A final da Champions oferece um duelo em altíssimo nível entre dois esteios da Seleção: Casemiro x Fabinho
Concorrentes pelo mesmo posto na Seleção, Casemiro e Fabinho estão no mínimo entre os cinco melhores do mundo na posição
A seleção brasileira possui um histórico de ótimos cabeças de área nas últimas décadas. Mesmo assim, raríssimos setores da equipe nacional atualmente possuem tanta confiança na dupla à disposição quanto na função de primeiro volante. Casemiro e Fabinho estão, no mínimo, no Top 5 da posição no mundo. São esteios de grandes clubes, possuem enorme reputação com suas torcidas e mantêm a regularidade com o passar dos anos. Há quem pense, aliás, que ambos poderiam até atuar juntos no meio-campo do Brasil – numa escolha na qual a fase de ambos se justificaria mais do que qualquer defensivismo. E um duelo especial entre os dois acontece numa decisão de Champions, pronta para ressaltar o altíssimo nível que atingiram. A conquista certamente passará pelos volantes – ou ainda tem o risco de passar pela ausência de um deles, Fabinho, que se recupera de lesão muscular.
Os quatro títulos recentes do Real Madrid na Champions League estão na conta de Casemiro. O volante teve uma participação pequena em 2013/14, mas vital, quando foi testado num jogo em que os merengues corriam o risco de perder a vaga nas semifinais para o Borussia Dortmund e trancou a cabeça de área. Já no retorno após o empréstimo ao Porto, sua entrada na equipe titular com Zinédine Zidane foi um dos fatores que deram impulso aos madridistas para recuperarem a taça em 2015/16. Depois disso, não parou mais. Fez uma campanha monstruosa nos mata-matas de 2016/17, com direito a gol na decisão contra a Juventus. Teve papel decisivo também em 2017/18, marcando o tento que selou a classificação contra o PSG nas oitavas.
Passadas sete temporadas como titular, Casemiro possui seu lugar inquestionável na história do clube. Inclusive, virou uma liderança ainda mais evidente nos quatro últimos anos, em meio à transição com a saída de Cristiano Ronaldo. O que não diminuiu foi o seu futebol. O meio-campista se tornou ainda mais efetivo na contribuição ofensiva e passou a se soltar mais, o que resultou em gols importantes sobretudo no Campeonato Espanhol. Também é um marcador duro que intimida muitos atacantes e cuja ausência dificilmente é suprida. Não à toa, os merengues devem buscar um substituto no mercado.
A atual temporada de Casemiro não é tão boa quanto a anterior, em termos de impacto sobre o time. O volante tem aparecido menos dentro da área e vê outros companheiros de setor chamarem mais atenção. Mesmo assim, seria um erro ignorar o que Casemiro aporta à equipe e a estabilidade que costuma garantir. Uma prova disso veio na primeira partida das semifinais contra o Manchester City, em que Carlo Ancelotti optou por deixá-lo no banco por conta dos problemas físicos e o time teve muitos problemas na organização defensiva. Seu trabalho nunca precisou ser eloquente para ser bem feito, dando combate na cabeça de área e sustentando os merengues para que outros brilhassem. Encarar jogos grandes como uma final de Champions, aliás, nunca foi problema aos camisa 14. Agora ele tem uma motivação a mais, ao olhar do outro lado.
Fabinho, afinal, é um digníssimo concorrente a Casemiro na cabeça de área do Brasil. O camisa 3 do Liverpool poderia ser até mais precioso à Seleção se ainda atuasse como lateral. Contudo, foi a mudança para o meio-campo a partir do Monaco que o colocou na primeira prateleira do futebol mundial e que explica o status que possui em Anfield. A chegada do brasileiro esteve entre os reflexos de Kiev, anunciada apenas dois dias depois da derrota dos Reds na decisão da Champions para o Real Madrid. Foi necessária certa paciência, com sua entrada gradual na equipe durante a temporada de 2018/19 e até um curto afastamento durante os primeiros meses. Para sorte do Liverpool, sua adaptação já era completa na segunda metade daquela temporada. Virou nome intocável nos mata-matas da Champions e, depois de dominar o meio-campo no milagre contra o Barcelona, foi um dos responsáveis diretos pela conquista do título em cima do Tottenham.
