Pelo menos a Uefa foi honesta em dizer que seu novo controle financeiro não trata o desequilíbrio competitivo
A entidade aprovou nesta quinta-feira um limite de 70% das receitas que será implementado ao longo de três anos

A Uefa aprovou as suas novas regras de regulamentação financeira nesta quinta-feira e deixou bem claro que não espera que elas tenham um impacto importante na desigualdade cada vez maior do futebol europeu. Até mudou o nome porque “Fair Play Financeiro” passava a equivocada impressão que ela se importava com isso. Agora é “Plano de Sustentabilidade”.
O Fair Play Financeiro foi bem sucedido em brecar uma epidemia de falências, mas não conseguiu evitar que donos bilionários fizessem investimentos acima dos recursos dos seus clubes, ou punir adequadamente os que fizeram isso, mesmo diante de evidências claras, como nos casos dos contratos de patrocínio inflados de Paris Saint-Germain e Manchester City.
“Desequilíbrio competitivo não pode ser tratado simplesmente por regulações financeiras. Precisa ser tratado em combinação com medidas esportivas e outras medidas. É por isso que mudamos o nome. O nome Fair Play Financeiro era interpretado como se estivéssemos criando um cenário equilibrado, nós queríamos mudar isso”, afirmou o diretor de sustentabilidade financeira da Uefa, Andrea Traverso.
Agora que está tudo esclarecido, vamos às novas regras: basicamente, foi estabelecido um teto para gastos dos clubes com transferências, salários e comissões de agentes. Haverá um período de adaptação, mas, em três anos, esse limite terá que ser de 70% – caindo gradativamente de 90% em 2023/24 e 80% em 2024/25.
O controle de custos é um dos três pilares do plano. Os outros dois são solvência, para garantir que os clubes tenham dinheiro para pagar o que devem, e estabilidade, que se assemelha ao mecanismo do Fair Play Financeiro que calculava receitas e despesas para limitar prejuízos. As perdas permitidas foram dobradas: de € 30 milhões para € 60 milhões em um período de três temporadas.
As punições variam de multas a perdas de pontos, rebaixamento dentro das competições da Uefa, limitação do tamanho do elenco, exclusão dos torneios e até suspensão de jogadores individualmente, segundo o Guardian.
“As primeiras regulamentações financeiras da Uefa, introduzidas em 2010, cumpriram seu principal propósito. Eles ajudaram as finanças do futebol europeu a se recuperarem após estarem à beira do precipício e revolucionaram como os clubes europeus são administrados. No entanto, a evolução da indústria do futebol, junto com os inevitáveis efeitos financeiros da pandemia, mostraram a necessidade de uma reforma e novas regulamentações financeiras de sustentabilidade”, disse o presidente da Uefa, Aleksander Ceferin.
Ceferin falou várias vezes no passado sobre a necessidade de reformar o Fair Play Financeiro e tentar encontrar uma maneira de reduzir o desequilíbrio esportivo. Chegou a ventilar ideias como um teto salarial mais rígido ou até uma “taxa de luxo” que distribuiria as multas pagas pelos clubes que gastarem acima das regras ao longo da pirâmide.
Os clubes precisarão se adequar. Segundo relatório da Deloitte sobre a temporada 2020/21, muitos deles passam desse limite apenas com salários – lembrando que o teto imposto pela Uefa corresponde também a taxas de transferências e todos os gastos com futebol. O Barcelona, por exemplo, estava com 84% das receitas comprometidas com sua folha salarial. Chelsea, Juventus, Arsenal, Atlético de Madrid e Internazionale também ultrapassaram 70% apenas com vencimentos, com a ponderação de que a pandemia ainda estava bagunçando as finanças de todo mundo. Em um primeiro momento, a rigidez das novas regras dependerá de como elas serão fiscalizadas e punidas.