Copa do MundoEspanha

O Espanha x Japão que apresentou Xavi ao mundo e fez os ibéricos olharem mais para sua base

O confronto mais importante entre os adversários desta quinta-feira valeu o título do Mundial Sub-20 de 1999 e apresentou um caminho para os espanhóis

Adversários nesta quinta-feira, Espanha e Japão têm como confronto mais célebre a decisão do Mundial Sub-20 de 1999, disputado na Nigéria. Se para os japoneses aquele foi seu ponto alto na história da competição, com alguns nomes despontando para a equipe principal dos Samurais Azuis, para os espanhóis representou ainda mais: aquela seleção que enfim levantou o título no torneio – com goleada de 4 a 0 na final – revelou talentos como o meia Xavi Hernández e o goleiro Iker Casillas (que foi reserva na maior parte da campanha, mas teve seu momento de brilho). E a conquista ainda serviu para encorajar a abertura de espaço para o talento feito em casa por parte dos clubes do país. E os resultados viriam no novo século.

Os bastidores do torneio

País com longa tradição nas competições de base entre seleções, a Nigéria havia sido escolhida inicialmente como a sede do Mundial de Juniores (atual Mundial Sub-20) de 1995, mas um surto de cólera e meningite obrigou a Fifa a retirar do país a organização do torneio em anúncio feito no dia 10 de fevereiro daquele ano, a um mês da data prevista para a abertura. Nos dias seguintes, a entidade chegou a declarar que “daria uma segunda chance” à Nigéria. Mas, sem melhora na crise sanitária, acabou transferindo a sede para o Catar.

A “segunda chance” acabaria vindo quatro anos mais tarde, mas não sem novos temores. Não no aspecto sanitário, mas no político: o tenente-general Sani Abacha, que havia se autoproclamado presidente do país em 1993 e instaurado uma ditadura militar, morrera de infarto em junho de 1998, e o país agora era dirigido provisoriamente por outro general, Abdulsalami Abubakar, que prometera realizar eleições gerais e diretas. Elas acabaram acontecendo ainda antes da realização do torneio, e a transferência do poder foi pacífica.

Segunda edição do Mundial a contar com 24 participantes, a competição seria realizada entre os dias 3 e 24 de abril em oito cidades-sede. Os temores de problemas políticos não se confirmaram, ainda que outros pontuais de infraestrutura e logística fossem reportados. Algumas seleções, no entanto, levaram equipes enfraquecidas, sem muitos de seus melhores jovens valores, como foram os casos de Alemanha, Argentina e Inglaterra – esta, mais notadamente pelas restrições dos clubes da Premier League a liberar jogadores.

Curiosamente, o último continente a definir seus representantes no Mundial foi o africano, cujo torneio sub-20 terminou apenas em 7 de março, menos de um mês antes do início da competição principal. Além da anfitriã Nigéria, a África contava com quatro vagas, mesmo número de América do Sul, Concacaf e Ásia, enquanto a Europa tinha seis e a Oceania dispunha de uma vaga certa. O formato do certame era o mesmo das Copas do Mundo de 1986, 1990 e 1994: seis grupos de quatro seleções, com mata-mata a partir das oitavas de final.

Abertura do Mundial na Nigéria

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O começo da campanha

A Espanha, dirigida por Iñaki Sáez, foi uma das seis classificadas da Europa para o Mundial pelo Campeonato sub-18 do continente, cuja fase final reuniu oito seleções no Chipre e foi vencida pela Irlanda. Na ocasião, os ibéricos caíram na fase de grupos perdendo no saldo de gols após um tríplice empate em pontos com Alemanha (que terminou líder e avançou à final) e Portugal (que ficou em segundo e disputou o terceiro lugar com a Croácia). Na Nigéria, a Espanha mediria forças com Brasil, Honduras e a estreante Zâmbia no Grupo F.

