Cabeça fria e sangue quente, o Botafogo volta do Uruguai com uma vitória de peso
Não há adversário que intimide o Botafogo na Copa Libertadores da América. O time de Jair Ventura se acostumou a peitar camisas pesadas. Redescobriu seu tamanho no cenário internacional justamente ao ignorar as dimensões de tantos gigantes. E o sucesso dos alvinegros se escreve por sua grandeza de espírito, proporcionada pela pequenez da vaidade de uma equipe que se esfola em campo para garantir o resultado. Pelo caminho, os cariocas já tinham deixado para trás outros quatro campeões continentais. E, nesta quinta, se aproximaram da classificação contra o Nacional do Uruguai. Dentro do Gran Parque Central, a cancha mítica onde Abdón Porte tirou sua vida por amor aos tricolores, construída sobre o terreno no qual o libertador José Artigas foi nomeado ‘Jefe de todos los Orientales', os botafoguenses arrancaram o valioso triunfo por 1 a 0. Vantagem bastante significativa para o reencontro no Estádio Nilton Santos, que definirá o classificado às quartas de final.
Em Montevidéu, o Botafogo não mudou a sua identidade. Foi um time extremamente consciente de suas limitações e de suas virtudes, e por isso tão eficiente. O Nacional começou a partida tentando pressionar e se colocar no campo de ataque. Coube aos cariocas fecharem os espaços na defesa e oferecerem o combate. E desde os primeiros minutos já ficaria claro qual seria o plano monotemático dos tricolores: os cruzamentos. Quase deu certo aos 14, em desvio perigoso que bateu na trave, antes que o rebote pipocasse na pequena área e Gatito Fernández salvasse com a perna. Além disso, o Bolso reclamaria muito de um pênalti não assinalado pela arbitragem, em bola que bateu nos braços abertos de Victor Luís sem que nada fosse marcado.
Diante do cenário, o Botafogo jogava por uma bola fatal. Não tinha vergonha em dar bicões, conhecendo o seu mapa da mina. Tentava buscar o ataque principalmente pelos lados, com Rodrigo Pimpão se reafirmando como a estrela da sorte. E justamente ele iniciaria a jogada do gol decisivo, aos 37 minutos. O herói alvinegro cortou a marcação e lançou para Bruno Silva. O chute acabou prensado pela defesa, mas a sobra ficou limpa para João Paulo arrematar.
Antes do intervalo, o Nacional teria sua oportunidade mais clara de empate. Diante de uma falha de Emerson Silva, Sebastián Fernández aproveitou a brecha e tocou para Hugo Silveira, livre na marca da cal. O centroavante só precisava acertar as redes e correr para o abraço, mas chutou muito mal. Custaria caro. Mesmo com mais posse e finalizando mais, os tricolores eram pouco criativos. Inoperantes, sem a eficiência que fez a diferença do outro lado.
Durante o segundo tempo, o Nacional intensificou a pressão, cruzando à exaustão. Eram bolas e mais bolas na área, em uma jogada repetitiva, que parecia até rotina de treinamento. Melhor para o Botafogo, que superou os exercícios contínuos. Ainda mais seguros ao redor de sua área, os alvinegros mantinham uma solidez imensa. Gatito Fernández mal foi solicitado. Os cariocas primavam especialmente pela soberania no espaço aéreo. Joel Carli e Emerson Silva ganhavam a maioria dos lances pelo alto. Uma senhora partida dos defensores.
Do outro lado, quando tinha a bola, o Botafogo tentava esfriar o jogo em sua saída e buscava os contragolpes, mas mal conseguia escapar ao ataque. A concentração de todos na equipe era na proteção de sua meta. Numa rara bola que ofereceu a oportunidade do segundo tento, o goleiro Esteban Conde segurou firme o tiro de Roger. As alterações de Jair Ventura procuraram principalmente renovar as energias do meio para frente, mas, na prática, não funcionaram neste sentido. Serviram mais para entregar jogadores descansados que ajudassem contra a sequência estafante de cruzamentos do Nacional. Ao apito final, a comemoração aliviada.
O Botafogo tem suas carências nesta Libertadores. Há elencos mais fortes, assim como existem outras equipes mais vorazes no ataque. Nada que faça falta à grande campanha. O segredo dos alvinegros está na solidez que não se perde na defesa e na precisão que se repete na conclusão das jogadas. E, neste sentido, mais uma vez Jair Ventura precisa ser exaltado, pela maneira como seus jogadores cumprem o planejamento com uma dedicação explícita.
Apesar do bom resultado, obviamente, nem tudo está garantido ao Botafogo. Serão mais 90 minutos no Estádio Nilton Santos. Ainda assim, o cenário é favorável. O Nacional fatalmente precisará partir para cima, o que pode ajudar o plano de jogo dos alvinegros e abrir espaços aos contra-ataques. Além disso, a falta de repertório dos uruguaios chama a atenção. Fazer o simples tende a ser o suficiente aos botafoguenses. E eles já têm conseguido fazer isso rigorosamente bem.