América do Sul

Primeiro campeão chileno, o Magallanes conquista o acesso depois de 36 anos fora da elite

O Magallanes encerrou o longo período longe da elite e ainda por cima pode ir para a Libertadores, na final da Copa Chile

Durante as últimas temporadas, alguns dos maiores clubes do Campeonato Chileno flertaram com o rebaixamento. Pela via contrária, a segundona de 2022 celebra o acesso de um time tradicionalíssimo que atravessou longo período fora da elite. O Magallanes disputou 50 temporadas da primeira divisão e possui quatro títulos nacionais, todos na década de 1930. Mais do que isso, a agremiação faturou a edição inaugural do Campeonato Chileno e de uma cisão interna é que se originou o Colo-Colo, seu maior rival. Porém, os albicelestes permaneciam distantes da elite desde 1986. Nesta semana, o hiato de 36 anos fora da primeira prateleira se encerrou com o acesso do clube da cidade de San Bernardo. E a temporada pode render uma festa ainda maior, já que o Magallanes também avançou à final da Copa Chile, na qual enfrentará a Unión Española pelo título – e pela vaga na Libertadores, um torneio que não disputa desde 1985.

Fundado na região metropolitana de Santiago, o Magallanes é um dos clubes mais antigos do Chile, fundado por estudantes em outubro de 1897. O nome de Magallanes seria adotado em 1904, em referência à disputa territorial com a Argentina pelo Estreito de Magalhães, e naqueles primórdios o time disputava os campeonatos municipais de Santiago. Era uma força local, com cinco taças levantadas de 1908 a 1921. Não à toa, os albicelestes estavam entre as bases da seleção chilena nas primeiras edições do Campeonato Sul-Americano.

Durante a década de 1920, o Magallanes passou por uma cisão. Um grupo de jovens jogadores exigiam melhorias nas estruturas e nas condições de treinamento, mas não foram atendidos pelos dirigentes. Com isso, os rebeldes liderados por David Arellano fundaram o Colo-Colo. Logo na primeira temporada, em 1925, o Cacique conquistou a Liga Metropolitana. Até por isso foi importante o troco do Magallanes, que levou o troféu em 1926. Existia uma evidente rivalidade entre os dois clubes, no chamado Clássico da Chilenidade. O troféu conquistado pelos albicelestes, todavia, seria um ponto fora da curva em meio à crise institucional da metade final dos anos 1920.

Em 1933, o Magallanes se tornou um dos oito clubes que fundaram a Federação de Futebol do Chile, adotando o profissionalismo no país. Naquele mesmo ano foi realizada a primeira edição do Campeonato Chileno e os albicelestes se sagraram como primeiros campeões. A equipe se tornaria dominante naqueles primórdios da liga, ao emendar um tricampeonato em 1934 e 1935, antes de recolocar a mão na taça em 1938. Porém, as glórias minguaram depois disso. O Magallanes teve dois vices na década de 1940, e se distanciou de vez do topo da tabela posteriormente. Já os rebaixamentos se tornaram frequentes a partir dos anos 1960.

O primeiro descenso do Magallanes aconteceu em 1960, com o retorno em 1962. Depois, com nova queda em 1975, foram quatro anos até o retorno em 1979. Um breve momento de relevância seria retomado no início dos anos 1980. Os albicelestes chegaram a um terceiro lugar e conquistaram uma Liguilla Pré-Libertadores, que deu a vaga inédita no torneio continental em 1985. Não foi uma campanha brilhante dos chilenos, atrás de Peñarol e Colo-Colo em seu grupo. E o pior estava por vir, com o rebaixamento no Campeonato Chileno em 1986. Foi quando se iniciou o jejum.

O Magallanes não conseguiu subir mais para a primeira divisão do Campeonato Chileno nas décadas seguintes. Pior, a equipe passou dois anos na terceira divisão, entre 1994 e 1995, antes de emendar quatro campanhas na terceirona de 2007 a 2010. Um raro momento de alegria aconteceu em 2011, quando os albicelestes chegaram à decisão da Copa Chile e perderam nos pênaltis diante da Universidad Católica. Todavia, a expectativa ficava mesmo para a conquista do acesso de volta à elite. Uma espera de quase quatro décadas que finalmente se encerrou nesta temporada, com uma ótima campanha na segundona.

A principal ameaça ao Magallanes era o Cobreloa, outro clube tradicional e dono de taças da primeira divisão. Apesar disso, os albicelestes fizeram uma campanha soberana no topo da tabela. Apenas o campeão da segundona conquistaria o acesso direto e o clube de San Bernardo se manteve na dianteira em 30 das 32 rodadas. Entretanto, o Cobreloa chegou a ultrapassar os concorrentes a cinco rodadas do fim da campanha. Ao menos, o Magallanes se recuperou na partida seguinte e não deixou mais escapar a ponta. O acesso se confirmou na última terça-feira, durante a rodada final da competição, para consolidar a vantagem de quatro pontos sobre os alaranjados. Foram 22 vitórias dos campeões, donos do melhor ataque e da melhor defesa.

A conquista do Magallanes deixa em evidência o técnico Nicolás Núñez. Antigo jogador da Universidad Católica, o comandante tem apenas 38 anos e faz seu primeiro trabalho à frente de uma equipe profissional. Emplacou de imediato. Já em campo, o Magallanes mesclou veteranos e garotos da base. Um pacote de ex-jogadores do Palestino ajudou, como o meio-campista César Cortés, artilheiro da campanha aos 38 anos. Também há alguns estrangeiros – como o uruguaio Gastón Rodríguez, o argentino Fernando Piñero e o colombiano Yorman Zapata. Porém, ninguém se compara à história de Luis “Mago” Jiménez, em mais um feito para a carreira.

A trajetória de Jiménez no futebol é bastante respeitável, com 33 jogos pela seleção chilena e duas Copas América no currículo. O armador atuou por muito tempo na Itália, incluindo uma passagem pela Internazionale, e também no Oriente Médio. Sua volta mais recente ao Palestino foi bem-sucedida, com a conquista da Copa Chile em 2018 e participações nos torneios continentais. O capitão vinha de uma ótima temporada em 2021, a ponto de ser eleito o melhor jogador em atividade no país. E depois de anunciar a aposentadoria em maio de 2022, resolveu voltar para ajudar o Magallanes em julho. Mesmo reserva, deu sua contribuição.

A promessa de Mago Jiménez é se despedir do futebol na decisão da Copa Chile. Será uma grande ocasião para o Magallanes. A equipe eliminou Everton, Universidad de Concepción, Cobreloa e Huachipato em seu caminho à final. A Unión Española será o adversário de mais peso, mas dá para sonhar com o título no duelo marcado para o próximo domingo, em Rancagua. Seria a cereja do bolo para uma temporada dos sonhos ao Magallanes, que ainda pode render uma vaga na Libertadores.

Já na segundona chilena, resta saber quem ficará com a segunda vaga do acesso, nos playoffs que começaram neste final de semana. Por ter a segunda melhor campanha, o Cobreloa espera diretamente na final. Deportes Copiapó, Universidad de Concepción, Unión San Felipe e Deportes Puerto Montt são os outros concorrentes nos mata-matas. Caso o Cobreloa confirme o favoritismo, será mais um time de 38 participações na elite e oito títulos, que está longe da primeira divisão desde 2015, quando sofreu o inédito rebaixamento.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
Botão Voltar ao topo