Desde o início, a equipe já apresentava a formação que permaneceria quase imutável ao longo da competição, num esquema 4-1-3-2, oscilando para o 4-2-3-1 ou o 4-1-4-1. Daniel Aranzubia, do Athletic Bilbao, era o bom goleiro que se posicionava atrás de uma segura linha de quatro defensores: Pablo Coira (Compostela) pela direita e David Bermudo (Barcelona) pela esquerda eram laterais com vocação ofensiva, enquanto Carlos Marchena (Sevilla) e Francisco Jusué (Osasuna) formavam parceria sólida no miolo de zaga.

Ronaldinho Gaúcho foi outro nome que despontou no torneio

A cobertura da defesa era feita com muita competência pelo volante Pablo Orbaiz (Osasuna), que liberava o outro meia central, Xavi (Barcelona), para se tornar peça fundamental na criação do jogo da equipe. Pelas pontas, havia a velocidade de Fernando Varela (Betis) pela direita e de José Barkero (Real Sociedad) pela esquerda, ambos excelentes chutadores de média e longa distância. Já na frente, Gabri (Barcelona) era um meia que atuava mais adiantado, de segundo atacante, próximo a Pablo (Numancia), autêntico homem de área.

Havia ainda boas opções de banco – incluindo um promissor goleiro do Real Madrid chamado Iker Casillas. Os merengues também cediam o atacante David Aganzo. Outros nomes bastante utilizados foram o volante Gonzalo Colsa (Logroñés), o meia Álex (Lugo), o ponta Francisco Javier Yeste (outro do Athletic Bilbao) e, sobretudo, o atacante Rubén (Sporting Gijón), que atuou em todas as partidas, embora quase sempre vindo da reserva. Por fim, havia o volante Álvaro, do Zaragoza, que se lesionou e teve de retornar à Espanha.

O jogo daquele time girava em torno de seu grande nome, o camisa 8 Xavier Hernández, o Xavi, promessa já muito comentada. No Barcelona, ele atuava um pouco mais atrás, como um volante organizador, de primeiro passe, estilo semelhante ao titular da posição e outro bem-sucedido talento saído da cantera azulgrana. “Provavelmente, o mais habilidoso da ascendente geração espanhola. Um líder nato do meio-campo apropriadamente comparado ao companheiro de clube Pep Guardiola”, escrevia a revista inglesa World Soccer.

Humilde, o jovem talento catalão que havia sido integrado ao elenco principal do Barça naquela temporada preferia manifestar sua admiração pelo colega de posição. “Ainda tenho muito o que aprender com Guardiola. Antes que se imagine o passe, ele já o fez. Eu tento, mas a verdade é que não é tão fácil”, declarou o meia de 19 anos ao ser entrevistado na Nigéria pelo jornal Mundo Deportivo. Mas na estreia contra o Brasil, no jogo mais aguardado da primeira fase, quem brilhou foi outro garoto da base barcelonista: o meia Gabri.

Gabri, da Espanha, um dos destaques do torneio

A seleção brasileira trazia o gremista Ronaldinho como maior astro e contava com outros nomes de peso no time titular, como o goleiro Fábio (então no União Bandeirante-PR), o zagueiro Juan (Flamengo), o lateral Mancini (Atlético Mineiro) e os atacantes Edu (São Paulo) e Fernando Baiano (Corinthians), além de alguns que começaram a partida no banco (o goleiro flamenguista Júlio César, o lateral são-paulino Fábio Aurélio e o atacante cruzeirense Geovanni). Todos já ocupando espaço importante em seus respectivos clubes.

Mas na vitória espanhola por 2 a 0, o dono do jogo foi Gabri, que marcou ainda os dois gols ainda no primeiro tempo, aos 14 e aos 32 minutos – o segundo após bela jogada de Pablo – e recebeu inúmeros elogios da imprensa internacional. Na segunda rodada, no entanto, a equipe sucumbiu ao calor de 40 graus na cidade de Calabar e não teve fôlego para ir além do 0 a 0 contra Zâmbia, do atacante Andrew Sinkala, que faria carreira na Bundesliga pela década seguinte. De todo modo, a vaga nas oitavas seria confirmada no último jogo.

