América do Sul

Luis Suárez protagonizou uma tarde para a antologia do clássico entre Nacional e Peñarol, por seu golaço e por seus gestos no Parque Central

Suárez marcou um gol fantástico e demonstrou carinho também aos membros do Peñarol, apesar das confusões que rondaram o clássico mais uma vez

O clássico entre Nacional e Peñarol ofereceu uma tarde para a história neste domingo, com tantos personagens e momentos inesquecíveis. Pela primeira vez em 93 anos os rivais se enfrentaram com público no Gran Parque Central, o que por si já era um fato singular. As emoções se afloraram em diversos momentos nas arquibancadas, da bela homenagem feita ao falecido Morro García organizada pelos tricolores à galinha inflável levada pelos visitantes aurinegros. Já dentro de campo, Luis Suárez reinou contra os carboneros, 16 anos depois de disputar seu último dérbi. O Pistoleiro comandou brilhantemente a vitória do Bolso por 3 a 1, com um gol memorável no início do segundo tempo. Segue invicto contra os maiores rivais em sua carreira.

A presença de Luis Suárez no clássico era transcendental. A ponto de um pequeno torcedor do Peñarol, com a camisa do clube, aparecer na saída do hotel dos jogadores do Nacional apenas para cumprimentar o ídolo. O Pistoleiro parou e falou especialmente com o menino aurinegro, no que transmitia uma mensagem de paz, diante dos costumeiros incidentes entre os rivais. Não evitou, porém, que os banheiros do Gran Parque Central fossem depredados pelos torcedores visitantes neste domingo – em retaliação ao que já havia acontecido no Campeón del Siglo.

Antes que a bola rolasse, a festa prevaleceu entre as torcidas. O Nacional realizou um mosaico tocante em homenagem a Santiago “Morro” García, ídolo do clube que faleceu há pouco mais de um ano, em meio à sua luta contra a depressão. A imagem imponente do centroavante surgiu entre bandeiras e fumaças coloridas. Já a torcida do Peñarol partiu para a provocação com uma galinha inflável que trazia o escudo do Nacional e as cores dos tricolores, bem como a palavra “filhos”. O adereço gigante foi exibido no segundo tempo e gerou uma briga entre torcidas, com rojões atirados – que eventualmente levaram à paralisação do jogo por sete minutos. A galinha inflável seria exposta no alto do alambrado e, depois da partida, queimada pelos anfitriões.

Dentro de campo, Luis Suárez tratou de transformar o clássico ao seu gosto. Desde os primeiros minutos, o veterano se apresentou bastante ao jogo e contribuiu à intensidade do Nacional. O goleiro Kevin Dawson conseguia evitar o pior para o Peñarol com suas boas intervenções. Neste momento, Luisito até agiu em defesa do arqueiro, seu companheiro de seleção, que teve objetos atirados contra si na primeira etapa. O centroavante pediu para que a torcida tricolor parasse de arremessar coisas em campo. E quando o futebol imperou, o Bolso comemorou seu primeiro gol nos acréscimos. Franco Fagúndez cobrou escanteio e Mathías Laborda saltou no meio da área para uma cabeçada firme.

Mais uma vez, Luis Suárez chamou atenção durante o intervalo por seu gesto de empatia. O craque trocou sua camisa com Walter Gargano, outro velho conhecido de seleção e referência do Peñarol, em novo sinal de amizade entre os times. Já no segundo tempo, sete minutos bastaram para o Pistoleiro assinar seu gol antológico. Depois de uma cobrança de lateral, o veterano esperou o quique da bola para soltar uma pancada de muito longe. Um chute lindo com a bola no alto, com o peito do pé, num canhotaço que só parou no ângulo. Surpreendido, Dawson não teve o que fazer. Na comemoração, Suárez se agachou do lado de fora do campo e depois saiu rindo, dizendo que “eu não”. Era uma resposta ao presidente do Peñarol, que pediu para Darwin Núñez ser titular da seleção na Copa. O camisa 9 reivindicava seu espaço.

Suárez chegou a se estranhar na sequência com Matías Aguirregaray e o Peñarol descontou aos 16, num tiro rasteiro de Kevin Méndez que beijou a trave antes de entrar. Contudo, o Nacional marcou o terceiro aos 30, numa jogadaça. Alfonso Trezza deixou de calcanhar e Camilo Cándido deu uma finta seca na marcação, antes de mandar a bola no canto. Os carboneros não mais reagiriam depois disso, com o goleiro Sergio Rochet também fazendo uma defesa importante na meta tricolor. Suárez era inegavelmente o protagonista, com três vitórias e um empate nos clássicos contra os aurinegros.

“Não posso me imaginar em outra tarde que não seja como a que terminamos hoje. Ganhar um clássico no Gran Parque Central tem um sabor especial que eu não havia experimentado, salvo com os juvenis. É lindo que possamos ganhar três pontos importantes e estou feliz por ajudar a equipe com um gol. Creio que é preciso ganhar os clássicos da melhor maneira possível, mas ganhar. Foi uma demonstração de que o Nacional teve personalidade, autoridade e intensidade, que é a maneira como se jogam essas partidas”, comentou Suárez. “Esse gol foi especial. Um gol em clássicos é especial, ainda mais sendo torcedor do Nacional. É um dos gols mais bonitos que fiz na minha carreira. Ficou lindo por acontecer aqui, com nossa gente”.

O Pistoleiro ainda comentou o encontro com o pequeno torcedor do Peñarol na saída rumo ao estádio: “Vi o menino, ele me chamou atenção e o futebol é isso: são crianças, independentemente da camisa que você veste eles entendem que você é uruguaio. Sou muito agradecido ao torcedor do Peñarol pela maneira como está me tratando, apesar de jogar no rival. E nem tenho o que falar sobre o torcedor do Nacional, pelo carinho que estão me brindando desde que cheguei”. Este é o terceiro gol de Suárez em cinco partidas pelo Campeonato Uruguaio desde que voltou ao país.

O resultado deste domingo ainda possui um peso muito maior ao Nacional, em busca do título no Campeonato Uruguaio. A equipe ocupa a segunda colocação no Clausura, com 15 pontos, três a menos que o River Plate. Campeão do Torneio Intermédio, o Bolso lidera com sobras a tabela anual e parte como favorito à fase final da liga nacional. Já o Peñarol é o quinto na tabela anual, 17 pontos atrás, e oitavo no Clausura, com apenas oito pontos. Verá de longe aquela que pode ser a consagração de Luis Suárez neste curto, mas apaixonado, retorno.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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