O êxtase do Maracanã foi inútil: outra vez o Flamengo decepciona na Libertadores
Era um Maracanã vibrante. Aquele que um dia foi o maior estádio do mundo está diferente, mas segue com sua aura. Ainda mais quando a massa que mais sente o Maraca como sua casa lota as arquibancadas. O Flamengo parecia já ter passado pelas maiores provações nesta Libertadores, precisava apenas de uma vitória sobre o León para se classificar. Mas o simples como se imaginava não era tão simples de se fazer. Os rubro-negros tiveram ímpeto, tiveram coração. Não tiveram cabeça, a desorganização e as falhas pesaram. O León, que só precisava de um empate, saiu com a vitória por 3 a 2. O primeiro ‘Maracanazo’ da nova versão do estádio, deixando como vítima milhões de flamenguistas, eliminados da Libertadores.
A vitória por um gol de diferença sobre o Emelec no último final de semana era perigosa. Não pelo placar em si, longe disso. Era mais pelas sensações que transmitia. Nada suficiente para o Flamengo depender só de um empate na rodada final. E, da forma como aconteceu, dava uma confiança tremenda aos flamenguistas, até um pouco desnecessária. Sentimento esse que nem sempre é benéfico ao clube na Libertadores. Nos últimos 12 anos, o clube acumula vexames na competição continental. E, desta vez, nem foi em um mata-mata, como diante da Universidad de Chile, do América ou do Defensor. Pela terceira vez em suas seis últimas participações, o Fla cai na primeira fase.
A atmosfera fantástica criada pela torcida era um enorme impulso antes da bola começar a rolar. Os jogadores aplaudiam quando seus nomes eram gritados, Jayme de Almeida tinha lágrimas nos olhos à beira do campo. Só que a emoção não ajudou. Os gritos eram inúteis diante da falta de padrão dos rubro-negros. Havia empenho dos jogadores, sim, vontade em buscar o gol. Mas tudo isso não adiantava diante do amontoado de jogadores que era o Fla, longe de se comportar como um time.
O Flamengo precisava ter o controle do jogo, pressionar os adversários. Mas via o León dominar a posse de bola no meio-campo e, ele sim, tomar conta do relógio. Elano saiu machucado logo nos primeiros minutos, e até houve uma melhora na equipe carioca com a entrada de Gabriel. Porém, não da maneira que ela precisava. Os rubro-negros tinham velocidade e só. Deixavam um latifúndio para os mexicanos tomarem terra na intermediária. Os visitantes, cômodos na situação, abriram o placar com Arizala, em uma falha de André Santos no jogo aéreo.
Só que o coração rubro-negro voltou a pulsar rapidamente depois da parada. André Santos se redimiu aos 30, aproveitando uma saída errada do goleiro. E voltou a congelar quando Mauro Boselli ganhou auras de carrasco, logo no minuto seguinte, em outro erro pelo alto. Era um jogo eletrizante, não pelo futebol fino dos dois times, mas sim pela tensão que eles escancaravam dentro de campo. O gol de Alecsandro, deixando tudo igual novamente aos 34, chutando de canela, era a prova cabal de tudo isso. Não havia tática. A estratégia era o gol, seja lá como as pernas levassem a isso.
Uma ferocidade de Flamengo e León que não diminuiu no segundo tempo. Os cariocas queriam o gol da classificação, os mexicanos aquele que lhes desse tranquilidade. Enquanto Paulinho era um azougue pela esquerda e quase sempre parava nas faltas, Arizala deixava André Santos morto pela ponta direita dos alviverdes. Felipe tinha seu gol bem mais ameaçado do que Yarbrough, que só precisava ficar atento às bolas que insistiam em cruzar o espaço aéreo de sua área.
A racionalidade foi mínima no segundo tempo. E favorável ao León. O Fla atacava a esmo, dava lançamentos sem ter para quem, rodava a bola ao redor da área inimiga sem um que parasse e pensasse o jogo. Por mais que Muralha e Amaral sejam cães de guarda, estão longe do papel de volante que ponha o jogo sob seus pés. Como Carlos Peña. Coube ao principal jogador da equipe mexicana dar o golpe final, em um dos tantos contra-ataques que os visitantes tiveram. O gol que fez os espasmos dos flamenguistas se tornarem ainda mais ineficientes, coroou a partida tecnicamente superior dos mexicanos. Deixou o Maracanã lotado atônito. Emudecido, só recobrando a voz, de maneira tímida, depois do apito final.
Peña, Boselli e Arizala sentiram o que Cabañas e Montillo tiveram o gosto em outras edições da Libertadores. Transformaram o lendário estádio em cemitério, com a angustiante tristeza dos flamenguistas em mais um vexame na Libertadores. E, que diga-se, apenas com mais um capítulo da campanha desastrosa escrito hoje, tão amargo quanto o empate contra o Bolívar no mesmo Maraca. Este resultado, aliás, fundamental para os bolivianos terminarem na primeira colocação do grupo.
De todos os brasileiros que já conquistaram as Américas, nenhum vive um jejum maior que o Flamengo. Já são 33 anos, menos apenas que o Racing entre todos os que se sagraram campeões. Os rubro-negros se acostumam às eliminações tétricas na competição. É difícil imaginar uma razão que explique essa sequência, até porque não foi o tradicional ‘oba oba’, tão comum em outras quedas, que atrapalhou o time desta vez. Faltou mesmo qualidade para ser superior ao León, um time muito melhor organizado. Trabalho duro para que os flamenguistas se refaçam nos próximos meses com a Copa do Brasil ou com o Brasileiro, reconquistem a vaga na Libertadores e tentem, mais uma vez, mudar essa sina.
Fotos: Jorge Rodrigues