhtar continuou. Os mineiros levantaram a Copa do ´´novo´´ país em 1994/95, 96/97, 2000/01, 2001/02 e a conquista mais recente, na temporada 2003/04. O título desse ano foi sacramentada com uma vitória suada sobre o surpreendente Dnipro Dnipropetrovsk, com gols no primeiro e no último minuto de jogo, marcados por Belyk e Tymoschuk.
O milagre do título nacional
Mas nenhuma conquista foi tão celebrada pelos mineiros como a obtida na temporada 2001/02. Pela primeira vez desde sua fundação, o time conseguiu ser campeão nacional. Naquela temporada, como de costume, as atenções estavam voltadas para o Dínamo Kiev, detentor dos últimos nove títulos. Mas o Shakhtar havia provado desde o começo que não estava para brincadeira, e foi perseguindo o Dínamo na tabela ao longo do campeonato.
Só que o time da capital tinha todas as condições de levar o título com uma rodada de antecedência quando as duas equipes se enfrentaram em Donetsk. Com dois pontos de vantagem, bastava uma vitória na casa do adversário para o Dínamo ganhar seu décimo título nacional seguido. Ou até o empate seria um bom resultado, já que bastaria vencer o último jogo do torneio para comemorar mais uma vez.
E o jogo seguia sem gols até os 43 minutos do primeiro tempo, quando a torcida do Shakhtar comemorou pela primeira vez na partida. De uma forma inusitada: Fedorov marcou contra o patrimônio e colocou os mineiros na frente. Veio o segundo tempo e o Shakhtar segurou a pressão, ainda ampliando a vantagem no término da partida, com mais um gol contra. Dessa vez a alegria dos mineiros foi feita por Gavrancic. O triunfo histórico fez com que o Shakhtar ficasse a uma simples vitória do título nacional. E derrotando o Zakarpattya Uzhhorod no último jogo por 1×0, o Shakhtar comemorou o primeiro título nacional de sua história, de quebra acabando a seqüência de nove campeonatos seguintes do Dínamo Kiev.
Nova fase?
Vencendo o campeonato nacional, o Shakhtar se permitiu sonhar mais alto. O clube mostrou que era possível alguém fazer frente ao Dínamo Kiev na Ucrânia. E mais que isso: porque não sonhar com a Europa?
Em 2003/4 o Shakhtar disputará a fase de grupos da Liga dos Campeões, na chave C, contra Barcelona, Milan e Celtic. Não será a primeira vez que o clube jogará a competição; mas neste ano o clube já não entra como o mesmo desconhecido da outra temporada. As conquistas recentes na Ucrânia dão margem aos sonhos dos mineiros. Tudo isso, somado à estrutura profissional que possui o clube Donetsk – o presidente é Rinat Akhmetov, uma espécie de versão humilde de Roman Abramovich, do Chelsea – faz com que o nome do Shakhtar seja cada vez menos desconhecido. Talvez seja a hora de acostumar a língua para pronunciar uma nova palavra no mundo do futebol.