Felipão, A Alma do Penta
Hoje, ele não está mais conosco, ou melhor, não está mais de nosso lado. Entretanto, mora dentro do coração de cada brasileiro, se é que ele conseguiu fazer isso com colorados, corintianos e atleticanos. Pelo menos do dia 3 de junho de 2002 a 30 de junho de 2002, tenho certeza de que todo brasileiro esqueceu das mágoas do passado e das discordâncias e passou a torcer para ele. Falo de Luiz Felipe Scolari, um técnico conturbado, falador, rude, fazedor de caretas, orgulhoso, companheiro, inteligente, conquistador e vitorioso. E foi assim, com seu jeito de ser brasileiro, que o técnico, juntamente com Ruy Carlos Ostermann, lançou um diário pessoal e uma biografia com trechos elucidativos do autor.
Em ´Felipão, a alma do Penta´, o livro tem a autorização do ´homenageado´ – ao contrário do que acontece com o livro ´Ronaldo – Glória e Drama no Futebol Globalizado´. Luiz Felipe Scolari participa diretamente do livro. Fotos pessoais e de documentos, relatos escritos durante a Copa do Mundo, esquemas táticos dos jogos, tipos de treinamentos, conversa com jogadores, etc. são cedidos pelo treinador, que abre espaço para os torcedores entrarem dentro até mesmo de suas preleções.
O livro é dividido em duas partes, sendo a primeira relacionada à Copa do Mundo de 2002. Relatos de sua trajetória, desde sua indicação ao cargo, aceitação popular, até o desempenho e as dificuldades nas eliminatórias. Depois, há um trecho importante, onde são destacadas as apostas do técnico: primeiro Ronaldo, depois Rivaldo. O texto descreve muito do que os dois passaram e do que Felipão viveu por eles, para eles e por nós. Rivaldo é o destaque do treinador, por isso, uma aposta ganha com muito orgulho. ´Foi quem mais correu, mais colaborou e taticamente jogou mais, também´. As duas apostas foram vencedoras: a da recuperação do prestígio e a dos joelhos. Família Felipão, palpites do Pelé, resposta ao Rei e a relação com a imprensa também são temas abordados nessa parte.
O jeito do técnico agir e suas manias e maneiras são questionadas. As normas e leis para comissão técnica e jogadores também. Há até mesmo uma comparação dos problemas de uma Copa do Mundo com os das imediações de um ministério ou mesmo do Palácio da Alvorada.
Chegamos então ao diário. É a melhor parte do livro, com certeza. São 88 páginas que vão desde a maneira como o autor Ruy Carlos trabalhou até o desenho das cinco estrelas simbolizando a conquista do Penta. E é nessa parte que faço uma crítica ao autor, que diz não ter recebido privilégio algum para escrever o livro. Ele diz que quase não falou com Felipão na Copa, que tomou chimarrão com ele uma única vez, e nessa ocasião apenas conversaram fiado. Ressalta que não exigia tratamento especial, nem solicitara seu nome em qualquer lista preferencial. Entretanto, também confirma que conversava com Luiz Felipe após as entrevistas coletivas, o que não deixa de ser um privilégio de poucos, ainda mais quando se tem um livro em jogo. O mais importante era a conquista da Copa, pois sem ela o livro provavelmente nem seria escrito, mas não posso acreditar que o jornalista não tinha espaço e liberdade de bater um papo, ligar e até mesmo revisar coisas do livro com Luiz Felipe.
No entanto, disse que essa é a melhor parte do livro e é preciso explicar o porquê. Destaco algo que no livro é confirmado pelo autor: ´Fiz questão de apenas lembrá-lo que o diário era a peça mais importante do livro, sua palavra, memória e talvez confissão´. Amistosos, estréia, apostas, desafios, esquemas táticos, dificuldades, relação com a imprensa, amizade com os jogadores, vitórias, o título. Tudo isso e muito mais é contado no diário. Os rabiscos e os garranchos de Felipão são estampados nas páginas do livro, com ´tradução´, é claro.
Então, chegamos à segunda parte, onde a vida de Luiz Felipe Scolari é aberta a nós. Isso só é interessante para quem gosta da pessoa. São relatos de sua vida, sua família, passagens difíceis e desafios vencidos. Conta como foi sua carreira de jogador, o coração mole, a mão fechada e seus carros. O que não poderia faltar é o amor, e esse merece até uma parte especial. Dona Olga é o nome da mulher que doma Felipão. Essa consegue tudo. Dá conselhos, escuta e o acompanha nos momentos bons e ruins.
Outras várias histórias são contadas. Passagens da vida de um técnico vitorioso e que todos admiram por seu jeito carrancudo, mas carismático. Um homem que faz do futebol sua vida. Alguém que é obstinado por vencer.