Ligue 1

Seis histórias para acompanhar na temporada 2020/21 da Ligue 1

Depois de encerrar sua temporada 2019/20 de maneira antecipada, e até um pouco apressada demais, a Ligue 1 é a primeira das cinco grandes ligas europeias a iniciar a sua temporada 2020/21. O jogo que abre a campanha acontece já nesta sexta-feira (21), entre Bordeaux e Nantes, enquanto Olympique de Marseille e Saint-Étienne, que estava marcado para o mesmo dia, precisou ser adiado devido a casos positivos no elenco do clube de Marselha.

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De olho em mais uma temporada que se inicia, a coluna Tout le Foot observa mais de perto seis histórias em que vale a pena ficar de olho ao longo da nova época. De projetos interessantes a uma mudança de comando técnico, passando por desafios particulares de alguns dos clubes, como o Lyon, de fora de competições europeias pela primeira vez desde 1996/97.

Vale apontar que, ao menos por ora, nenhuma empresa conta com os direitos de transmissão do campeonato no Brasil. O DAZN transmitiu a competição na temporada passada, mas rescindiu o vínculo devido a dificuldades financeiras causadas pela pandemia do Coronavírus. O único canal na grade a passar jogos para o território brasileiro, a princípio, será a TV5 Monde, canal do pacote chamado “étnico” e que normalmente está presente nas assinaturas mais caras das operadoras. A emissora, no entanto, transmite apenas um jogo por rodada, com narração em francês.

PSG vai usar melhor sua talentosa categoria de base?

Loic Mbe Soh, Arthur Zagre e Adil Aouchiche (Lintao Zhang/Getty Images/OneFootball)

Começando pelo atual tricampeão, o Paris Saint-Germain, não resta dúvidas de que a equipe de Thomas Tuchel é a grande favorita ao título da Ligue 1. Seria preciso haver uma catástrofe para que a taça fique longe do Parque dos Príncipes nesta temporada. Em 2016/17, o Monaco conseguiu levar o título, mas hoje não há nenhuma equipe minimamente pronta para desafiar o reinado dos parisienses.

Desta forma, a história a se buscar no clube da capital precisa ser mais específica do que isso. E se tem uma coisa que ainda causa incógnita ao olharmos para o PSG é a sua política de administração de seus jovens talentos.

Paris é uma cidade que cada vez mais revela grandes jogadores, e uma parte significativa deles acaba passando pelas categorias de base do Paris Saint-Germain. Entretanto, desde que o Catar assumiu o clube, os parisienses se caracterizaram por dar pouco espaço a esses garotos. Com dinheiro suficiente para contratar jogadores de elite, já formados, e um desejo enorme de conquistar a Champions League, jovens promissores são preteridos a grandes estrelas, e o resultado disso é que muitos atletas seguem sua formação ou seus primeiros anos de carreira longe do CT de Camp des Loges.

Por mais que possa contratar quase quem quiser, o PSG ainda assim deve olhar com lamentação para os talentos que deixa escapar. Há uma série deles espalhados pela Europa, o mais recente sendo o zagueiro Tanguy Kouassi, que assinou de graça com o Bayern de Munique no final de junho.

Paralelamente, um dos mais talentos jogadores ofensivos de sua geração na França, Adil Aouchiche, de 18 anos, acaba de assinar com o Saint-Étienne, já que não via um caminho claro de progressão na capital.

Independentemente do objetivo da Champions League ser alcançado ou não neste domingo (23), data da final da competição em que o PSG enfrenta o Bayern, os parisienses precisam passar a olhar com mais carinho para suas categorias de base. No futuro, para construir um modelo mais sustentável de administração do clube, garimpar talentos de sua própria academia pode ser uma boa alternativa.

Na temporada 2020/21, mais do que nos perguntarmos se o PSG levará ou não o título, a questão que fica é: esses garotos formados internamente passarão a ter mais espaço? Quem pode despontar no time de cima? E Thomas Tuchel será capaz de encontrar um equilíbrio bacana para seu elenco neste sentido? Com o clube nadando de braçadas na liga nacional, esse desafio certamente é algo que o PSG pode bancar.

