Implacável contra Vinícius, Kyle Walker anulou o melhor do Real Madrid e permitiu que o melhor do City florescesse
Kyle Walker fez 180 minutos excelentes pelo Manchester City contra o Real Madrid e sai como homem decisivo na classificação à final

Na véspera da partida no Estádio Etihad, Kyle Walker explicou o abraço em Vinícius Júnior no Bernabéu. O lateral disse que não queria se “tornar meme” pela tentativa de lambreta do brasileiro e falava sobre o respeito que tinha sobre o adversário. Um dia depois, quando a bola rolou na volta das semifinais da Champions, Walker passou muito longe de virar meme. O defensor teve uma atuação icônica, pela maneira como neutralizou completamente o ponta do Real Madrid. Se por um lado a goleada do Manchester City por 4 a 0 chama mais atenção, por outro a equipe também teve uma exibição defensiva que beirou a perfeição. O camisa 2 foi o melhor nesse aspecto, ao trancar o lado direito da zaga e impedir qualquer lance mais agudo de Vinícius. Partidaça, em 180 minutos excelentes do inglês no confronto.
Ao longo da carreira, Kyle Walker lidou com críticas. Por vezes foi chamado de “superestimado” e nem sempre justificou certa badalação ao seu redor. Entretanto, o defensor também merece respeito por uma carreira há mais de uma década em alto nível. Walker se firmou como um dos melhores laterais em atividade na Premier League durante os tempos de Tottenham. Foram várias temporadas em que voou baixo e melhorou as perspectivas dos Spurs. Não à toa, o Manchester City pagou €52,7 milhões pelo defensor em 2017. No Estádio Etihad, ele se transformaria num jogador multicampeão, embora visto como um “patinho feio”.
A missão de Kyle Walker não era simples, ao substituir uma bandeira do Manchester City como Pablo Zabaleta. O lateral se transformou num dos homens de confiança de Pep Guardiola, embora algumas vezes também parecesse um elo fraco de um elenco tão estrelado. Não era aquele apoiador de números ofensivos tão impressionantes. Não à toa, com o tempo, Walker até chegou a ser ofuscado no Estádio Etihad. Perdeu minutos em campo, passou a ser deslocado para a zaga, ganhou a concorrência esporádica de João Cancelo. Continuava a empilhar taças, mas sem se colocar como um nome imprescindível nos Citizens.
A temporada atual reforça a importância de Kyle Walker dentro do Manchester City. A presença do defensor na Premier League é maior do que nas duas campanhas anteriores. O inglês se tornou uma carta na manga de Pep Guardiola, pelas variações táticas e pela saída de Cancelo, e exibiu mais sua consistência. Mesmo com uma lesão na virilha que quase colocou em xeque sua participação na Copa do Mundo, o inglês voltou com moral do Catar. Seria importante na caminhada da Inglaterra até as quartas de final, especialmente pela forma como marcou Kylian Mbappé no jogo da despedida.
Walker virou um nome constante nas escalações do Manchester City durante a guinada dos últimos meses. Pode não ter o cartaz de Rúben Dias ao seu lado, mas é um jogador que contribui bastante para a solidez dos celestes nesta redefinição. E teria seu trabalho exaltado nos confrontos com o Real Madrid. A missão de encarar Vinícius Júnior era uma das mais ingratas possíveis. Não se nega o pleno sucesso do camisa 2 ao anular um dos jogadores individualmente mais perigosos da atualidade.
A partida de ida, no Bernabéu, já tinha contado com uma atuação excelente de Walker. O lateral fez uma marcação muito firme em Vinícius Júnior. É verdade que o brasileiro ainda tirou o coelho da cartola em alguns momentos, em especial no chutaço que valeu o gol dos merengues. Contudo, a perseguição implacável impediu o jogo do ponta de florescer. Walker foi ótimo para fechar os espaços, principalmente no segundo tempo. O lance da lambreta, em que o inglês ganhou à frente no corpo, é emblemático. O reconhecimento do próprio Vinícius ficaria claro na saída de campo, com o já célebre abraço.
Já nesta quarta-feira, Kyle Walker conseguiu se superar. Vinícius Júnior parecia até acanhado, com receio de tentar algo para cima do defensor. O inglês não deixou o ponta respirar e o colocou no bolso. Um lance em especial chamou atenção no primeiro tempo, quando Vini arrancou e tinha um corredor à sua frente, mas perdeu na velocidade para Walker. O camisa 2 bateu a carteira do garoto e saiu jogando com a cabeça erguida. Já na segunda etapa, não se viu a criatividade do brasileiro. Walker estava sempre em seu encalço, com muita força e um tempo de bola perfeito. Foi o grande destaque mesmo com ótimas apresentações de Rodri e Rúben Dias.
As atuações impecáveis de Kyle Walker também servem de resposta a Guardiola. No início de abril, o treinador deixou o defensor no banco de reservas durante partidas seguidas e justificou que ele “não tinha os atributos táticos” para compor a nova linha de zaga com três homens. O técnico apontou que precisava de um zagueiro pela direita que fechasse mais pelo meio, não que abrisse mais na lateral. Não à toa, o inglês esteve em campo por míseros dois minutos nos embates das quartas de final da Champions contra o Bayern. Seu encaixe, todavia, não demorou a acontecer. Walker aprendeu rapidamente o que precisava fazer e tomou conta da posição no último mês. Ninguém parecia mais ciente de sua função contra o Real Madrid que o camisa 2.
Aos 32 anos, Kyle Walker consegue aliar a maturidade com ainda um vigor físico muito alto. O defensor pode não gerar mais as expectativas dos tempos de Tottenham, mas talvez esteja na melhor forma de sua carreira. É um jogador bastante regular e funcional dentro de seu time. Num Manchester City cheio de virtuosos, basta deixar a bola para outros resolverem. Contudo, alguém precisa fazer o serviço pesado, e Walker foi excepcional para frear a maior ameaça do outro lado. A classificação tem atuações mágicas de Bernardo Silva, de Jack Grealish, de Kevin de Bruyne. Mas, nos 180 minutos, Walker provavelmente foi o mais importante de todos os celestes. Foi quem calou o melhor do Real Madrid e abriu caminho aos melhores dos Citizens.