Brasil – Os Reis do Futebol
Ainda vivendo a euforia do Penta, vale como registro histórico o livro ´´Brasil: Os Reis do Futebol´´, da Lance! Editorial. A publicação reúne fotos das cinco Copas do Mundo vencidas pelo escrete canarinho, narradas pelos jornalistas Ruy Castro, Juca Kfouri e Marcos Augusto Gonçalves, além de testemunhos belíssimos de Nílton Santos e Amarildo. O leitor pode, porém, estranhar o formato pouco usual (31x26cm) e a falta de continuidade em alguns textos, entremeados por páginas inteiras de fotos (lindas, é verdade) e citações, que, por vezes, atrapalham o fio do raciocínio.
Não deixa de ser ufanista relembrar a conquista do quinto título mundial no início do campeonato brasileiro, em que nossos clubes e federações agonizam numa das mais graves crises desde o surgimento do esporte no Brasil. Cabe, entretanto, como um objeto de reflexão, crer na recuperação de nosso futebol e no talento individual de nossos craques em meio a pontapés, caneladas, carrinhos e solavancos dentro e fora das quatro linhas. Mesmo que esses principais craques estejam hoje jogando fora do país.
Nas pouco mais de 100 páginas, constatamos a capacidade do país em produzir gênios como Pelé, Garrincha, Didi, Tostão, Gérson, Rivellino, Romário, Ronaldinho e Rivaldo, que ergueram a taça do mundo para o regozijo de nossos ´milhões em ação´. Isso sem falar de outros tantos injustiçados pelo destino que ficaram pelo caminho, como Leônidas da Silva, Ademir Menezes, Zizinho, Zico, Sócrates e Falcão.
No livro, podemos ainda nos deliciar com o talento de craques das palavras quando o assunto é futebol. Destaque para Ruy Castro ao descrever a – talvez – mais retumbante vitória brasileira em torneios mundiais, a Copa de 70: ´´Se fosse uma cena de amor entre um homem e uma mulher, equivaleria a um beijo furtivo, meio roubado, com medo de que houvesse alguém olhando´´, assim narra a primeira vitória de 4 a 1 sobre a Tchecoslováquia. ´´… mas quando Tostão desmontou meia dúzia de beques e passou a Pelé, que deu de bandeja para Jairzinho marcar, todos gozamos juntos – foi ali que se inventou o orgasmo coletivo´´, era o gol da sofrida e importante vitória contra a Inglaterra, então campeã mundial.
O biógrafo parece esquecer até mesmo os anos de chumbo ao escrever sobre a comemoração do Tri, em pleno governo Médici. ´´Mas, quando o Brasil entrava em campo, todo mundo – guerrilheiros, torturadores e o próprio seqüestrador em cativeiro – parava para ouvir e vibrar. Era um só coração´´.
Kfouri e Gonçalves são mais objetivos ao analisar os dois últimos títulos. Principalmente porque o primeiro escreveu sobre o Tetra em 94 e conseguiu até – pasmem – controlar seu habitual texto ácido. Elogios para Parreira e Romário e, no mais, um texto comedido como foi o futebol daquela seleção. Apropriado. ´´E tal qual o Penta, o Tetra foi ganho exatamente como o treinador de então disse que o ganharia: com posse de bola, com cautela, com gols, poucos que fossem, mas mortais´´.
A mais recente conquista foi também o relato mais factual, como não poderia deixar de ser. O leitor poderá relembrar e guardar as fotos e os detalhes da conquista do Penta na Ásia passo a passo. Uma taça ganha com méritos, é verdade, mas também com a ajuda de algumas zebras que apareceram pelo meio do caminho e que fizeram chegar à final as duas maiores vencedoras de títulos do mundo.
Venceu o Brasil com seu talento individual, superando um adversário limitado tecnicamente, no qual o principal jogador acabou contribuindo para nossa vitória. ´´A Copa da ´globalização´ e das zebras era nossa. Sete jogos invictos e o artilheiro. Mais uma vez, vencia o melhor futebol do mundo. Mais uma vez, estávamos nas nuvens. Mais uma vez o Brasil coroava, alegremente, um rei: Ronaldo, o Fenômeno´´.
Emocionantes são os depoimentos de Nílton Santos e Amarildo, personagens decisivos nos dois primeiros títulos mundiais. O ex-atacante do Botafogo conta como substituiu Pelé, machucado, em 62, na Copa vencida principalmente pelo Mané das pernas tortas. Ele ressalta a importância do entrosamento dos jogadores do alvinegro, como Didi, Nílton Santos, Zagallo e o próprio Amarildo. ´´Não havia mistério´´, conta. Na estréia, marcou duas vezes contra a forte Espanha. No retorno ao Brasil, com o segundo título consecutivo, caiu para sempre nas graças da torcida, que eternizou o apelido dado, antes da Copa, pelo genial Nelson Rodrigues: o Possesso. ´´Eu era mesmo terrível´´, gaba-se.
A ´Enciclopédia´ lembra o surgimento do Rei do Futebol para o mundo e a ascensão de Garrincha ao time titular, ganhando a vaga que pertencera a Joel. ´´Enquanto o Garrincha não entrava, era uma dureza, porque nos treinos coletivos eu tinha que jogar contra ele. E você imagine o homem querendo mostrar serviço, querendo vaga no time´´.
´´O resto´´, como ele mesmo narra repetidas vezes, ´´é história´´. Na final, Bellini levantou a taça do mundo, gesto que poderia ter sido feito pelo ex-lateral e líder do time. ´´Fui eu que indiquei o Bellini para ser capitão, eu queria poder liderar, falar, dar palpites (…) se eu fosse capitão, já ia ter gente achando que eu estava sendo autoritário, aquelas coisas todas´´.
Ali foi o começo de toda essa história – muito bem contada e ilustrada neste livro – que pode ter um novo capítulo na Alemanha, em 2006.