Lokomotiv Moscou: Loko para surpreender
As oitavas-de-final da Liga dos Campeões começam no próximo dia 24 de fevereiro. Mas antes mesmo do início do mata-mata, a competição já apresenta surpresas. A maior delas foi proporcionada pelo Lokomotiv. O time da capital russa parecia entrar na fase de grupos da Liga como mero participante num grupo em que o assíduo Dynamo Kiev seria a terceira força que poderia roubar uma das vagas dos imponentes Arsenal e Internazionale. Mas a equipe russa soube usar o clima inóspito de Moscou a seu favor. Venceu a Inter e o Dynamo e ainda empatou com os ingleses em casa, além de arrancar um empate no Giuseppe Meazza com os italianos, e assim conseguiu se classificar em segundo lugar no grupo – o Arsenal ficou em primeiro.
Aliás, o Lokomotiv já ganhou fama na Rússia por superar expectativas. Fundado em 1923 por trabalhadores de várias estradas de ferro da capital soviética com o nome de KOR (Clube da Revolução de Outubro), o Loko – como é chamado pelos torcedores – era considerado o time mais fraco da cidade, principalmente por nunca ter conseguido vencer o campeonato soviético. Porém, em 1936 o clube mudou de nome para Lokomotiv, alcançou a primeira divisão – equivalente à Segundona brasileira – e, no mesmo ano, deixou todos boquiabertos ao vencer o Dínamo Tblisi na final da primeira copa da URSS.
O destaque que conseguiu com a ´zebra´ causou um alvoroço. Todos esperavam que o Loko chegasse à Classe A – elite do futebol soviético – e se tornasse mais uma força do futebol na terra de Lênin.
Porém, a expectativa não se confirmou, e o clube ficou revezando entre primeira e segunda divisões – nossas segunda e terceira divisões – nos anos da Grande Guerra.
Loko alcança sua era de prata
Depois de mais de dez anos alternando de divisão, a equipe moscovita finalmente alcançou o nível dos principais clubes soviéticos em 1952. Ficou sofrendo para não cair de novo e resistiu bravamente no melhor campeonato do comunismo. Passou alguns anos discretamente competindo e formando um time forte que conquistou, em 1957, o segundo torneio da história do clube, novamente a copa da URSS.
A torcida confiava na equipe, mas quem acompanhava futebol achava difícil que o clube não repetisse o que aconteceu nos anos 30, após a conquista do primeiro título. A tendência era a saída dos melhores jogadores e uma queda acentuada no rendimento do time, que estaria fadado a descer de divisão. Então, o Loko surpreendentemente manteve seus principais jogadores, como Vladimir Malaschenko e Victor Sokolov, e terminou a Liga Soviética Classe A de 1959 como vice-campeão. A seqüência, até então a mais exitosa de sua história, foi batizada pelos fãs como a ´era de prata´.
Depois do sucesso alcançado, o Lokomotiv deixou seus torcedores eufóricos pelo começo de uma fase de glórias e títulos. Mais uma vez, o clube moscovita aprontou uma surpresa a seus adeptos e levou ao pé da letra o lema do Barão de Coubertin: ´´o importante é participar´´. Desde o segundo lugar de 59, a equipe passou a disputar as competições apenas como mero figurante, caindo na classificação ano a ano.
Mais uma fase em baixa e a hegemonia na copa
Os principais jogadores começam a deixar o time, que se desfigurava a cada temporada, até que, em meados dos anos 60, foi rebaixado para a chamada primeira divisão. A torcida começava a perder as esperanças de ver seu time como um dos grandes. Desde então, o Lokomotiv mergulhou numa crise e voltou a ficar como iô-iô, alternando entre a Classe A e a primeira divisão, até o fim da década de 80.
A posse de Valery Filatov como presidente do clube em 1993 pode ser considerada um novo marco na história do clube moscovita. Filatov levou consigo o treinador Yury Syomin, que reformulou o elenco, revelou jogadores de bom nível como Marat Izmailov, Ruslan Pimenov (ambos maiores revelações do futebol russo nos últimos anos), contratou brasileiros como Júlio César (atacante, ex-Fluminense), Jorge Wagner e Leandro (ex-Corinthians) e começou a tornar o time vencedor.
A ascensão foi muito rápida. O projeto de Filatov e Syomin de fazer o Lokomotiv uma força do futebol russo, inicialmente previsto para levar cinco anos, começou a sair do papel em 1996, quando o clube conquistou a copa da Rússia, batendo o Spartak Moscou na final.
Ainda assim, cronistas esportivos e torcedores desconfiaram que a história se repetiria e a equipe em breve estaria voltando a disputar as últimas colocações. Porém, a negativa a essa dúvida veio no ano seguinte quando o Loko chegou ao bi da copa da Rússia frente ao Dínamo Moscou. A euforia era enorme entre os torcedores, que nem imaginavam o que ainda estaria por vir. O clube voltou à final em 1998, perdendo para o Spartak Moscou, mas venceu a competição mais duas vezes, em 2000 e 2001. A torcida finalmente via seu time ser respeitado como uma força do país, mas ainda faltava ganhar um torneio: o campeonato russo.
A obsessão pela liga russa
Depois de faturar quatro de seis copas disputadas, o Lokomotiv estava sedento por vencer o campeonato russo. A equipe quase conseguiu em 1995, quando foi vice-campeã. A angústia por não ter tal título sufocava a todos no clube, que bateu na trave mais três vezes – 1999, 2000 e 2001 – antes de conseguir o título em 2002, comandado por Pimenov.
Mas a vitória não foi fácil. Aliás, não poderia ter sido mais sofrida. Depois de empatar com o CSKA em pontos ao fim do campeonato (66 pontos cada), o título foi decidido em um jogo desempate, que terminou 1 a 0 para o Lokomotiv, com gol marcado por Dmitriy Loskov aos 6 minutos de jogo.
Desde então, a torcida do Loko não para de sonhar com uma era dourada que pode ainda ter espaço para muitas surpresas, como uma final de Champions League.