Molenbeek: Mais um no fundo do poço

A expressão 'chegamos ao fundo do poço' é muito usada no futebol, numa postura de profundo otimismo. Sim, porque usualmente é utilizada numa externação positiva de algum de seus membros ou torcedores, acreditando que o pior já passou e que o futuro só pode reservar novidades mais agradáveis.

Infelizmente, para a fiel torcida do RWD Molenbeek, a expressão foi utilizada poucas semanas atrás para delinear a extinção legal do clube, que segue uma lufada mortal que varreu a Europa, ceifando aqueles clubes que, por gestão criminosa ou amadora, se enterraram em débitos. Como Fiorentina e Airdrieonians, também o Molenbeek sumiu.

O clube era relativamente novo. Da forma como era conhecido até sua extinção, o RWD formou-se em 1973, dois anos antes de sua conquista maior, o título belga de 1975, que era o maior orgulho dos torcedores. Mas as raízes do clube remontam ao século XIX, na formação de um outro clube, o Daring Club de Bruxelas, inaugurado em 1897.

No decorrer do século XX, o Daring teve participação ativa na vida futebolística belga, com títulos nacionais em 1912, 1914, 1921, 1936 e 1937. Em 1973, o Daring fundiu-se a um outro clube que tinha nascido de fusão: o Racing White (que surgiu da união entre o Racing Brussels e o White Star), também este campeão nacional em seis vezes, entre elas, a segunda edição do torneio, em 1897.

Uma 'vida' de coadjuvante

Em seus quase 30 anos de vida, o RWD Molenbeek nunca foi páreo para as grandes forças do país, o Anderlecht, também de Bruxelas, o Standard Liège e o Club Brugge. A modéstia de seus objetivos não diminui o valor de sua existência. O pequeno clube serviu como um grande celeiro de jogadores para grandes times europeus.

Dois anos após sua fundação, o RWD Molenbeek já conseguiu o título nacional e deu a impressão de que a fusão poderia ter gerado um clube com ambições maiores. Mas os anos seguintes indicaram que, apesar de uma torcida fiel e apaixonada, o clube teria mesmo de viver à sombra do Anderlecht. A maior aventura do Molenbeek na história foi em 1977, quando chegou às semifinais da Copa UEFA e acabou eliminado pelo Athletic Bilbao, depois de dois empates.

Nos anos 90, o clube alternou-se entre a primeira e a segunda divisão belga, mas nunca alçou maiores vôos. Contudo, é impossível listar a quantidade de jogadores e treinadores importantes para o futebol belga e europeu que defenderam o time. Vercauteren, Van Der Elst e Vandenbergh (astros da seleção belga nos anos 80), Hugo Broos (atual técnico do Anderlecht) e mais inúmeros jogadores que chegaram a ter alguma projeção (como Johan Walem, Welsey Sonck e Johan Boskamp) passaram pelo Edmond Machtensstadion em algum ponto de sua carreira.

E veio a bancarrota…

Nos últimos anos, o Molenbeek começou a acumular dívidas impagáveis, dentro da ciranda financeira que passou a envolver o futebol. Sem uma grande torcida, sem um dono rico e sem uma estrutura de formação de novos craques, a bola de neve começou a tomar proporções irreversíveis.

Apesar de ter acabado a última temporada da Jupiler Liga em décimo lugar, o Molenbeek pediu para disputar a segunda divisão belga, dadas as gigantescas proporções de suas dívidas. A coisa saiu do controle, e a Federação Belga se deu conta de que tinha diante de si uma entidade que devia cerca de US$ 25 milhões e que mal tinha dinheiro para pagar aqueles compromissos mais imediatos.

Veio a decisão da federação, que também era aguardada pelo Beveren (que tinha problemas da mesma natureza). No final de junho passado, a URBSFA determinou que o Beveren poderia voltar à segunda divisão (especialmente para poder jogar num estádio menor que desse menos custos), mas o Molenbeek não poderia nem mesmo disputar a terceira divisão, por causa de uma dívida com a federação de cerca de US$ 50 mil.

O ex-jogador do clube, Johan Vermeersch dispôs-se a pagar os débitos com a federação e, momentaneamente, imaginou-se que a situação estava contornada. Mas, infelizmente, o montante de débitos do clube era muito grande para sua pequena capacidade de arrecadação. Era o fim.

O futuro

A pequena torcida do Molenbeek se mobilizou e, apesar de o time não estar disputando esta temporada, novamente uma fusão pode injetar vida no Racing White Daring Molenbeek. De acordo com os rumores, o Strombeek, pequena equipe da segunda divisão, estaria disposto a disputar a terceira divisão para que fosse possível uma fusão com o Molenbeek. O interesse do Strombeek é o Edmond Machtensstadion, que tem confortáveis instalações, apesar de reduzidas, muito melhores que as do De Singel, atualmente ocupado pelo Strombeek.

Numa primeira olhada, um clube como o Molenbeek pode parecer rigorosamente desinteressante. Só que o futebol precisa ardentemente de clubes onde os novos atletas possam se desenvolver. A tragédia de clubes menores prova que os modelos hiperbilionários da Premier League e da Liga espanhola não são aceitáveis a longo prazo. E que o Molenbeek logo volte!

Foto de Equipe Trivela

Equipe Trivela

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