Mesmo poupando cinco titulares – o que levou Iker Casillas a ganhar uma chance no gol no lugar de Aranzubia – a Espanha não teve maiores problemas para superar a seleção de Honduras (de nomes promissores como o zagueiro Milton Palacios, o atacante Julio César de León e os primos atacantes Maynor e David Suazo) por 3 a 1, resolvendo a partida em pouco mais de meia hora de jogo e garantindo o primeiro lugar do grupo. O Brasil ficou em segundo, com Zâmbia (em terceiro) e Honduras (na lanterna, sem somar pontos) eliminadas.

Fernando Varela, numa dura disputa contra Honduras

Nas demais chaves, as definições causaram algumas surpresas. No Grupo A, sediado no Estádio Nacional de Lagos, o Paraguai de Roque Santa Cruz, Nelson Cuevas e Salvador Cabañas terminou líder, à frente da anfitriã Nigéria, mesmo sendo goleado na estreia pela Alemanha por 4 a 0. Os africanos terminaram na segunda colocação, superando a repescada Costa Rica no saldo de gols, E os germânicos, apesar da grande vitória na abertura da chave, perderam os outros dois jogos e terminaram na lanterna e eliminados do torneio.

No Grupo B, o destaque foi a seleção de Gana, primeira colocada com duas vitórias e um empate à frente da estreante Croácia (do goleiro Stipe Pletikosa) e da Argentina que, mesmo desfalcada de nomes importantes, ainda podia alinhar promessas como Esteban Cambiasso, Luciano Galletti, Gabriel Milito e Aldo Duscher. Mesmo assim, a Albiceleste, vencedora das duas últimas edições do torneio, decepcionou e passou apenas na repescagem, marcando só um gol. Na lanterna, sem pontuar, ficou o também debutante Cazaquistão.

A Irlanda de Robbie Keane e Damien Duff, surpreendente campeã europeia, ficou no Grupo C, mas terminou na segunda colocação, atrás do México de Rafa Márquez e Gerardo Torrado numa chave em que o terceiro não conseguiu vaga na repescagem. Era a Austrália, que reunia muitos nomes que logo disputariam Copas do Mundo pelos Socceroos (Brett Emerton, Vincenzo Grella, Jason Culina, Mark Bresciano, Mile Sterjovski), mas não conseguiu ir além de uma vitória sobre a Arábia Saudita, lanterna com apenas um ponto.

Já o Grupo D tinha, por ironia, composição praticamente idêntica ao H desta Copa do Mundo, com Portugal, Uruguai, Coreia do Sul e uma seleção africana com bandeira nas cores vermelha, amarela e verde – o Mali, em vez de Gana. Embora contasse com o atual vice-campeão do torneio (Uruguai) e um bicampeão (Portugal), a sensação da chave foram os malineses, que já de saída venceram os dois favoritos e encaminharam a primeira colocação, mesmo com a derrota de 4 a 2 para os lanternas sul-coreanos na última rodada.

E então vinha o equilibrado Grupo E, que terminou com Japão em primeiro superando Estados Unidos e Camarões no saldo após um tríplice empate em seis pontos. Em último, sem pontuar ou balançar as redes, ficou a desfalcada Inglaterra, que não pôde levar jovens como Michael Owen, Joe Cole e Alan Smith (embora contasse com Ashley Cole e Peter Crouch). Os japoneses largaram com derrota de virada para os camaroneses por 2 a 1, mas duas vitórias sobre estadunidenses (3 a 1) e ingleses (2 a 0) os colocaram no topo da tabela.

A federação nipônica levou tão a sério a competição que técnico da equipe de base era o mesmo da seleção principal, o francês Phillippe Troussier. Além disso, era uma das poucas delegações a levarem um atleta que havia participado da Copa do Mundo no ano anterior: o meia Shinji Ono. E outros nomes também teriam carreira destacada tanto em clubes do país e do exterior quanto com os Samurais Azuis: o lateral Kōji Nakata, os meias Mitsuo Ogasawara, Junichi Inamoto e Yasuhito Endō e o atacante Naohiro Takahara.

