Seleção da década de 00's: Palmeiras
Claudio Kristeller*
Começo agradecendo ao Zobaran e ao Zarko a oportunidade de tingir este ótimo blog de verde. É bom iniciar em paz, quando as recordações a seguir nem sempre amainam o espírito dos palmeirenses.
Na década em que o Campeão do Século XX dormiu em berço não tão esplêndido, o que faltou na sala de troféus sobrou em jogadores. De Missos a Gioinos, foram 218 atletas (eu contei!). Deles, extraiu-se o onze mais digno desses dez anos tantas vezes indignos, em que a torcida – de verde, de branco, de azul e de amarelo-elétrico-limão-fluorescente-marca-texto – sofreu tanto quanto sorriu, mas esteve sempre presente.
O canto do cisne verde foi eliminar em 2000 o Corinthians da Libertadores pela segunda vez, no pênalti mais importante da história do futebol (Baggio? Quem é Baggio?); depois disso, o vice na Libertadores e a seguir os anos negros de Mustafá, dos quais o clube até hoje não se recuperou totalmente. Ainda assim, chegamos ao fim deste período trazendo de positivo o discutível orgulho de ser o primeiro grande a cair e voltar sem tapetão (com o Botafogo ao lado), algumas taças – um Paulista, um Rio-SP e uma Copa dos Campeões, e mais de três anos sem derrotas no derby. Além, claro, do privilégio de termos apreciado esses valorosos jogadores:
Goleiro
Nem precisa do texto, o leitor já sabe quem é. Permitam-me ainda assim tecer loas ao único jogador que atravessou a década no Palestra – e que de quebra teve ótima participação na Copa de 2002. Diego Cavalieri foi bem, mas Marcos (2000-2009; 377J na década) é hors-concours, ídolo hoje e daqui a 50 anos. Dele perdoam-se até as incríveis e recorrentes falhas, que só mostram que o Santo também é humano, ainda que eterno.
Foto: MArcos agarrando o penalti na libertadores
Legenda:
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O pênalti que valeu uma década
Lateral-direito
Talvez a posição mais carente em toda a década, onde um olho bastaria para sobressair nesta terra de cegos. Mas Arce (2000-2002; 124J) tinha não só os dois olhos, como o pé mais calibrado do decênio. É o estrangeiro que mais atuou na história do clube, e foi o autor do último gol de um jogador então no Palmeiras em uma Copa do Mundo. Vaga garantida para o paraguaio na Seleção da década, e banco de reservas na do centenário do clube.
Zagueiros
Gamarra teve seis meses de Luís Pereira e seis de Gladstone; escalá-lo não condiz com seu currículo de craque. Daniel fez boa Série B, mas na volta à Primeira Divisão não decolou. Nen, low-profile mas eficiente, foi quem mais jogou; tivesse ganho um título, seria titular desta equipe. Os escalados, porém, são Henrique (2008; 26J), o membro desta Seleção que menos jogou pelo clube, mas que foi fundamental para a conquista do Estadual, e cuja saída mostrou por meio de inúmeros gols sofridos o quão importante era; e Danilo (2009; 63J), que chegou sob desconfiança, porém se tornou inquestionável ao formar uma defesa pouco vazada no ano, e nos leva a crer que os próximos anos serão melhores.
Lateral-esquerdo
O mais importante da década foi Lúcio, o ex-quarto melhor lateral do mundo, mas eu seria excomungado ao escolhê-lo. Tivesse menos preguiça de jogar bola, Leandro seria o ungido. Mas o legítimo dono da posição é o mesmo da década de 90: Júnior (2000; 38J), por sua memorável Libertadores em 2000. Um craque de quem não se fala tanto quanto merece.
Volantes
Cada time tem seu inconfundível estilo de jogo (hoje, com a qualidade que restou em solo nacional, é tudo bola pro mato e chuveirinho na área, mas vamos falar da tradição); o Palmeiras tem historicamente uma maneira cadenciada, envolvente e letal de atuar – não à toa Ademir da Guia é o ícone do clube. Entretanto, uma das escolhas mais fáceis desta seleção prima não por sua altivez, mas por sua raça e dedicação. Pierre (2007-2009; 139J) combina tempo de casa, apoio irrestrito da arquibancada e uma genuína alegria de estar no Palmeiras, tão em falta atualmente. Seu companheiro, que superou nomes como Fernando, Magrão e Jumar (opa, aí também não) é Correa (2003-2006; 191J), o principal coringa da década e representante de um período em que, mesmo com dois quartos lugares consecutivos no Brasileiro, ainda se sabia que os títulos estavam longe. Além disso, fez o gol da vitória no jogo que, Libertadores à parte, talvez tenha sido o mais emocionante da década. Desculpa, Flu.
