Manuel Fernandes: O brilhante farol da Luz

Rui Costa, actual meia do Milan, é um dos jogadores com mais carisma junto dos torcedores do Benfica. A justificação é relativamente simples. O ´maestro´ é um dos elementos envolvidos na conquista do último título nacional benfiquista, em 1993/4. Outros futebolistas venceram o campeonato junto de Rui Costa; casos de Isaías, João Pinto, Vítor Paneira ou Schwarz. Então o que tanto diferencia Rui Costa dos restantes? O fato de o antigo camisa 10 do Benfica ter sido formado nas categorias de base do clube é absolutamente determinante para essa simpatia à volta do ´rossonero´, ainda que tenha saído do clube da Luz há dez anos.

Essa volta à ´questão Rui Costa´ tem um motivo. Ela nos leva, de imediato, a considerar o potencial de um certo jogador, igualmente formado nas escolas da Luz, que brilha atualmente em Portugal. Um meia com uma capacidade de distribuição e comando tal que poderia ser comparado a um farol. Trata-se de Manuel Fernandes: o brilhante farol da Luz.

Com um pé no Sporting

Manuel Fernandes deu os primeiros toques no Futebol Benfica, um clube de pequena dimensão de Lisboa. Cedo se consciencializou de sua capacidade e foi tentar a sorte nos infantis do Sporting. Com dez anos de idade, encontrava-se entusiasmado com a hipótese de rumar a um dos grandes clubes do futebol português, mas sua ida para Alvalade ficou comprometida por uma lei de 1986.

Essa lei estipulava que os indivíduos, mesmo que nascidos em solo português, eram obrigados a ter, somente, a nacionalidade dos pais. Embora Manuel Fernandes tivesse nascido em Lisboa, seus pais são originários de Cabo Verde. O Sporting contava já com alguns estrangeiros nos infantis e não havia espaço para outro. Aparentemente devido a essa razão, o Sporting acabou por não o adquirir.

Benfica, a rampa de lançamento

Uma semana depois de deixar o Alvalade, Manuel Fernandes foi fazer testes no Benfica. O responsável pela formação benfiquista, José Morais (atual treinador do Santa Clara, da segunda divisão), ficou bastante impressionado com sua qualidade e deu ordem imediata para a contratação.

Durante o tempo em que permaneceu nos escalões jovens do clube, ele era tido por muitos observadores como o maior talento desde Rui Costa. Acreditava-se que Manuel Fernandes poderia ser alguém com a mesma classe, que entusiasmasse a torcida com seu brilho e entrega ao jogo.

Estréia com Camacho

Finalmente chegou o momento da estréia na Superliga. O meia sueco Anders Andersson foi cedido ao Belenenses, e existia um lugar em aberto no elenco. A saúde financeira do clube já vivera dias melhores e a aposta nos jovens era, assim, fundamental. A 8 de fevereiro de 2004 (21ª rodada da temporada 2003/4), o treinador espanhol José Antonio Camacho colocou-o em campo durante dois minutos no jogo contra o Belenenses.

Todavia, o melhor momento do futebolista foi quando marcou o gol decisivo da vitória em Barcelos (25ª rodada; 2 a 1 sobre o Gil Vicente), 11 minutos depois de entrar em campo. Foi uma jogada que revelou velocidade, equilíbrio e frieza. Em suma, uma finalização que fez lembrar Henry. Esse tento fez com que Manuel Fernandes se tornasse no segundo jogador mais jovem da história a marcar um gol pela equipe principal do Benfica. O detentor do recorde é o mítico Fernando Chalana.

Na temporada de 2003/4, totalizou dez presenças na Superliga, contribuindo para a conquista do vice-campeonato e para a vitória na Taça de Portugal frente ao Porto. Esta foi dedicada aos falecidos futebolistas Miklos Fehér e Bruno Baião, este último colega de Fernandes nos juniores que vieram a sagrar-se campeões em 2003/4, poucos meses depois do jovem Baião ter morrido.