A reputação de Fabinho no Liverpool não difere muito daquela recebida por Casemiro no Real Madrid. É um marcador implacável (por vezes bastante duro), de fôlego invejável para garantir o funcionamento da faixa central e que dá dinamismo à equipe. Não é o jogador mais refinado do meio-campo vermelho, mas há um entendimento claro que a sequência de conquistas vivida pelo clube nos últimos anos se deve bastante ao encaixe que teve à frente da antes problemática defesa – que também ganhou outros reforços vitais. Prova disso foi o bolão que jogou na campanha do título da Premier League em 2019/20, até com gol em vitória sobre o Manchester City.
Outro ponto favorável a Fabinho é a maneira como oferece sua polivalência ao Liverpool. O camisa 3 não voltou a ser lateral, mas se dedicou como zagueiro ao longo da temporada passada, durante a crise de lesões enfrentada pelos Reds. Seria um ponto confiança numa equipe que sentia o impacto dos desfalques e que correu sérios riscos de sequer se classificar para a atual edição da Champions League. Até por esse comprometimento, o reconhecimento do brasileiro é tão grande na Inglaterra.
Dá para discutir se a atual temporada de Fabinho não é a melhor dessa sequência. O meio-campista continua fazendo um trabalho consistente na marcação e aparece até mais para resolver partidas. Anotou cinco gols na Premier League, alguns deles importantes na corrida pela liderança durante o segundo turno. Já na Champions, representou um desafogo na volta das semifinais contra o Villarreal, quando iniciou a reação dos Reds com o tento que conteve a reviravolta buscada pelos espanhóis – ajudado também por Géronimo Rulli. Não à toa, a lesão recente sofrida contra o Aston Villa preocupou e Jürgen Klopp foi cuidadoso, sem sequer utilizá-lo nos últimos compromissos. Sua participação nos últimos treinos é uma ótima notícia.
Fabinho, aliás, talvez tenha uma motivação extra para enfrentar o Real Madrid: o clube foi sua porta de entrada ao futebol europeu, através do empresário Jorge Mendes. O então promissor lateral do Fluminense chegou ao Bernabéu e atuou por apenas 14 minutos na equipe principal dirigida por José Mourinho, mas ficou no Real Madrid Castilla ao longo de 2012/13. Estava presente numa equipe que contava com Nacho Fernández, Lucas Vázquez, Jesé Rodríguez, Denis Cheryshev e Álvaro Morata. Inclusive, não era cogitado como volante porque quem ocupava o setor era justamente Casemiro, em sua tentativa de se firmar no futebol espanhol após a saída problemática do São Paulo. Diferentemente do meio-campista, Fabinho não ficou. Estava apenas emprestado pelo Rio Ave (onde não jogou) e seria repassado ao Monaco para desabrochar.
Fabinho cresceu muito no futebol durante esses últimos nove anos, assim como Casemiro. Colocaram-se no topo e permanecem por lá. Até houve um embate recente na Champions, durante as quartas de final de 2020/21, que serve de antecedente à atual ocasião. Os dois estiveram em campo durante os 180 minutos de futebol. Fabinho não conseguiu evitar o estrago causado nos 3 a 1 do Bernabéu. Em Anfield, Casemiro seria o melhor em campo e contribuiu bastante ao empate por 0 a 0, que garantiu a classificação merengue às semifinais. Desta vez, vale taça.
Enquanto a disputa pelo topo da Europa ganha seu capítulo mais importante, é natural pensar em como a amizade nutrida nos tempos de Real Madrid Castilla se desenrola também numa concorrência pela camisa da Seleção. Mesmo que a importância de Casemiro seja muito grande desde sua efetivação com Tite, Fabinho ocupou a lacuna deixada por Fernandinho e correspondeu muito bem nas chances que ganhou durante os últimos meses. Os dois se revezaram na posição durante as Eliminatórias e Fabinho se destacou quando entrou. Ainda que, por liderança, a braçadeira tenha ficado com Casemiro em parte dos jogos nos quais atuou.
Tite tende a usar outro volante que saia mais para o jogo no setor, Bruno Guimarães ou Fred, o que contém a ideia de botar Casemiro e Fabinho juntos. Fato é que, quando precisar, o treinador sabe que os dois poderão entregar em alto nível com a amarelinha. Enquanto isso, eles tentam um último grande título antes da disputa da Copa do Mundo em novembro. A Champions não deve ser um divisor de águas para a corrida particular entre os dois, mas eleva o moral de quem vencer. O campeão sairá um pouco maior na história gloriosa de seu clube. Ambos já fazem parte dessa tradição, mesmo em times gigantes.