O desafio do Lyon de voltar à Champions diante de uma possível debandada

Houssem Aouar e Moussa Dembélé (Jean-Philippe Ksiazek/AFP via Getty Images/OneFootball)

O fim antecipado da Ligue 1 passada significou ao Lyon um sétimo lugar na classificação e a primeira temporada sem competições europeias desde 1996/97. Heroicamente, a equipe de Rudi Garcia alcançou a semifinal da atual Champions League, mostrando-se bem superior ao que fez em toda sua campanha no Campeonato Francês. Para isso, o estabelecimento do meio de campo formado por Maxence Caqueret, Houssem Aouar e Bruno Guimarães foi essencial, sobretudo a partir do equilíbrio que o brasileiro deu ao time.

Em 2020/21, o desafio, no entanto, será enorme. A falta de Champions League pode afastar algumas das principais peças do elenco, algo que o próprio diretor de futebol, Juninho Pernambucano, já admite publicamente. Jogadores como Aouar e Moussa Dembélé há algum tempo mostram futebol suficiente para alçar voos mais altos, e a ausência da Liga dos Campeões pode ser o empurrão final. Memphis Depay, principal destaque individual desta equipe, é outro que pode acabar sendo levado para fora da França depois de seguidas campanhas de sucesso individual.

Ao menos uma grande saída deve ser esperada, e a maneira como o Lyon responderá a isso será importantíssima ao futuro a médio prazo do clube. Rudi Garcia custou a encontrar uma equipe competitiva, acaba de conseguir, mas pode ser forçado a montar novamente seu esquadrão. Com a saúde financeira afetada pela crise do Coronavírus e pela falta do dinheiro da Champions League, esse desafio fica ainda maior.

A resposta em nível nacional precisará ser forte para satisfazer a exigente torcida, e alguns dos novos nomes que começaram a surgir no elenco precisarão elevar ainda mais o nível em sua segunda temporada depois do fracasso da campanha passada e diante da possível debandada.

Por sorte aos lyonnais, talento não falta: Bruno Guimarães chegou há poucos meses, se encaixou rapidamente na equipe e tem espaço para muito mais crescimento. Maxence Caqueret foi promovido ao time principal e já mostra futebol de gente grande. Rayan Cherki é um empolgante talento ofensivo, com potencial para ser um jogador geracional, e pode ganhar mais chances, sobretudo com a possível saída de Dembélé. E, por fim, Jeff Reine-Adélaïde, contratado no início da temporada 2019/20 do Angers, sofreu com lesões e pouco jogou, mas está recuperado e pode ter um novo início no clube.

As chances do Lyon são boas de voltar à Champions League para a temporada 2021/22, mas o trabalho precisará ser bem feito, porque a competição só aumenta. Alguns clubes bem estruturados pedem passagem, e alcançar a vaga europeia deverá ser cada vez mais difícil.

Lille e seu refinamento de jovens promissores

Renato Sanches e Jonathan Ikoné (François Lo Presti/AFP via Getty Images/OneFootball)

Depois de quase ser rebaixado na temporada 2017/18, o Lille vem de duas boas campanhas na Ligue 1: vice-campeão em 2018/19 e quarto colocado em 2019/20. Durante este período, o trabalho de Luis Campos, um dos mais eficientes diretores de futebol no mundo quando o assunto é transferências, foi se estabelecendo e começando a gerar frutos, e hoje já vemos o seu processo em pleno andamento nos Dogues.

A especialidade de Campos é garimpar jovens talentos promissores, a baixo custo, com potencial de revenda alto, valorizá-los no clube e depois tirar grande lucro deles – às vezes em um espaço de tempo curtíssimo. Rafael Leão, da base do Sporting, chegou de graça em 2018 e, após uma temporada, foi vendido ao Milan por € 23 milhões. Nicolas Pépé, contratado em 2017 por € 10 milhões, deixou o LOSC em 2019 por € 80 milhões. Osimhen, reposição de Leão, foi contratado por € 22,4 milhões e, um ano depois, já deixa a França para defender o Napoli, por € 70 milhões. O substituto da vez é Jonathan David, canadense de apenas 20 anos e enorme potencial, destaque da liga belga na temporada passada.

Com este modelo, o Lille se mantém como uma equipe a ser seguida. É atrativo a garotos promissores, que agora começam a ver um caminho claro no clube para alcançar espaços de destaque em grandes ligas. Acompanhar os Dogues, hoje, é testemunhar antecipadamente jogadores que, no futuro, despontarão como alguns dos melhores atletas do futebol europeu.

