Brasil

Projeto tenta manter jogos do Botafogo democráticos com distribuição de ingressos

Em tempos de ingressos caros e até jogos só para sócios, o coletivo Botafogo Antifascista segue lutando por um futebol mais democrático e acessível

Dentro de campo, o Botafogo vive um dos seus melhores momentos da história. Líder do Campeonato Brasileiro, o Glorioso também está com praticamente os dois pés na final da Copa Libertadores. Mas, com o alto investimento feito por John Textor, dono da SAF do clube, também veio o aumento no valor dos ingressos e dos planos de sócio-torcedor.

Fora de campo, um grupo tenta manter um lado popular no Botafogo e democratizar o acesso aos estádios – especialmente, é claro, o Nilton Santos. Através do projeto “Futebol para o povo”, o coletivo Botafogo Antifascista leva, desde 2023, torcedores de baixa renda para as partidas do Glorioso como mandante.

Ou, ao menos, levava. Contra o Peñarol, pelo jogo de ida da semifinal da Copa Libertadores, pela primeira vez desde o começo do projeto, o Botafogo Antifascista não conseguiu contemplar algum torcedor com um ingresso para o jogo. Isso porque as entradas foram esgotadas ainda na venda para os sócios do clube.

Antes disso, o Botafogo Antifascista já havia levado 244 torcedores para jogos do Botafogo. Desde a partida contra o Athletico-PR, em maio de 2023, pela Copa do Brasil, no Nilton Santos, todos os jogos do Glorioso como mandante no Rio de Janeiro tiveram torcedores contemplados no projeto “Futebol para o povo” – até a partida contra o Peñarol.

— Usamos o projeto “Futebol para o povo” para tentar fazer um pouco da nossa parte de trazer as pessoas para o estádio. A gente sabe que o acesso ao estádio tem ficado cada vez mais caro e mais difícil ao longo dos últimos anos. E nosso projeto visa, principalmente, trazer pessoas de baixa renda, pessoas que não frequentam os estádios, negros, mulheres, LGBTQIAP+… Nosso objetivo é trazer essas pessoas para os estádios – disse Amanda Sardella, do Botafogo Antifascista, à Trivela.

 

Como funciona o projeto ‘Futebol para o povo'?

O Botafogo Antifascista usa um formulário divulgado nas redes do grupo para selecionar os torcedores que serão contemplados com ingressos para os jogos do Botafogo como mandante. Os botafoguenses devem preencher os dados, por exemplo, sobre situação profissional e renda, além de informações sobre gênero e raça.

O número de torcedores contemplados por jogo depende da doação de outros torcedores, que podem contribuir financeiramente com a compra dos ingressos que serão distribuídos.

Contra o Criciúma, no Maracanã, por exemplo, pelo Campeonato Brasileiro, foram nove torcedores contemplados. Já contra o São Paulo, nas quartas de final da Copa Libertadores, dois alvinegros foram ao Nilton Santos com a ajuda do Botafogo Antifascista.

— Conheci pelo Instagram e me identifiquei, é um movimento que eu também apoio as causas. É algo que deveria ser feito por todas as torcidas. Preenchi o formulário, mas não liguei muito, achei que não daria em nada. Mas fui contemplado e fiquei muito feliz mesmo. Foi algo que me ajudou bastante – disse Jhonny Oliveira, que é vendedor, mas está desempregado no momento e foi um dos torcedores contemplados com ingresso para o jogo contra o Criciúma.

Grupo Botafogo Antifascista já levou mais de 240 torcedores para ver o Botafogo jogar (Foto: Reprodução)
Botafogo Antifascista já levou mais de 240 torcedores para ver o Botafogo (Foto: Reprodução)

Sem vínculo institucional com o clube, o coletivo cobra a criação de um plano de sócio-torcedor popular, que possibilite a democratização das arquibancadas do Nilton Santos.

— A gente não tem nenhum vínculo com o clube, infelizmente. Isso é muito ruim. No jogo de quarta-feira (23), contra o Peñarol, pela Libertadores, a gente não teve como conseguir ingresso porque todos os ingressos esgotaram com o sócio-torcedor. E a gente não tem nenhum plano de sócio-torcedor com preço mais baixo, preço social. Isso não permite que o projeto leve pessoas para o estádio em um jogo tão importante – disse Amanda.

— Como nosso objetivo é democratizar o acesso ao estádio, a gente está buscando outra forma de trazer essas pessoas aos estádios, mas infelizmente a gente só pode contar com a compra de ingressos e doações de pessoas. Nosso objetivo é tentar algum tipo de contato com o clube para que a gente possa continuar fazendo o possível para esse projeto acontecer e trazendo mais pessoas para o estádio, porque o futebol é do povo, ele é para o povo. O nosso objetivo é esse. Enquanto a gente puder trazer pessoas para o futebol, para o estádio, para assistir o esporte, a gente vai fazer o possível – completou a torcedora do Botafogo.

Coletivo Botafogo Antifascinta luta por democratização dos estádios (Foto: Divulgação/Botafogo Antifascista)
Coletivo Botafogo Antifascinta luta por democratização dos estádios (Foto: Divulgação/Botafogo Antifascista)

Coletivo tem mais ações sociais

Além do “Futebol para o povo”, o Botafogo Antifascista tem outras ações sociais. A principal delas é o “Antifas contra a fome”. A cada 15 dias, o grupo se reúne para preparar e distribuir refeições, água e frutas para moradores em situação de rua. Atualmente, o projeto é feito em parceria com a Cozinha Solidária do MTST. Em pouco mais de um ano e meio, já foram distribuídas mais de 2 mil refeições pelo coletivo. O grupo também doa kits de higiene.

O Botafogo Antifascista também promove a ação “O meu sangue ferve por você”, que consiste em uma doação de sangue coletiva em hemocentros do Rio de Janeiro. A ação é feita a cada 4 meses.

 

Faixa do Botafogo Antifacista gerou lei no Rio de Janeiro

Em 2019, uma faixa do grupo gerou polêmica e acabou ganhando repercussão nos estádios do Rio de Janeiro. Durante uma partida contra o Ceará, no Nilton Santos, a Polícia Militar apreendeu uma faixa com os dizeres “Botafogo Antifascismo”. Na época, a PM afirmou que “não seria autorizada permanência no local qualquer material que faça referência à ideologia que não diga respeito ao futebol e a manifestações festivas”.

A censura gerou repercussão nas redes sociais e na política do Rio de Janeiro. Pouco depois, por um projeto dos deputados estaduais Carlos Minc (PSB), Zeidan (PT) e do ex-deputado André Ceciliano (PT), foi aprovado na Alerj e promulgada a Lei 8.708, que assegura “a todo cidadão o direito a livre manifestação dentro dos estádios e outros ambientes esportivos, quando da ocorrência de eventos esportivos abertos ao público”.

Foto de Gabriel Rodrigues

Gabriel RodriguesSetorista

Jornalista formado pela UFF e com passagens, como repórter e editor, pelo LANCE!, Esporte News Mundo e Jogada10. Já trabalhou na cobertura de duas finais de Libertadores in loco. Na Trivela, é setorista do Vasco e do Botafogo.
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