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Corinthians abusou das histórias de redenção no roteiro do título brasileiro

Uma história de redenção sempre cativa. Aquele herói que passar por muitas dificuldades, às vezes comete erros, mas, no final, dá a volta por cima e chega ao final feliz. Várias delas ao mesmo tempo pode ser cansativo em um filme ou um livro, mas não quando estamos tratando da vida real. O título que o Corinthians conquistou na última quinta-feira, após o empate por 1 a 1 com o Vasco, serviu como um momento de glória simbólico para muitos jogadores do elenco.

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De Vágner Love, um jogador com jogos pela seleção brasileira e Champions League, a Felipe, contestado pela torcida, passando por outros atletas de qualidade que sofriam com lesões ou falta de confiança antes da temporada começar, como Renato Augusto e Jádson, o Corinthians teve algumas interessantes histórias que seguem esse roteiro e que vamos contar a partir de agora. Eles, também, simbolizam a volta por cima que o próprio clube deu na temporada depois da eliminação para o Guarani, os salários atrasados e a ameaça de desmanche.

Renato Augusto

A comemoração de Renato Augusto ao marcar o segundo gol da seleção brasileira contra o Peru, na última terça-feira, transcendeu aquele momento, aquele lance e aquela partida. Para o jogador, vestir a camisa do Brasil e jogar bem eram as confirmações de que estava, finalmente, de volta a um nível de futebol que temia nunca mais alcançar. “Achei que nunca mais jogaria em alto nível”, afirmou, ainda no gramado de São Januário, durante a comemoração do título do Corinthians. “Achei que teria que jogar em um mercado mais abaixo, porque não conseguia jogar”.

O problema de Renato sempre foi físico, desde a época em que surgiu como uma grande revelação do Flamengo. O jogador que o senso comum chama de maneira pejorativa e cruel de “bichado”. Um exagero, evidentemente, mas ele tinha mesmo muita dificuldade para manter a forma. Durante os quatro anos e meio em que defendeu o Bayer Leverkusen, a temporada em que mais jogou foi a primeira, 2008/09, quando passou quase ileso das lesões e disputou 39 partidas. Na sequência, vieram os problemas no joelho e nos músculos: 18 duelos em 2009/10, 35 em 2010/11 e 23 em 2011/12.

O ano de 2013 foi um dos piores da carreira dele. Entrou em campo apenas 31 vezes na temporada brasileira, que tem muito mais jogos que a alemã. Marcou três gols, um para cada lesão séria que sofreu: cirurgia no joelho direito, estiramento na coxa dessa perna e uma fratura no rosto. Renato Augusto passou a trabalhar mais. Em 2014, fez uma pré-temporada maior que a dos companheiros, e durante a parada da Copa do Mundo, passou um mês fazendo trabalhos específicos. Ainda hoje, faz com frequência três períodos de treinamento para não dar sopa ao azar.

O departamento médico do Corinthians também tem o seu papel na recuperação dele. Identificou um desnivelamento muscular entre as duas pernas e o corrigiu. Desde o ano passado, usa meias especiais que lhe foram dadas pelos doutores alvinegros para melhorar a circulação na perna. O resultado? Jogou todas as partidas do Corinthians na Libertadores de 2015 e perdeu apenas cinco do Campeonato Brasileiro: três por lesão no tornozelo, uma por dor muscular e outra por causa de uma virose.

Já fez 47 partidas na temporada, marcou sete gols e deu nove assistências. O inferno ficou para trás.

Vágner Love
Vágner Love (Foto: Divulgação)
Vágner Love (Foto: Divulgação)

“Vou comemorar para c…” foram algumas das palavras de desabafo de Vágner Love depois do título brasileiro ter sido confirmado. Houve outras, como “não baixei a cabeça e continuei trabalhando” ou “sabia que Deus reservaria coisas boas”. O ano de Love foi uma grande montanha-russa que ele conseguiu terminar por cima. A missão sempre foi difícil. Tinha que substituir o ídolo Paolo Guerrero, autor do gol do título mundial.

A parte física foi um problema. Ele não fez pré-temporada com o Corinthians, mas com o “pessoal do time chinês”, como disse o preparador físico Fábio Mahseredjian. No primeiro semestre, jogou assim mesmo, mas foi afastado no final de maio para fazer trabalhos específicos. Em junho, ainda não estava 100% para jogar futebol, mas tinha que enfrentar as adversidades. Guerrero estava na Copa América e depois seguiria para o Flamengo.

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Nos três primeiros jogos do mês, Tite escalou Romero e Mendoza no ataque. Love entrou no segundo tempo. Em seguida, foi titular contra o Santos, marcou no Figueirense e na Ponte Preta, mas emendou uma sequência de seis jogos sem fazer gols, o que lhe tirou do time. Luciano voltava em alta dos Jogos Pan-Americanos, do qual foi artilheiro. O jovem de 22 anos agarrou a chance como ninguém: cinco gols em três partidas, contra São Paulo Sport e Avaí, com Love assistindo do banco de reservas.

