Palmeiras tomou lugar que por décadas foi do São Paulo, diz diretor de gigante do mercado
Executivo da Roc Nation Sports concede entrevista à Trivela e explica diferencial do clube alviverde
O ano de 2015 é marcado na história do Palmeiras como o início de uma retomada. Foi há nove temporadas, no segundo ano do mandato de Paulo Nobre, que o Palmeiras começou a se reencontrar com sua grandeza.
Foi a primeira temporada do clube com o Allianz Parque como sua casa desde a primeira partida do calendário. Que Alexandre Mattos foi contratado como diretor. Ano em que a Crefisa se tornou patrocinadora-máster. E que as categorias de base alviverdes passaram por uma revolução.
Em março de 2015, desembarcava também no Palmeiras João Paulo Sampaio. Vindo do Vitória, o coordenador chegou com carta branca para fazer o Palmeiras, enfim, ser relevante nas categorias de base — algo que nunca acontecera na sua história, já centenária àquela altura.
Palmeiras lucrou 194 milhões de euros
Um recente estudo publicado pelo CIES mostra que o clube acertou. No mundo todo, o Palmeiras (194 milhões de euros) foi o 18º que mais lucrou com negociações desde, justamente, 2015 — Athletico-PR, em 16º (200 milhões de euros), e Fluminense (186 milhões de euros), em 20º, são os outros brasileiros da lista.
E o top-5 de vendas do Palmeiras é totalmente composto por jogadores formados no clube (em milhões de euros):
1º Endrick – 72 (Real Madrid)
2º Estêvão – 61,5 (Chelsea)
3º Gabriel Jesus – 32 (Manchester City)
4º Danilo – 20 (Nottingham Forest)
5º Artur – 15 (O clube o vendera para o Red Bull Bragantino por 6, em 2020, e recomprara por 9, em 2023, antes de negociá-lo com o Zenit)
O Benfica e o Ajax lideram a lista, com 816 milhões de euros (R$ 5 bi) e 473 milhões de euros (2,9 bi), respectivamente.
Os times portugueses, aliás, contam com mais três clubes no Top-10: Sporting (345 mi de euros), Porto (296 mi de euros) e Braga (279 mi de euros).
Palmeiras tomou o lugar do São Paulo
Foi no ano passado que a gigante Roc Nation, fundada pela magnata da música Jay-Z, adquiriu a brasileira TFM (ex-Traffic).
Por meia da subsidiária Roc Nation Sports, o conglomerado adquiriu por tabela o portfólio da TFM, que tinha nomes como Vinícius Jr. e Endrick.
Na visão de Thiago Freitas, COO (diretor de operações) da Roc Nation Sports Brazil, o Alviverde é o grande nome no mercado de categorias de base no Brasil. Ocupando o lugar que pertencia a um arquirrival.
— O Palmeiras tomou o lugar que por décadas foi do São Paulo, de referência nacional para todos os formadores na iniciação esportiva — afirma Thiago.
— Hoje, de Rondônia a Caxias do Sul, em qualquer escolinha, o que seus treinadores querem e nos pedem é para “colocar um jogador no Palmeiras”. Além disso, é dos poucos clubes brasileiros que tem um trabalho estruturado e integrado para aceleração da promoção dos jovens diferenciados, que já começa antes mesmo de assinarem seu contrato de formação — acrescentou Freitas.
Os melhores, precisam buscar os melhores ambientes
Em entrevista à Trivela, Thiago Freitas explicou qual o diferencial do Palmeiras na formação de atletas e como o mercado europeu enxerga a formação no Brasil:
Trivela — O que coloca o Palmeiras na frente de seus pares na formação de atletas? Há um fator específico?
Thiago Freitas — O Palmeiras, em relação aos principais formadores do país, mantém um número consideravelmente menor de observadores, mas que são melhor alinhados. E que, por ser menor, é mais ágil. Na captação durante torneios, isso é crucial. Em alguns clubes, a aprovação de um jovem parece um processo judicial. Exige semanas, em um ambiente no qual, por vezes, não se tem mais do que dois ou três dias.
— Além disso, o Palmeiras não acelera promoção dos seus principais destaques somente. É um clube que instituiu uma dinâmica de promoções para categorias superiores que abrange um número maior de atletas, que é sustentada pela participação em muitas competições além das oficiais, organizadas pelas federações.
O que a Europa espera hoje de um atleta brasileiro?
Os europeus seguem procurando nos brasileiros a combinação de habilidades e perícia, combinadas com improviso e burla — o que podemos definir como o talento de um futebolista. O que eles cada vez mais cobram e esperam dos brasileiros é uma postura e prática que valorizem mais o preparo e o desenvolvimento do que o desfrute e a ostentação.
Hoje, os “malandros” não são regra entre os jovens brasileiros. Esses, dificilmente chegam às equipes principais ou mesmo juniores de seus clubes. A competição é muito grande, cresce cada vez mais, e seguem sendo apenas onze camisas de cada lado em campo.
O Brasil hoje vende atletas melhor do que a Argentina, que tinha mais facilidade no mercado europeu no passado?
Não é correto dizer que “vendemos melhor”. Primeiro, porque atletas não são produtos, de propriedade dos clubes. Segundo, porque nossos clubes recebem mais pelas transferências dos seus atletas porque formamos mais e melhores atletas.
Não é um mérito de negociadores, mas dos atletas e de quem trabalha com eles. Nossos clubes são mais procurados, e recebem mais dinheiro, porque desenvolvemos uma “indústria” de formação que, mesmo com diversas deficiências e vícios, é uma indústria cada vez mais precoce. E que recebe cada vez mais dinheiro para financiar a formação nos clubes — além da paralela, complementar deles (o extracampo).
Os atletas mais talentosos do Brasil vão continuar a ser vendidos cada vez mais cedo? Não seria melhor deixar com que eles se desenvolvessem aqui por mais tempo?
Os atletas do mais alto nível precisam deixar o Brasil o quanto antes. Ideal seria deixarem o país aos dezesseis anos. Aqui, chegam ao ambiente dos grupos principais dos clubes e já passam a perder tempo, com sobrecarga física, jogos irrelevantes e instabilidade dos treinadores.
Tivemos uma melhor significativa com a chegada de treinadores estrangeiros. Mas, nessa etapa final da formação dos atletas, que é a da primeira temporada deles na equipe adulta, principal, ainda estamos em um nível muito inferior ao dos europeus, e sem qualquer atenção individualizada aos atletas.
— Os melhores, precisam buscar os melhores ambientes, o quanto antes. Assim como no basquete os melhores precisam seguir para a NBA, no futebol, os melhores precisam no mínimo sair daqui. Não temos nem um dos dez mais qualificados campeonatos do mundo. Ele pode ser dos mais interessantes para nós, brasileiros, pelo entretenimento, por sermos torcedores dos clubes. Mas nosso jogo é mais lento, tem mais interrupções, é mais desleal e tem arbitragem pavorosa. Além, claro, de romantizarmos uma relação por muitas vezes agressiva entre torcida e atletas. É um ambiente que é mais rico, mas que não é saudável.