Meias
Serão 3, para acomodar os bons nomes que passaram nestes anos, e mesmo assim alguns jogadores dignos de nota, como Pedrinho, Juninho Paulista e Marcinho “Porpeta“ ficam de fora.
O primeiro é o chapeleiro Alex (2000-2002; 77J), último legítimo e indiscutível craque (na linha) a vestir o manto verde no auge de seu talento, e que quase oito anos depois ainda desfila em alto nível. Sua última passagem – foram três – encerrou-se em 2002, mas sua volta até hoje é o pedido de Natal de nove em cada dez palestrinos.
Foto : Alex com a camisa do palemiras sem patrocíniop
Legenda: Foi um panamá ou um sombrero?
Quero que represente todos os momentos da década. Assim, a malfadada política do “bom e barato”, criada após a saída da Parmalat e que culminou no rebaixamento, tem como representante Lopes (2000-2002; 100J), que chegou sem que ninguém soubesse quem era, mas logo mostrou talento. Chegou a ser artilheiro da Libertadores de 2001, porém um exame antidoping custou-lhe alguns meses de gancho; saiu pela porta dos fundos pouco depois do fim da suspensão, simbolizando bem a montanha-russa da década verde.
Fechando o meio-de-campo, o chileno Valdivia (2007-2008; 93J), cujos dribles fáceis e atitude rebelde cuidadosamente estudada eram garantia de sucesso, especialmente entre os meninos. O título paulista de 2008 é diretamente associado a ele, o que garantiu sua presença nesta lista em detrimento de Diego Souza, que brilhou em 2009, quando anotou o gol mais memorável da década, mas não contribuiu tanto quanto seu ex-companheiro para a taça do Paulistão.
Foto: Valdivia fazendo chororo
legenda: Os magos também choram
Atacantes
Foram poucos os que se destacaram positivamente nestes anos, como Kléber ou Edmílson (os que deram vexame foram muito mais numerosos). Assim, monto meu time com apenas um avante – o melhor que o Palmeiras revelou em muitos e muitos anos.
A melancólica passagem de 2009 não tira de Vágner Love (2003-2004 e 2009; 77J) o posto de principal atacante da década. Do surgimento de seu apelido, ainda nos juniores, à artilharia da série B em 2003, do Paulistão em 2004 e a subsequente venda no meio de um Brasileiro no qual também estava no topo, não se passou nem um ano e meio. Este tempo, porém, foi suficiente para garantir sua escalação.
Foto: Vagner Love, sem trancinnha, dando tiro
Legenda: sem trancinhas, por favor
Técnico
Nestes dez anos, diversos treinadores considerados tops de linha passaram pelo Palestra, nem sempre com os resultados desejados, como Leão e Muricy Ramalho. Luxemburgo conquistou o Paulista de 2008, mas carrega a pecha do desmanche de 2002 que contribuiu para o rebaixamento. Felipão levou um Rio-SP e quase operou um milagre na Libertadores. Porém considerá-lo o técnico da década é impor a ele um desmerecido fardo sobre os períodos ruins. E o outro campeão em nível principal foi Flávio Murtosa, que voltou brevemente no Brasileiro da desgraça, e nada conseguiu.
Assim, o eleito é quem tinha a missão mais espinhosa, e a cumpriu com louvor. Tirar o time da Série B (sobretudo com uma campanha muito boa e um futebol agradável, dentro das circunstâncias) confere a Jair Picerni (2003-2004 e 2006; 88J) o posto de professor dessa equipe.
O Palmeiras da década
Marcos; Arce, Henrique, Danilo, Júnior; Pierre, Correa, Alex, Valdivia e Lopes; Vágner Love. Técnico: Jair Picerni. E até 2020!
*Claudio Kristeller, 31, é químico, editor do IPE online e, quando não tem jogo do Palmeiras, recorre à Rede Vida para curar a abstinência de futebol.