O mata-mata

Nas oitavas, a Espanha enfrentaria o segundo colocado do grupo do Japão, os Estados Unidos do goleiro Tim Howard. E abriria boa frente em cerca de meia hora de jogo. Aos 17, Varela recebeu lançamento, chapelou Howard e passou para Pablo tocar ao gol vazio. Três minutos depois, Xavi bateu falta com perfeição e ampliou. E aos 32, Pablo desviou um cruzamento e fez o terceiro. No segundo tempo houve suspense, quando o atacante Taylor Twellmann diminuiu duas vezes. Mas os ibéricos seguraram a vitória por 3 a 2 e avançaram.

O Japão, por sua vez, surpreendeu ao eliminar nos pênaltis (após empatar em 1 a 1 no tempo normal e prorrogação) a seleção portuguesa dirigida por Jesualdo Ferreira, na qual se destacava o ponta Simão Sabrosa. Também nas penalidades a Nigéria eliminou a Irlanda e o Uruguai venceu o duelo sul-americano com o Paraguai após intermináveis 22 cobranças. Nos demais jogos, Gana bateu a Costa Rica; Brasil e México golearam Croácia e Argentina, respectivamente; e o Mali tirou Camarões num insano 5 a 4 repleto de reviravoltas.

O chaveamento das quartas de final ficou interessante: de um lado, três seleções africanas (Mali, Gana e a anfitriã Nigéria) mais a Espanha, única europeia a seguir no torneio. Do outro, três latino-americanas (Brasil, Uruguai e México) e o Japão, solitário representante asiático naquela etapa. Nos confrontos, coube aos espanhóis enfrentarem Gana, enquanto Mali e Nigéria fariam o duelo africano. Já na outra “perna” do chaveamento, Brasil e Uruguai fariam o clássico sul-americano, enquanto o Japão teria pela frente o México.

Os destaques dos ganeses, dirigidos pelo italiano Giuseppe Dossena, eram o meia Stephen Appiah e o atacante Peter Ofori-Quaye, que, em outubro de 1997, jogando pelo Olympiacos, tornara-se o jogador mais jovem a balançar as redes na Liga dos Campeões, aos 17 anos de idade. E ele seria o autor do gol de empate de Gana nos acréscimos, depois de Barkero ter aberto o placar batendo pênalti para a Espanha logo no início da etapa final. Sem “gol de ouro” na prorrogação, o 1 a 1 permaneceu e a decisão foi para as penalidades.

As duas equipes converteram suas três primeiras cobranças até que Gabri teve seu pênalti salvo pelo goleiro Sammy Adjei. Mas na última da série inicial, Hamza Mohammed acertou o travessão e deixou tudo igual. A decisão se estendeu por mais quatro séries de pênaltis alternados. E veio o momento em que brilhou a estrela de Iker Casillas, substituto do titular Aranzubia naquele jogo. Logo após Varela colocar os espanhóis em vantagem, ele defendeu a cobrança do lateral direito George Blay e deu a vitória aos ibéricos por 8 a 7.

Nos outros jogos, Japão e Mali seguiram como sensações. Os nipônicos derrotaram o México por 2 a 0 com dois gols marcados no início do jogo, enquanto os malineses derrubaram os anfitriões nigerianos com um contundente 3 a 1. Já no clássico sul-americano, os uruguaios eliminaram os brasileiros vencendo de virada por 2 a 1 graças a um pênalti que provocou muita contestação a quatro minutos do fim do tempo normal. Agora nas semifinais a Celeste enfrentaria o Japão, ao passo que a Espanha teria pela frente o Mali.

A seleção africana – que já derrotara Uruguai, Portugal, Camarões e Nigéria – despontava como a maior surpresa do torneio, visto que, até ali, o país ainda sequer disputava Eliminatórias de Copa do Mundo (embora já tivesse obtido bons resultados na Copa Africana de Nações). Mas se seu histórico era incipiente, a equipe olhava para o futuro e apresentava dois nomes muito promissores no meio-campo: Mahamadou Diarra (que mais tarde defenderia o Real Madrid) e Seydou Keita (que anos depois brilharia no Barcelona).

