Por que, para o mundo, Boca x River é muito maior que Flamengo x Corinthians
Clássicos nacionais aconteceram no mesmo dia, mas só o argentino foi destaque lá fora

No último domingo, houve o jogo entre o time com a maior torcida do maior país da América do Sul e o time de a maior torcida na maior cidade do continente. Com certeza, Flamengo x Corinthians se trata de um grande clássico — maior ainda porque foi uma partida importante, com consequências. A vitória de 4 a 0 levou o Flamengo ao primeiro lugar na tabela.
Mesmo assim, esse confronto de monstros passou despercebido em muitas partes do mundo, especialmente em comparação com um outro jogo que aconteceu quase no mesmo horário, menos de 2.000 quilômetros ao sul.
River Plate x Boca Juniors aparece na pauta de jornais e sites no mundo todo, mesmo sendo uma partida com pouca importância dentro da evolução do Campeonato Argentino.
Por lá, o título vai ser definido num sistema de play-offs. Já está mais que óbvio que os dois times vão se classificar para a fase decisiva. Risco zero, portanto, de eliminação. O River ganhou por 2 a 1. Mas o sonho de ser campeão fica bem vivo para os dois gigantes de Buenos Aires. Nada disso, porém, tira brilho, glamour e atenção global do chamado “superclássico”.

Como podemos entender essa discrepância? Por que, para uma audiência mundial, River x Boca tem muito mais ibope que Flamengo x Corinthians?
Duas explicações que favorecem Boca x River contra Flamengo x Corinthians
A primeira vem do fato inegável do papel da Argentina como quase um pai futebolístico para o restante da América Latina. Isso, claramente, tem a ver com questões da língua. Mas também, com a maneira que o esporte se desenvolveu mais rápido em Buenos Aires e Montevidéu que no Brasil.
Vale a pena lembrar que a seleção brasileira viajou para a Copa da Suécia em 1958 sendo considerada a terceira força do continente. Jogadores e técnicos argentinos iam para todo canto espelhando os seus conceitos e a sua cultura do futebol. Até para o Brasil.
Outro dia, eu estava lendo uma entrevista que fiz há muitos anos atrás com o Vavá, campeão do mundo em 1958 e 62. Me contou que a sua transformação em centroavante não foi tão difícil porque jovem, lá em Recife, ele tinha pegado os fundamentos da posição com técnicos argentinos.
O futebol argentino, então, olhava para fora, enquanto no Brasil, com o tamanho do país e o isolamento linguístico, a tendência sempre era de mirar para dentro — daí, durante muitos anos, o campeonato estadual era considerado mais importante que a Libertadores.
A seleção brasileira ainda vende a imagem de beleza para o mundo, mas no futebol de clubes não? 🧐
🎙️ @Tim_Vickery pic.twitter.com/Pv01dW3Hr8
— Trivela (@trivela) April 10, 2025
A segunda explicação é que Boca contra River traz uma narrativa fácil e fascinante. A verdade é que a base social das duas torcidas é quase igual. Mas no campo de símbolos, tem uma diferença enorme. Boca ficou no velho bairro popular, com as suas ruas estreitas. River nasceu ali, mas conseguiu o sonho do imigrante, e fugiu para as avenidas largas das zonas mais abastecidas.
A geografia moldou o gosto das hinchadas. A de Boca valoriza a entrega (tem que suar a camisa) enquanto a do River aprecia um toque refinado.
Esse mesmo conflito de classes sociais está presente em clássicos de quase todas as capitais do continente e fornece um roteiro para qualquer um em qualquer parte do mundo. Uma pergunta essencial no futebol profissional é a seguinte: quem está sendo representado? Com Boca e River, a resposta fica clara. Pode escolher o seu lado e torcer à vontade.
Mas será que vai ser sempre assim; um grande jogo na Argentina atraindo mais atenção que todos os clássicos brasileiros?
Aposto que não. River x Boca nunca vai perder o seu “tchan”. Porém, com mais dinheiro, mais estrelas, mais Libertadores, o futebol brasileiro vai seguramente conquistar mais visibilidade — começando com o Mundial de Clubes. Por exemplo, pode ser que depois de julho, vai ter muito mais interesse internacional em cada confronto entre Flamengo e Palmeiras.