Do elenco atual, podemos destacar Jonathan Ikoné e Boubakary Soumaré, formados no PSG, Jonathan David, recém-contratado, e os defensores Sven Botman e Domagoj Bradaric, ambos com 20 anos e que seguem o perfil buscado por Campos.

Em seus melhores anos, Rennes busca manter seu novo patamar

Eduardo Camavinga (Jean-François Monier/AFP via Getty Images/OneFootball)

O Rennes vive os melhores anos de sua história. Em 2019, contra o PSG, conquistou nos pênaltis o seu primeiro título nacional: a Copa da França. O triunfo foi apenas a culminação de um bom trabalho iniciado no fim de 2017, pelo então presidente Olivier Létang. O dirigente deixou o clube em fevereiro deste ano, devido a seguidas tensões com o técnico da equipe, Julien Stéphan, mas a base para o sucesso permanece por lá.

A campanha em 2018/19, que terminou com o título da Copa da França, de tão bem-sucedida levou a um desmanche da equipe, que perdeu seis dos 11 titulares daquela final contra o PSG. Entre as principais saídas estiveram Ismaïla Sarr, que foi para o Watford, Ramy Bensebaini, que assinou com o Borussia Mönchengladbach, e Hatem Bem Arfa. No entanto, a reconstrução foi muito bem feita, e em 2019/20 o Rennes teve mais uma campanha histórica.

Com o terceiro lugar na Ligue 1, o clube alcançou pela primeira vez em sua história a classificação à Champions League. Recentemente, foi confirmado que a vaga, inicialmente para os playoffs, se tornaria uma classificação direta para a fase de grupos, devido ao fato de que todos os semifinalistas da Liga dos Campeões já estavam garantidos neste estágio para a próxima temporada, e, portanto, o campeão abriria um espaço aos rubro-negros.

Por ora, a espinha dorsal da última temporada foi mantida, com nomes como Edouard Mendy, M’Baye Niang, Faitout Maouassa, Adrien Hunou, Raphinha e Eduardo Camavinga. Estes dois últimos são dois dos maiores destaques. Jovens e com grande potencial de crescimento, o brasileiro e o francês (com 23 e 17 anos, respectivamente) no futuro devem buscar objetivos maiores, mas por enquanto permanecem no clube e podem ser essenciais a mais uma boa campanha.

Sem fazer loucuras, o Stade Rennais vai se reforçando para 2020/21. Por ora, além daqueles que voltaram de empréstimo e de jovens promovidos da base, chegaram duas contratações: Nayef Aguerd e Martin Terrier, este último uma importante adição para dar maior profundidade de elenco a Stéphan.

Com a estabilidade que tem tido nos últimos anos, a expectativa é vermos mais um bom desempenho do Rennes, agora com um desafio maior, a Champions League, mas também com os frutos consequentes desta participação, sobretudo financeiros. Acostumados a se virarem bem com pouco, há um caminho de crescimento para os rubro-negros se a continuidade do trabalho for garantida e a equipe puder figurar consecutivamente na principal competição de clubes do mundo.

O interessante projeto esportivo do Nice

Patrick Vieira e seus comandados no Nice (Yann Coatsaliou/AFP via Getty Images/OneFootball)

A temporada 2019/20 foi a primeira do Nice sob propriedade de Jim Ratcliffe, bilionário britânico do ramo de produtos químicos. Fã de futebol, ele chegou com a promessa de que não estava investindo no futebol francês apenas para tirar dinheiro. A ideia da nova administração é tornar o clube competitivo no cenário nacional, e ela tem investido para isso.

A primeira temporada era de transição, mas já trouxe resultados interessantes, com o clube terminando na quinta colocação e alcançando uma vaga na Liga Europa. Criticado em diversos momentos, o técnico Patrick Vieira se manteve firme no cargo e agora, com novos reforços, tem chance de ir mais longe.

As contratações até agora têm sido pontuais e de baixo valor relativo, mas não menos interessantes. Robson Bambu chegou do Athletico Paranaense por € 8 milhões. Destaque em sua posição na última Ligue 1, o lateral esquerdo Hassane Kamara deixou o Reims por € 4 milhões. O experiente Morgan Schneiderlin, com passagens por Manchester United, Everton e seleção francesa, veio por pouco mais de € 2 milhões, e o mais promissor deles, Amine Gouiri, se transferiu do Lyon por € 7 milhões. Rony Lopes, do Sevilla, chega por empréstimo, tendo na bagagem um bom período pelo Monaco.

