Carrasco em 2013, Thomas Müller reencontrou seu melhor para ser ainda mais destrutivo contra o Barça
O Bayern mantém poucos remanescentes da equipe campeã europeia em 2012/13. A maioria se despediu do clube e, dos que seguem em Munique, praticamente todos atuam em funções defensivas. Todos exceto um: Thomas Müller, o homem que se confirmou como carrasco do Barcelona, sete anos depois. O atacante estava presente naqueles 7 a 0 agregados e, mais do que isso, foi o melhor jogador dos bávaros na ocasião. Voltou a arrebentar os blaugranas desta vez – com dois gols, uma assistência e o troféu de melhor em campo entregue pela Uefa, uma maneira de materializar o que a memória não vai apagar, depois desta impiedosa goleada por 8 a 2.
Thomas Müller gosta de grandes partidas. Sua própria trajetória evidencia este prazer, com duas ótimas participações em Copas do Mundo servindo de exemplo. Não é o jogador mais habilidoso, nem o mais rápido, nem o mais forte. Sua imposição costuma vir na inteligência e no entendimento do jogo, que tantas vezes lhe valeu gols memoráveis. Seria assim durante boa parte de sua carreira, como aconteceu naquelas semifinais de 2012/13. No lugar certo e na hora certa, Müller participou de todos os tentos nos 4 a 0 da ida. Fez o primeiro, ajeitou para Mario Gómez anotar o segundo, realizou um bloqueio (um tanto quanto faltoso) para Arjen Robben assinalar o terceiro e se encarregaria de concluir a contagem no quarto. Requinte de crueldade, guardaria ainda o terceiro no Camp Nou, nos 3 a 0 que concluiriam aqueles 7 a 0 agregados.
A trajetória de Thomas Müller no Bayern de Munique, entretanto, não é linear. Ele se tornaria um dos jogadores mais cobrados durante os últimos anos, até porque sua participatividade nos jogos não condizia com aquilo que produzira antes. Ele mantinha números razoáveis, mas o futebol pouco convincente dos bávaros o deixava mais exposto. O próprio alemão chegou a declarar que cogitava a saída. Mas veio um Hansi Flick em seu caminho, assistente de longa data na seleção alemã que entendia o que o camisa 25 queria. O treinador, ao mesmo tempo em que fazia o time exibir seu melhor futebol desde os tempos de Jupp Heynckes, devolvia à torcida a melhor versão de Müller – aquele inteligente, onipresente e tantas vezes predestinado.
A campanha de Thomas Müller na Bundesliga foi espetacular. Terminou com 21 assistências, quebrando não apenas sua marca pessoal, como também o recorde da própria competição. Aberto pelo lado direito ou principalmente centralizado, virou o garçom que tantas vezes consagrou Robert Lewandowski. Voltou a ser aquele atacante sempre no lugar certo e na hora certa para fazer a diferença. E esse cara também aparecia na Champions, ainda que de forma mais tímida até então. Mas não contra o Barcelona, o adversário da glória passada, bem como entalado na garganta.
Se havia um 2013 para regozijar, também teve um 2015 para remoer. Foram outras semifinais entre Bayern e Barcelona, estas com show do trio MSN nos 3 a 0 dentro do Camp Nou. Müller era o parceiro de Lewandowski na oportunidade, em que as ausências de Franck Ribéry e Arjen Robben pesaram bastante. O camisa 25 até anotou um gol na volta em Munique, o da vitória por 3 a 2, que não reduzia o dessabor pela eliminação contundente. Seriam cinco anos de espera até que estas quartas de final providenciassem o reencontro.
Foi uma grande partida do Bayern na construção do jogo e na maneira como sufocou o Barcelona sem a bola. Müller estava ali encarregado de auxiliar essa roda a girar e também de se empenhar, mas foi ainda mais importante por resolver com gols. O primeiro tento veio graças à excelente tabela com Lewandowski, para que o alemão tirasse a bola do alcance de Marc-André ter Stegen. A máquina tomaria o empate, mas moeria os blaugranas mais um pouco durante o primeiro tempo. Ivan Perisic e Serge Gnabry marcaram, até que Müller voltasse a aparecer no quarto tento, completando o cruzamento de Joshua Kimmich. E quando o Barça era a mais abatida vítima dos golpes incessantes dos germânicos, Müller quis dar uma assistência, desta vez para achar Philippe Coutinho livre, pintando o sete.
“A melhor coisa é quando você percebe que os jogadores que entram têm o mesmo impacto, a mesma alegria, a mesma ética de trabalho. Sempre temos um bom espírito de equipe, mesmo quando saímos para beber à noite, o clima é sempre bom. Isso é importante para que façamos o que queremos em campo. Esta foi a vitória mais bonita. Ainda estou com o coração acelerado e sem fôlego. Foi uma noite muito especial”, declarou Müller, na saída de campo, negando ainda comparações com a semifinal da Copa de 2014. “Não foi exatamente igual. Não tínhamos o controle contra o Brasil. Hoje queríamos dominar os adversários com nossa maneira de jogar desde o início. Fomos brutalmente dominantes, especialmente com a bola”.
Talvez essa seja a melhor versão de Thomas Müller. E não porque participe muito das conclusões ou qualquer coisa do tipo. Nesta sexta, por exemplo, ele marcou pela eficiência nas duas únicas finalizações que efetuou. O ponto é que a presença do camisa 25, agora, parece beneficiar o coletivo mais do que nunca. É sua inteligência para estar no lugar certo, mas também para facilitar que os companheiros também estejam. E, num ataque com tanta mobilidade como este do Bayern, o atacante azeita bastante a engrenagem. Indo além de sua preponderância pelos gols nesta noite, esta virtude nem é a mais simples de se perceber.
Aos 30 anos, também é uma versão mais madura de Thomas Müller, vice-capitão do Bayern e uma liderança forjada especialmente por sua vivência. Faz isso em campo. E, seja qual for o desfecho desta Champions, mais uma goleada entra para a conta do alemão – o mesmo dos 7 a 0 de 2013, o mesmo dos 7 a 1 de 2014. O seu peso na história do Bayern aumenta com o protagonismo em momentos assim. É o que o torna mais valorizado, mesmo sem ser o mais habilidoso, o mais rápido, o mais forte.
A partida desta sexta-feira ainda guardou um recorde a Thomas Müller: foi sua 113ª aparição pela Champions League. Nenhum outro jogador alemão entrou mais em campo pelo torneio continental. A quebra da marca não poderia ocorrer de maneira mais emblemática, num jogo que fica para a história. E com Müller lembrando que, há 12 edições, é um nome inescapável para se recontar os grandes momentos do Bayern no torneio. Em 2013, acabou com a taça. É isso que, esperam os bávaros, estes 8 a 2 também sugiram.