A confirmação com Trapattoni

O Benfica começou a temporada 2004/5 de forma diferente: novo treinador e algumas caras novas no elenco, ainda que não tivesse sido efetuada uma revolução. Manuel Fernandes era um dos jogadores que mais dúvida suscitava devido à contratação do brasileiro Paulo Almeida (ex-Santos). Com a saída de Tiago (viria a assinar pelo Chelsea), quem jogaria no centro do meio-campo ao lado de Petit?

Podemos dizer que é uma história de contornos estranhos. Paulo Almeida não teve um mau desempenho durante o estágio de pré-temporada na Suíça, mas era visível que o técnico Giovanni Trapattoni manifestava grande admiração por Manuel Fernandes (como fez em diversas conferências de imprensa). Então por que razão, nos jogos de preparação, ele jogava os 30 minutos finais, era dos melhores em campo e mantinha-se como reserva? O jogador tinha o processo de renovação de contrato em curso, e a diretoria achou melhor fazê-lo sentar no banco para que suas reivindicações não fossem demasiadas, chegando mesmo a ser colocada a hipótese de se transferir para a equipe ´B´.

No entanto, Fernandes chegou a acordo e renovou seu contrato até 2010. Tornou-se imediatamente titular e alinhou no onze que defrontou o Anderlecht, na Bélgica (derrota por 3 a 0). O Benfica não alcançou a Liga dos Campeões, mas Trapattoni não perdeu a confiança no jovem meia, que foi titular em todos os primeiros cinco jogos da atual Superliga.

O jogador

Fernandes não pode ser chamado de volante, mas também está longe de ser um meia ofensivo. Ideal para atuar no 4-4-2 de Trapattoni, é um atleta com vocação ofensiva, posicionamento inteligente e precisão no passe. Também devido a sua timidez, é notório que ainda não tem a convicção necessária para chutar a gol, mas gradualmente vem perdendo o medo e já é o cobrador de faltas e escanteios na seleção sub-21 (no Benfica estará ofuscado pela quantidade de bons cobradores de faltas, como Simão, Geovanni, Petit ou Zahovic).

O que, de fato, mais impressiona ao observar o camisa 37 do Benfica é a maturidade e liderança que demonstra. Ainda não é um jogador que faça passes mortais, rasgando as defesas adversárias, mas normalmente consegue incutir uma progressiva dinâmica de jogo (pausado e pensado). Raramente perde uma bola e ao lado de Petit forma uma das duplas de meias com maior capacidade de desarme no futebol europeu. Como foi acima referido no gol ´à Henry´, dá para perceber que Manuel Fernandes (1,79 m e 72 quilos; ainda se vai desenvolver do ponto de vista físico) é um jogador quase completo. Falta-lhe, contudo, melhorar seu jogo aéreo. Não será descabida, pela forma de jogar, uma eventual comparação com o ex-jogador da seleção portuguesa Paulo Sousa.

Com alguma ironia, a saída de Tiago no último verão trouxe algo de positivo ao Estádio da Luz – a possibilidade de Manuel Fernandes se afirmar no clube onde tem evoluído nos últimos oito anos.

Seleção principal para breve

Manuel Fernandes tem o privilégio de ter jogado na seleção desde o escalão de sub-16, após ter adquirido nacionalidade portuguesa, há cerca de dois anos. Hoje, com 18 anos de idade, é o patrão do meio-campo da selecção sub-21 orientada por Agostinho Oliveira. A pergunta que se coloca é se nos próximos tempos Luiz Felipe Scolari o irá chamar à seleção principal.

Provavelmente, Felipão não fará grandes alterações em seu meio-campo – Maniche, Costinha (ambos do Porto), Tiago (Chelsea) e Petit (Benfica) deverão ser as primeiras escolhas. Porém, na eventualidade de uma suspensão ou lesão, Manuel Fernandes poderá ingressar no lote de possíveis selecionáveis para o Mundial de 2006 na Alemanha. Tem futebol para isso.

Foto de Equipe Trivela

Equipe Trivela

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