O esporte é, antes de tudo, um direito do cidadão. Foi esse o enfoque que a ex-atleta olímpica e ex-jogadora de vôlei Ana Moser assumiu o Ministério do Esporte nesta quarta-feira, em Brasília. A ênfase que Ana Moser deu ao assumir a pasta foi claro: é preciso garantir o acesso de todos os cidadãos à prática esportiva em todo país. Parece uma premissa um tanto básica, mas que não é respeitada e é de extrema importância. A ex-atleta ser a titular da pasta é uma quebra de paradigma, já que é a primeira mulher no cargo e também é a primeira atleta a assumir o posto desde Pelé, que foi Ministro Extraordinário do Esporte em 1995.
Aos 54 anos, Ana Moser foi jogadora profissional de vôlei e capitã da seleção brasileira. Conquistou a medalha de bronze em Atlanta 1996 e foi vice-campeã mundial em 1994, além de ter conquistado três vezes o Grand Prix. Faz parte do Hall da Fama do Voleibol desde 2009.
Depois da aposentadoria nas quadras, Ana Moser continuou atuando no esporte. Foi criadora do instituo Esporte & Educação (IEE), fundada em março de 2001 e que foi presidida por ela em 2021. A ONG desenvolve projetos de atendimento direto a crianças e adolescentes em atividades esportivas e socioeducativas, na formação de professores e estagiários, na sensibilização de políticas públicas e no desenvolvimento de metodologia de esporte educacional.
A atleta participou também do projeto Caravana do Esporte, em parceria do Unicef com a ESPN Brasil, “um movimento de ação e mobilização social pelo direito das crianças ao esporte, lazer, à educação e à cultura”. Ana Moser fez parte também da ONG Atletas pelo Brasil e teve um papel importante como articuladora da sociedade civil em prol da Lei Geral do Esporte e do Plano Nacional do Desporto. A atleta também foi diretora do Centro Olímpico do Parque do Ibirapuera, entidade vinculada à Secretaria de Esportes de São Paulo, e fez parte do Conselho Nacional do Esporte.
“Muito mais que honra, essa é uma missão que recebo em nome de uma causa, que é garantir o direito de todos ao esporte”, afirmou a ministra. “Este foi o pedido feito pelo presidente: fazer uma revolução no esporte, uma revolução do esporte na educação, na saúde, na assistência social, dentro dos municípios. Oferecer acesso ao esporte e à atividade física na vida de todos e todas, e também desenvolver o esporte amador”, completou.
Para tornar a prática esportiva mais democrática e ampla, Ana Moser acredita que a pasta precisará focar na base da pirâmide. “É inverter a lógica que sempre colocou como prioridade o esporte de rendimento, o topo da pirâmide, de uma estrutura que deveria ser garantidora, na prática, do direito de todos ao esporte que está previsto na Constituição”, defendeu.
“Sempre foi um grande desafio sensibilizar as lideranças para entenderem realmente o potencial do esporte e defenderem que ele aconteça na vida das pessoas. Precisamos desenvolver a cultura da prática motora, da prática esportiva, inserida nas famílias, nos bairros, nas cidades”, continuou a nova ministra.
“Eu diria que um milagre aconteceu para quem defende o esporte como um direito de todos. Acho que não seria eu nessa cadeira se não fosse essa intenção”, definiu. “Nossa proposta é buscar estratégias, recursos e parcerias para implantar o acesso ao esporte e à atividade física em todo o país, para a maior parte da população que possamos atender”, acrescentou.
A ministra destacou ainda que trabalhará com o Congresso Nacional no avanço da Lei Geral do Esporte e do Plano Nacional do Esporte. “Vamos dar um foco grande na conversa com o Legislativo e com os outros setores para que essas legislações avancem e possam dar a base para termos mais gente praticando esporte”, disse Ana Moser, que ainda aproveitou o evento para homenagear três ídolos brasileiros: Sócrates, Pelé e Isabel Salgado, também ex-jogadora de vôlei e que faleceu em novembro.
Além de Ana Moser, outros ex-atletas estarão no Ministério do Esporte. A ex-jogadora de basquete Marta Sobral, medalhista de prata em Atlanta 1996 e bronze em Sydney 2000, assume como secretária de Esporte de Alto Rendimento. Diogo Silva, reconhecido atleta do taekwondo, ouro no Pan-Americano de 2007, também estará na equipe.
“A volta do ministério com uma mulher é perfeita. Fico feliz e arrepiada porque a gente sabe a importância que a mulher tem. A Ana Moser tem projetos sociais e não é de hoje. Ela sabe as dificuldades que o atleta tem”, ressaltou Marta Sobral. “O esporte impacta no SUS, na economia, na segurança pública. Então, ele não pode estar isolado”, ponderou Diogo Silva.
O Ministério do Esporte precisa cuidar do básico, antes de qualquer coisa, e por isso a ideia de dar prioridade ao acesso esportivo aos cidadãos é tão importante. Há milhares de escolas pelo Brasil que sequer possuem quadra esportiva. O acesso ao esporte precisa ser muito maior e melhor e sabemos que não é possível resolver tudo de uma hora para outro, nem fazer obras em todas as escolas que possuem estrutura deficitária de uma vez só. Mas é preciso que essa seja uma prioridade.
Isso não significa que o Ministério não tem que também lidar com questões como a gestão do esporte de base, em todas as modalidades. É preciso pensar no esporte integrado à educação e também é preciso criar mecanismos para o esporte de alto rendimento olímpico. Nenhum país que é desenvolvido no esporte deixa de investir no alto rendimento. Só não se pode investir só nisso, porque se não é um investimento que se perde com o tempo. É preciso cuidar do acesso ao esporte, das categorias de base, dar mecanismos para o desenvolvimento do esporte – e dos ex-atletas para que eles cheguem à gestão esportiva, se assim quiserem.
No futebol, especificamente, estamos em um momento de discussões intensas sobre a criação da liga profissional, algo que não exige participação do Ministério do Esporte, mas é importante tratar sobre questões legislativas ligadas a isso, como as SAFs. A maior participação do Ministério no futebol é no acesso ao esporte e na formação de jogadores, dando condição a realização de torneios escolares e também com parceria com clubes para justamente fornecer acesso ao esporte para muitas pessoas que hoje não têm o esporte como um caminho possível – e isso inclui muito mais do que o futebol.
A tarefa de Ana Moser é enorme. Será a primeira ex-atleta a assumir o cargo desde que Pelé foi Ministro Extraordinário do Esporte, de 1995 a 1999. Depois, o Ministério teve muitos nomes, mas sempre de políticos. Durante o governo Bolsonaro, o Ministério do Esporte se tornou uma Secretaria dentro do Ministério da Cidadania. Ana Moser assume o cargo sem estar filiada a nenhum partido e com uma missão importante e difícil. É, porém, uma pessoa extremamente preparada para isso. Que consiga gerir bem o esporte brasileiro.