Gouiri é um atacante dos mais talentosos de sua geração (2000) e buscava mais tempo de jogo. Chega agora para ampliar as opções no ataque, que conta com o bom Kasper Dolberg, que vai agora para sua segunda temporada na França, tendo marcado 11 gols em 23 jogos na última Ligue 1.

As portas ainda estão abertas para mais reforços, e vale a pena ficar de olho em quem mais o Nice traz para fechar seu elenco. Com o que tem em mãos, Patrick Vieira já tem condições de brigar por uma classificação à Champions League.

A pressão por sucesso esportivo – e, consequentemente, financeiro – no Olympique de Marseille

Valère Germain, Morgan Sanson e Dimitri Payet (Gerard Julien/AFP via Getty Images/OneFootball)

À medida em que olha para os próximos anos, o Olympique de Marseille vive um momento crucial em sua história a média prazo. O clube ainda busca se recuperar de erros do passado, e o lado financeiro é um foco importante da administração do proprietário Frank McCourt e do presidente Jacques-Henri Eyraud.

O último balanço divulgado, referente à temporada 2018/19, apresentou um déficit de € 91 milhões, maior em relação aos € 78,5 milhões de 2017/18. Ainda sem resultados oficiais, a estimativa é de que a campanha 2019/20 tenha tido perdas de pelo menos € 60 milhões, número que pode ser ainda maior depois de considerada a crise do Coronavírus.

Para um clube nesta situação, ter sucesso esportivo é imperativo. Com a participação na fase de grupos da Champions League, a primeira em sete anos para o OM, os Phocéens deveriam embolsar, a princípio, entre € 40 milhões e € 45 milhões. Com um dinheiro desses e participações consecutivas, a situação financeira ganharia ao menos um pequeno alívio.

Sabe-se, no entanto, que o Marseille não irá tocar a integralidade desse montante da Uefa. Isso porque o clube foi punido recentemente pelo Fair Play Financeiro justamente pelos valores do exercício de 2018/19. O OM tinha um acordo com a Uefa, estipulando que as perdas não poderiam passar de € 50 milhões na avaliação do período que se encerrava em 2019. O déficit foi bem maior, como vimos acima, e, portanto, o clube acabou punido pela instituição: multa de € 3 milhões, retenção de 15% dos ganhos com competições europeias e um limite de apenas 23 jogadores inscritos em torneios da Uefa até o fim da temporada 2022/23. O clube, é claro, saiu no lucro, já que corria o risco de ser impedido de participar da Liga dos Campeões.

Nesta situação, o atual vice-campeão francês possivelmente se verá forçado a negociar alguns de seus jogadores, e o destaque Florian Thauvin, que sofreu com lesões na temporada passada, é um dos nomes mais cotados a serem vendidos, embora não haja no momento algum pretendente claro.

É neste ambiente financeiro instável que o técnico André Villas-Boas terá o desafio de encontrar equilíbrio para manter o bom nível apresentado em 2019/20, em busca novamente de uma classificação à Champions League. De partida, parece um objetivo atingível, dado o desempenho acima da média na campanha passada, mas a temporada é longa. De positivo, chegaram, por enquanto, Leonardo Balerdi, zagueiro emprestado pelo Borussia Dortmund, e Pape Gueye, volante de destaque nos últimos anos pelo Le Havre, na Ligue 2.

Com uma situação tão delicada, o OM precisará de maior estabilidade política do que teve em 2019/20. Mesmo com o bom desempenho em campo, o clube balançou com a ingerência sobre o trabalho de Andoni Zubizarreta, ex-diretor de futebol. O espanhol acabou demitido, o que quase levou à saída de Villas-Boas, contratado pelo dirigente e contrariado pela decisão. O técnico, por fim, permaneceu, mas o presidente Eyraud terá que buscar um ambiente mais equilibrado a fim de dar a tranquilidade para que o português trabalhe.

Foto de Leo Escudeiro

Leo Escudeiro

Apaixonado pela estética em torno do futebol tanto quanto pelo esporte em si. Formado em jornalismo pela Cásper Líbero, com pós-graduação em futebol pela Universidade Trivela (alerta de piada, não temos curso). Respeita o passado do esporte, mas quer é saber do futuro (“interesse eterno pelo futebol moderno!”).
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