Ver um dos melhores jogadores do seu time sair é sempre sofrido. Mesmo quando é um negócio bem amarrado e que gere lucro ao clube, no fim, o que o torcedor mais quer é ver os jogadores fazerem a história pela camisa que ele torce. Em alguns casos, porém, é preciso entender. A transferência de ainda mais no caos que vive, com a saída de Ariel Holan.
Soteldo cresceu e apareceu no Santos. Chegou do Huachipato como uma excelente contratação e venceu toda a desconfiança e o preconceito por ser baixinho. Habilidoso e criativo, se tornou rapidamente um jogador importante no clube e fez parte de momentos importantes, como o vice-campeonato no Brasileiro de 2019. Também foi importante na excelente campanha do vice-campeonato da Libertadores, já em 2020 e que invadiu 2021.
A proposta do Toronto por Soteldo foi de US$ 6 milhões por 75% dos direitos econômicos do jogador. Seriam US$ 4 milhões pelos 50% que pertencem ao Santos, e US$ 2 milhões por 25% do que pertence ao Huachipato, que manteria os outros 25%. Durante as negociações, porém, as coisas mudaram: ficou acertado dar US$ 3 milhões a cada um dos clubes e 100% dos direitos federativos para o clube canadense. O Santos repassará toda a sua parte ao Huachipato e ainda coloca US$ 500 mil para resolver a dívida com o clube do Chile. O Peixe teria direito a 12,5% do valor de uma potencial venda futura. Como o jogador tem 23 anos, há uma boa chance de uma transferência no futuro.
Isso porque o Santos não pagou pela transferência de Soteldo, em 2019. Com a venda do venezuelano, o clube da Vila Belmiro usa o dinheiro da venda, e mais um pouco, para encerrar a dívida de US$ 3,5 milhões. Sem a proibição de transferências, o Santos espera fazer contratações pontuais e modestas, mas que ajudem a encorpar o elenco para o resto da temporada.
Em 2020, Soteldo foi sondado duas vezes, por Atlético Mineiro, à época com Jorge Sampaoli, que tinha trabalhado com o camisa 10 no Santos, e também pelo Al Hilal, da Arábia Saudita, um dos maiores e mais ricos clubes do Oriente Média. Na época, o jogador recusou as duas propostas e preferiu ficar no Santos. Desta vez, se interessou em ir ao Canadá jogar pelo Toronto.
O Huachipato, assim, tira o processo que movia na Fifa e passa a permitir contratações. O Santos ainda fica com 12,5% de uma venda futura de Soteldo, uma possibilidade alta de acontecer, já que o venezuelano ainda é bastante jovem. Não é o melhor negócio, mas é o negócio possível em um clube que está sufocado pelas contas mal geridas.
A atual gestão do Santos de fato precisa lidar com uma bagunça nas contas. Ainda não se sabe se Andres Rueda conseguirá melhorar a situação, se não cairá em tentação de gastar o que não tem quando a pressão por resultados se tornar mais forte. De qualquer forma, pensando de forma pragmática e olhando o que as contas do Santos sofrem, a transferência se tornou uma forma rápida de resolver o problema, que poderia se tornar pior com o passar do tempo. Portanto, o negócio acaba sendo necessário mesmo ao Santos, ainda que seja dolorido.
A Soteldo, também é uma boa oportunidade. O Toronto é um bom clube da MLS, estruturado, campeão em 2017, quando também foi o melhor time da fase regular. Na época, tinha como estrela o italiano Sebastian Giovinco, conhecido como “Formiga Atômica”. Era um atacante, arisco e bastante baixinho com seu 1,60 metro. Jogava com a camisa 10. Qualquer semelhança não é coincidência. Soteldo, com seu 1,58 metro, chegará para o mesmo papel e, espera, com o mesmo sucesso.
O Santos é uma plataforma enorme para o jogador ser reconhecido, mas o Toronto também é, infelizmente porque o Campeonato Brasileiro é mal trabalhado no exterior. É mais fácil assistir MLS na Europa do que o Brasileirão, embora a Libertadores também seja acessível, de certa forma. Além disso, no Toronto Soteldo tem condição de morar em uma cidade com qualidade de vida alta, algo que certamente tem um apelo com a sua família, e chega como jogador designado no clube, ou seja, ganha acima do teto salarial da liga, mais um atrativo para ele.
Depois de passar por Zamora, Huachipato e rapidamente pela Universidad de Chile, o Santos foi o clube pelo qual Soteldo teve mais projeção e dá a oportunidade a ele de uma boa transferência. Será importante para a sua carreira, especialmente pelos aspectos não esportivos. Sim, ficar no Santos seria um desafio maior, mas o Toronto oferece uma chance interessante para ele mostrar o seu talento. Não é impossível que ele possa dar o salto para a Europa, em algum momento – ainda mais se for em centros menores.
Para o Santos, é triste e em outra circunstância, seria mais fácil manter Soteldo e só vende-lo quando o dinheiro fosse realmente muito alto. O clube não pode fazer isso no momento. Soteldo sabe também que a situação do Peixe não é das melhores e que possivelmente o time irá sofrer – em campo e fora dele – nesta temporada. O Toronto, então, se torna uma boa para todos os envolvidos no negócio. O torcedor ficará de coração partido de ver um dos seus melhores jogadores sair, mas acaba sendo uma consequência de anos anteriores em que os gastos foram descontrolados.
No Toronto, Soteldo tem tudo para brilhar e ser mais do que um destaque do time: ele pode ser um dos grandes jogadores da liga. Além das questões técnicas envolvidas em contratar um dos melhores jogadores do Brasileirão, o Toronto aposta nele também como marketing. Ele é visto com uma pessoa de família e a ideia é vender Toronto como uma cidade para a família – é um local conhecido por receber imigrantes de várias partes do mundo.
O melhor seria que o Santos não precisasse da transferência para resolver um grave problema que se meteu. Mas uma vez que é inevitável, a saída da venda de Soteldo é um remédio amargo. Ao jogador, dá uma boa chance também de viver uma outra experiência. Resta saber se o clube da Vila usará a chance para manter as contas em dia – e não para se endividar ainda mais.
A MLS ganha um jogador de alto nível, que deve chamar a atenção pelas suas atuações e pode tornar o Toronto um time mais forte. Para a liga, é sem dúvida positivo a chegada do jogador. É, além de tudo, venezuelano, o que cria uma relação com a forte população latina nos dois países e aumenta a influência sul-americana na principal liga de futebol dos Estados Unidos e Canadá.