A seleção do Mali também fez história com o terceiro lugar

Porém, no primeiro tempo da semifinal, o time foi amplamente superado pela Espanha, que abriu o placar logo aos dois minutos. Barkero desceu pela esquerda e atravessou a bola na entrada da área para a finalização de Varela. O segundo nasceu num lance recuperado na saída de bola do Mali e terminou de maneira semelhante. Gabri foi lançado por Xavi do lado esquerdo da área e cruzou rasteiro para Varela, outra vez, ampliar aos 26 minutos. E o mesmo Varela teria um outro gol anulado por impedimento pouco antes do intervalo.

Já o segundo tempo parecia ser bem diferente. Com os espanhóis cedendo ao calor e ao cansaço, Mali descontou logo aos seis minutos com Mahamadou Dissa e parecia ter fôlego para buscar a reação. Pouco depois, porém, o céu ficou carregado de nuvens, a temperatura baixou e, já perto do fim do jogo, desabou a chuva sobre o estádio de Kaduna. E nos acréscimos, a Espanha matou o jogo. Numa saída errada do goleiro Boubacar Keita, a bola voltou para os ibéricos perto da área e chegou a Xavi, que bateu cruzado, fechando o placar em 3 a 1.

A vitória colocava a Espanha pela segunda vez numa final do Mundial da categoria. Em 1985, no torneio sediado na União Soviética, a seleção se sagrara vice-campeã ao perder para o Brasil na prorrogação. Desta vez, chegava como favorita depois que o Japão voltou a surpreender e passou pelo Uruguai de Fabián Carini, Gonzalo Sorondo, Diego Forlán e Javier Chevantón, vencendo por 2 a 1 em Lagos, gols de Naohiro Takahara e Yuichiro Nagai. A trajetória dos Samurais Azuis fazia a imprensa espanhola pregar cautela com o adversário.

A final

Manchete do Mundo Deportivo após a conquista

“Uma equipe solidária, muito veloz e que joga com toques de primeira”, assim era descrito o time de Phillippe Troussier pelo Mundo Deportivo. Jogando em seu habitual 3-5-2, os Samurais Azuis tinham, porém, desfalque importante no meio, o capitão Shinji Ono, suspenso por terceiro cartão amarelo recebido no fim do jogo contra o Uruguai por fazer cera. Seu substituto era Hideyuki Ujiie, que faria seu primeiro jogo na competição justamente na final. De resto, era a mesmíssima escalação preservada ao longo de todo o torneio.

Yuta Minami era o goleiro jogando atrás do trio de defesa com Kazuki Teshima pela direita, Shigeki Tsujimoto pelo centro e Kōji Nakata pela esquerda. No meio-campo, Yasuhito Endō era o volante com Tomoyuki Sakai e Masashi Motoyama abertos pelos lados e Mitsuo Ogasawara pelo centro, mais o já citado Ujiie, substituto de Ono. Na frente, a afinada dupla formada por Naohiro Takahara (artilheiro da campanha com três gols) e Yuichiro Nagai. Todos esses nomes haviam sido titulares em todas as partidas do Japão naquele Mundial.

A seleção japonesa, vice-campeã

A Espanha, por sua vez, chegava com equipe completa para a final, que seria o jogo principal de uma rodada dupla no Estádio Nacional de Lagos, em Surulere, naquela tarde de 24 de abril. Na preliminar, o Mali voltou a derrotar o Uruguai pela decisão do terceiro lugar: 1 a 0, gol de Seydou Keita cobrando falta e contando com a ajuda do goleiro Carini. A vitória confirmava um feito que, nas palavras do seu treinador Mamadou Coulibaly, era o maior da história do futebol do país até ali, superando até o vice-campeonato na CAN em 1972.

