Brasil

‘Armadilha’ e ‘abusiva’: especialistas avaliam briga entre Grêmio e Vitória por Lucas Esteves

Após o Grêmio efetivar o pagamento da multa por lateral ao Vitória, clubes devem travar batalha jurídica pelo jogador

A polêmica negociação entre o Grêmio e o Vitória pelo lateral-esquerdo Lucas Esteves ainda parece longe de ter um fim. Mas, de acordo com especialistas consultados pela Trivela, o resultado do imbróglio deve ser o mesmo: a ida do jogador para o Grêmio.

Na última segunda-feira (27), o Grêmio efetivou o pagamento da multa rescisória de Lucas Esteves com o Vitória, no valor de US$ 1 milhão (R$ 5,9 milhões).

No entanto, pouco depois, o clube baiano devolveu o dinheiro ao clube gaúcho e informou que iria acionar uma cláusula que permitiria ao Vitória renovar o contrato do jogador por US$ 100 mil caso algum outro time pagasse a multa rescisória.

Enquanto o Grêmio entende que cumpriu o que foi combinado com o Vitória, que, como publicado pelo “GE”, enviou o número da conta para o Tricolor fazer o depósito da multa rescisória, o clube baiano se prende a esta cláusula para tentar segurar Lucas Esteves. O jogador de 24 anos foi um dos destaques do time na campanha do último Campeonato Brasileiro.

No entanto, especialistas em direito esportivo consultados pela Trivela foram unânimes ao argumentarem que tal cláusula do contrato de Lucas Esteves não é juridicamente correta e deve ser anulada. Para Fernanda Soares, especialista e mestre em Direito Desportivo, este tipo de cláusula é inédito.

— Não vi (esse tipo de cláusula). A gente conversa com os colegas da área e ninguém tinha visto essa cláusula ainda. Pode ser que existe e a gente não tenha se deparado, mas, sinceramente, nunca vi. Essa cláusula me parece nula – disse Fernanda Sores à Trivela.

— Qualquer tipo de contrato, inclusive o esportivo, é feito com algumas cláusulas que vão explicar o cenário em que o contrato pode ser rescindido. Ele tem uma data de validade, um prazo, e pode ser encerrado antes do tempo, mas tem as condições — explicou a especialista e mestre em Direito Desportivo.

— Essa cláusula, na minha visão, está se impondo a lei. Você tem um cenário em que o contrato se desfaz, esse cenário aconteceu, e você tem essa cláusula desfazendo isso tudo. Entendo que é abusiva, limita a capacidade laboral do atleta — completou a especialista.

Lucas Esteves marcou dois gols e deu quatro assistências pelo Vitória em 2024 (Foto: Imago)
Lucas Esteves marcou dois gols e deu quatro assistências pelo Vitória em 2024 (Foto: Imago)

Especialista fala em ‘armadilha' do Vitória

Para Higor Maffei Bellini, especialista em Direito Desportivo e mestre em Direito pela PUC/SP, a cláusula no contrato de Lucas Esteves é uma “armadilha” para segurar o jogador. De acordo com o especialista, ela também deveria ser anulada.

— Não acho que é cláusula válida, não é legalmente válida. Ela rompe o princípio da multa contratual. A partir do momento que fixo um valor, já estou falando quanto eu quero para rescindir o contrato. Essa cláusula é nula. Serve para manter o atleta preso ao clube contra a vontade dele — afirmou Higor Maffei Bellini à Trivela.

— É uma forma de burlar a multa rescisória, o que não pode. Tira o direito do jogador de ir embora pela multa. A cláusula pode ser anulada. Ele vai contra o que está no ordenamento jurídico. É tipo uma armadilha — completou o especialista em direito desportivo.

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Advogados defendem direito do jogador deixar o clube pela multa

Os dois especialistas também concordaram com o direito do jogador deixar um clube pelo valor da multa. Para ambos, o atleta não pode ficar preso a um contrato contra a sua vontade — desde que a multa seja paga.

Ninguém é obrigado a permanecer em um contrato. Por isso que o contrato tem cláusulas que dizem como esse contrato pode se encerrar. O atleta não é obrigado a ficar no contrato com o Vitória. Se o atleta manifestar o desejo de sair, ele pode sair a qualquer momento. A condição é pagar essa cláusula indenizatória. Quem paga é o atleta ou o clube. Nesse caso foi o Grêmio. Pelo que está sendo veiculado, está tudo certo. O que o Grêmio fez está correto, previsto em lei — disse Fernanda Soares.

— O atleta é um ser-humano. Não é um objeto. A partir do minuto em que ele não quer mais defender um clube, ele tem o direito de ir para outro clube. Ele não pode ficar preso por uma multa que já foi paga — concordou Higor Maffei.

Especialista descarta aliciamento do Grêmio

Em nota publicada nesta terça-feira (28), o Vitória acusou o Grêmio de ter “aliciado” Lucas Esteves, lateral revelado pelo Palmeiras.

O clube baiano afirmou que tentou renovar o contrato com o atleta, mas lateral teria recusado por já ter conversas com o Tricolor gaúcho. Para Higor Maffei, a ação do Grêmio não configura “aliciamento”.

— Não vejo aliciamento. O Grêmio fez o que a lei estabelece. Pagar a multa. Se vai pagar a multa, não tem que negociar. Por isso não creio em punição ao Grêmio no CNRD. Se punir o Grêmio por pagar a multa, tem que revisar o ordenamento jurídico inteiro. Vão prender o jogador até onde quiser. Não vai ter mais passe no Brasil. A multa está pré-estabelecida. O Vitória quando estabeleceu essa multa, achou que estava bem pago — disse o advogado.

 

Lucas Esteves entra com ação e empresário critica o Vitória

Ainda nesta terça-feira, Lucas Esteves entrou com uma ação na Câmara Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) para tentar uma liberação do Vitória e se apresentar ao Grêmio. O jogador também pode acionar a Justiça do Trabalho para conseguir uma liminar para se desvincular do clube baiano.

Em longa nota publicada no X (Twitter), o empresário do jogador, Marcelo Robalinho, deu a sua versão sobre a negociação entre os clubes e o jogador. O agente relembrou outras ofertas que o Vitória recebeu pelo jogador, desde 2024, e tentativas frustradas de tentar uma valorização do seu jogador.

 

O empresário ainda revelou que o jogador foi comunicado pelos dois clubes sobre a conclusão da negociação e que ele já teria iniciado os trâmites para a mudança de cidade. No entanto, segundo Robalinho, “o Vitória aparentemente se arrependeu”, o que irritou o empresário.

— Paciência tem limite, jogador não é mercadoria para ser vendido e “não entregue”. A Lei Pelé foi editada justamente para acabar com a escravidão no futebol. Não existe OPÇÃO para não aplicação de cláusula de rescisão, isso seria revogar a Lei e voltar à escravatura — publicou Marcelo Robalinho, empresário de Lucas Esteves.

 

Foto de Gabriel Rodrigues

Gabriel RodriguesSetorista

Jornalista formado pela UFF e com passagens, como repórter e editor, pelo LANCE!, Esporte News Mundo e Jogada10. Já trabalhou na cobertura de duas finais de Libertadores in loco. Na Trivela, é setorista do Vasco e do Botafogo.
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