Mas Luciano sofreu uma lesão séria nos ligamentos cruzados do joelho e ficaria fora da temporada inteira. Não teve jeito. Vágner Love teria que voltar a ser titular, e ele deu o seu recado logo no primeiro jogo, marcando duas vezes contra o Cruzeiro. Não saiu mais. Emendou 16 jogos seguidos em que marcou 10 vezes. Fez, inclusive, o gol do empate por 1 a 1 contra o Vasco na última quinta-feira.

O gol que o torna artilheiro do Corinthians no Brasileirão. O gol do hexacampeonato nacional. O gol da redenção.

Jádson
Jádson (Foto: Divulgação)
Jádson (Foto: Divulgação)

Jádson, talvez, tenha sido o mais literal: “Estou feliz por ter dado a volta por cima neste ano, que começou com desconfiança, pessoas desacreditando do meu futebol”. Isso não começou na última temporada, mas no seu retorno ao Brasil para defender o São Paulo, em 2012, depois de sete temporadas defendendo o Shakhtar Donetsk, um grande da Ucrânia e médio da Europa. No imaginário dos torcedores, havia também a qualidade que ele havia demonstrado pelo Atlético Paranaense.

O carinho na hora de tratar a bola não desapareceu em nenhum momento. O que parecia faltar era confiança. Os grandes momentos de Jadson no Morumbi eram ofuscados por muitas partidas em que aparecia pouco, arriscava pouco e jogava pouco. Tanto que ele foi envolvido em uma troca com Alexandre Pato. Dispensado pelo São Paulo sem muita cerimônia. Começou bem pelo Corinthians, no Campeonato Paulista, mas caiu de rendimento, junto com o restante do time, em um Brasileiro estranho sob o comando de Mano Menezes. O Timão classificou-se para a Libertadores ao mesmo tempo em que gerou muitas críticas da torcida.

Foram apenas sete gols e 12 assistências na temporada, e no Brasileirão, o torneio mais importante do ano, marcou apenas quatro vezes e deu três assistências. A fase também pesou em fevereiro, quando recebeu uma proposta milionária da China, e poderia deixar a pressão para trás, ganhar muito dinheiro e viver mais tranquilamente. Porém, pesou a ambição, e ele percebeu que o Corinthians estava destinado a grandes coisas. Preferiu ficar.

A decisão não poderia ter sido mais acertada. Jádson foi o grande jogador do time, ao lado de Renato Augusto. É vice-artilheiro do Campeonato Brasileiro, com 13 gols, ao lado de Vágner Love, e ninguém deu mais assistência e passe para finalização do que o meia, um maestro por excelência. Seus números cinematográficos devem pesar para ser eleito o craque da competição.

Felipe
Felipe (Foto: Divulgação)
Felipe (Foto: Divulgação)

Um time em má fase enterra a carreira de jogadores bons. Um em boa fase engrandece. Felipe não é tão bom quanto Gil, nem tão ruim quanto um beque de fazenda sem recursos técnicos. Era contestado pela torcida. Muito contestado. Tanto que o Corinthians contratou o experiente Edu Dracena, para ter um pouco mais de segurança na dupla de zaga. Edu Dracena foi colocado no banco pelo zagueiro de 25 anos.

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Felipe estava no Parque São Jorge desde 2012 e nunca havia se firmado. Jogou 15 vezes em 2013 e 18 em 2014. Ninguém confiava nele plenamente, nem treinador, nem torcida. Talvez nem ele mesmo. Mesmo no começo da atual temporada, ele não estava jogando muito bem. Era titular porque Edu Dracena não estava muito bem fisicamente e, quando entrava em campo, falhava ainda mais.

Não jogou as primeiras oito rodadas. Mas ganhou a posição depois da derrota por 1 a 0 para o Santos, e desde então, atuou os 90 minutos em todos os jogos que disputou, menos contra o São Paulo, quando foi expulso aos 37 do segundo tempo. Foi desfalque contra o Sport, na rodada seguinte, por suspensão, e esse foi um dos únicos dois jogos da campanha em que o Corinthians levou três gols. O outro foi o clássico contra o Palmeiras. Também por sanção disciplinar (terceiro cartão amarelo), não enfrentou o Fluminense.

O Corinthians tem a melhor defesa do Campeonato Brasileiro, com apenas 27 gols sofridos em 35 rodadas. E Felipe também foi responsável por isso, com cortes, desarmes e carrinhos.

Foto de Bruno Bonsanti

Bruno Bonsanti

Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de aterrissar no site que sempre gostou de ler (acredite, ele está falando da Trivela). Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.
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