Após o pontapé inicial para a decisão, a Espanha não tardou a abrir o placar. Aos quatro minutos, o árbitro argentino Ángel Sánchez apitou uma irregularidade na reposição do goleiro japonês e marcou tiro livre indireto para os ibéricos na entrada da área nipônica. A bola foi rolada para Barkero, que chutou forte e rasteiro, através da barreira, para fazer o primeiro gol espanhol. Aos 14, um lançamento primoroso de Xavi encontrou Pablo arrancando por trás da defesa japonesa, e o atacante só tocou na saída de Minami para ampliar.

Xavi e Tanaka disputam a bola na final

A blitz inicial da Espanha – que marcou 13 de seus 16 gols naquele torneio ainda na etapa inicial das partidas – resultou em mais um tento aos 30 minutos, com Pablo pegando o rebote de uma finalização de Gabri. Os espanhóis encaminhavam a conquista, enquanto seu camisa 9 alcançava o malinês Mahamadou Dissa no topo da artilharia com cinco gols. E os japoneses, atônitos, não conseguiam esboçar reação. Assim como seriam envolvidos no quarto gol, marcado por Gabri aos seis minutos da etapa final após boa troca de passes.

Os espanhóis ainda teriam uma chance clara com o atacante reserva Rubén, mas fora isso o resto do segundo tempo foi protocolar, uma antecipação da grande comemoração. Ao apito final, o abraço entre Xavi e Casillas se tornaria simbólico do que o futuro guardava para a seleção do país. Enquanto isso, na Espanha, o título motivava o debate sobre a continuidade do investimento dos clubes na base, num momento em que as agremiações preferiam seguir o caminho fácil aberto pela Lei Bosman e contratar atletas estrangeiros.

Na conferência de imprensa após a conquista, Iñaki Sáez abordou a questão, afirmando que o desempenho do time aumentou o interesse pelos jogadores jovens e demonstrou que a Espanha contava com novos talentos surgindo. O problema, segundo ele, era que os clubes não permitiam que eles se desenvolvessem. “Mostramos que no futebol espanhol os clubes vêm fazendo um bom trabalho nas categorias de base, mas não carregam esse trabalho para os elencos principais. Em vez disso, compram estrangeiros”, lamentou.

A festa do título da Espanha

Mas aquele seria o ponto da virada: no ano seguinte, a ascensão fulminante de Casillas já lhe premiaria com uma vaga no elenco da Espanha na Euro 2000. Dali a alguns meses, a seleção sub-23 levaria a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Sydney, perdendo a final para Camarões nos pênaltis, com uma equipe na qual Aranzubia, Marchena, Xavi e Gabri ganhariam a companhia de Carles Puyol, Joan Capdevilla, David Albelda e Raúl Tamudo, entre outros. E o volante e capitão Pablo Orbaiz participaria do ciclo para a Copa de 2006.

Como costuma acontecer em competições de base, nem todo mundo se consagrou futuramente. Mas, além dos que chegaram a atuar pela seleção principal, outros jogadores conseguiram ao menos solidificar sua presença em clubes importantes. Varela foi titular do Betis e mais tarde do Mallorca por muitos anos. O reserva Yeste também se manteve como figura de relevo no Athletic Bilbao. E o artilheiro Pablo viveria sucesso inesperado na Inglaterra defendendo o Ipswich, pelo qual marcou 62 gols em 242 jogos em duas passagens.

Iñaki Sáez também teria vez à frente da seleção principal após a saída de José Antonio Camacho, em 2002. Sua equipe que disputaria a Euro 2004 combinaria muitos jogadores do time campeão mundial de juniores e do vice olímpico, mas ele não seria bem-sucedido, deixando o cargo após cair ainda na fase de grupos do torneio. Seria substituído pelo veterano Luís Aragonés que, dali a quatro anos, daria o pontapé inicial na série de conquistas da Roja vencendo exatamente o título da Eurocopa. E o resto, como dizem, é história.

Foto de Emmanuel do Valle

Emmanuel do Valle

Além de colaborações periódicas, quinzenalmente o jornalista Emmanuel do Valle publica na Trivela a coluna ‘Azarões Eternos’, rememorando times fora dos holofotes que protagonizaram campanhas históricas.
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