A superação e a comunhão no Allianz Parque se gravam na alma do Palmeiras, numa batalha vencida já enorme para a Libertadores
O Palmeiras precisou de resiliência para segurar o Galo e avançar nos pênaltis, em noite que também será eterna para a mística de sua torcida
Um time não é bicampeão da Libertadores, de maneira consecutiva, sem uma grande força mental. O Palmeiras atravessou momentos de superação em suas duas últimas campanhas vitoriosas. No entanto, nada se compara à provação que os 180 minutos contra o Atlético Mineiro proporcionaram nestas quartas de final. O empate por 2 a 2 no Mineirão marcou a ressurreição dos alviverdes quando a partida parecia perdida, tirando uma diferença de dois gols. Já nesta quarta, uma memorável batalha no Allianz Parque exigiu muita resiliência dos palmeirenses. Danilo foi expulso no primeiro tempo, Scarpa no fim do segundo e, mesmo com nove homens, o time de Abel Ferreira suportou a pressão do Galo. Lutou pelos pênaltis, segurou o 0 a 0 e venceu na marca da cal, com o triunfo por 6 a 5 que leva os palestrinos para mais uma semifinal. Daquelas partidas que entram para a história do clube – por provar o caráter, por negar as probabilidades e por contar com uma enorme comunhão com as arquibancadas.
Weverton, gigante na história do Palmeiras, seria mais uma vez herói ao fazer defesas importantes ao longo dos 90 minutos e ainda pegar o pênalti decisivo de Rubens. O protagonista no Allianz Parque, ainda assim, foi sua torcida. Impressionou a maneira como os palmeirenses não abandonaram seu time por um minuto sequer, cantando até mais forte diante dos problemas que surgiam em campo. Se a campanha do bicampeonato é marcada por portões fechados ou arquibancadas parcialmente vazias, esta é a noite que se grava na mística dos torcedores palmeirenses.
E foi um jogo no qual, apesar de todos os entraves, o Palmeiras ainda conseguiu se sair melhor do que as circunstâncias sugeriam. Até a expulsão de Danilo, nenhuma das equipes conseguiu se impor. Depois disso, o Atlético Mineiro naturalmente buscou mais o ataque, mas os palestrinos se portaram bem na defesa com um a menos. Evitaram tantas chances aos adversários e até tiveram seus escapes. O vermelho para Scarpa tornava a situação pior e, a esta altura, a chance de chegar aos pênaltis soava como um alívio. Definitivamente, o respiro veio depois de acréscimos agonizantes, em que o Galo meteu bola na trave e Hulk perdeu a melhor oportunidade da noite. Já na marca da cal, depois de dez pênaltis perfeitos, Weverton se agigantou de novo e selou o épico. Um clássico imediato aos livros da Libertadores.
A única mudança do Palmeiras em relação ao primeiro jogo era a presença de Rony no comando do ataque. Vinha apoiado por uma trinca formada por Dudu, Raphael Veiga e Gustavo Scarpa. Outras referências como Weverton, Gustavo Gómez e Danilo desenhavam a espinha dorsal. Já o Atlético Mineiro contava com os importantes retornos de Guilherme Arana e Allan. Hulk aparecia no comando do ataque, apoiado por Keno, Zaracho e Ademir. Junior Alonso, apesar da lesão no Mineirão, estava de volta.
O primeiro tempo seria extremamente equilibrado desde os primeiros minutos. O Atlético Mineiro adiantou a marcação e conseguiu ficar mais no campo de ataque de início, mas sem chances claras. Ademir chegou a arriscar o chute, sem problemas para a defesa de Weverton. A alternância depois teria um momento melhor do Palmeiras, com cruzamento de Dudu que Arana precisou cortar na hora certa, antes que Scarpa chegasse. Scarpa também bateria cruzado aos 15, da entrada da área, mas a bola saiu ao lado da meta. Era um embate muito físico entre os dois times, em que as defesas não se descuidavam.
O jogo se concentrava na intermediária, com algumas faltas e nada além. Sem que os times sequer arriscassem tanto durante minutos, o lance capital ocorreu aos 28. Danilo deu uma solada na perna de Zaracho, de maneira imprudente, e inicialmente recebeu o amarelo. Porém, o árbitro Wilmar Roldán foi convidado a revisar o lance e resolveu punir a dureza da entrada, mostrando o vermelho. Os membros do Palmeiras se revoltaram na beira do campo, mas a decisão da arbitragem era compreensível. Teriam que passar mais de uma hora com um homem a menos. Quem cresceu foi a torcida, cantando ainda mais alto.
O Palmeiras não realizou alterações e até manteve sua força mesmo com a expulsão. Primeiro, Dudu bateu e Everson pegou. Já aos 34, numa falta cobrada para a área, Everson atropelou Gustavo Gómez e os alviverdes reclamaram muito de pênalti, mas foi anotado impedimento. O Atlético cresceu depois disso, controlando a bola e empurrando os palmeirenses para trás. Weverton salvaria seu time aos 38, quando Mariano cruzou e Hulk arrematou de primeira. O Galo tinha mais presença ofensiva, embora o confronto seguisse com alta dose de tensão e raríssimas brechas até o intervalo.
Os dois times voltaram sem trocas para o segundo tempo. O Atlético Mineiro seguia mais presente no campo de ataque, mas sem que suas investidas tivessem continuidade. O Palmeiras também encontrava dificuldades para sair, mas conseguia lidar razoavelmente bem com a inferioridade numérica. Cuca acionou seu banco aos nove minutos, com Nacho Fernández na vaga de Ademir. Os palmeirenses tinham seu respiro nas bolas paradas e assustaram aos 11, quando Everson saiu mal do gol e Zé Rafael finalizou ao lado da trave.
O Galo retomou terreno depois do breve susto e teve uma oportunidade de ouro aos 16. Mariano cruzou e Jair mergulhou de peixinho, mas a cabeçada saiu lambendo o poste. A equipe crescia, com mais pressão, aproveitando a movimentação de Hulk pelo lado direito. Aos 19, em outro aviso, Zaracho soltou a bomba e Weverton espalmou. Allan também mandou a sapatada de longe e o goleiro igualmente desviou para fora. Os atleticanos rondavam e o Palmeiras no máximo tentava contragolpes sempre frustrados. Novas substituições ocorreram aos 29, saindo Zaracho e Arana, com Rubens e Eduardo Sasha em campo.
Diante da falta de acerto do Atlético com as alterações, o Palmeiras voltou a dar sinais de vida, sob o canto forte de sua torcida. A aposta ficava para as bolas paradas, e um cruzamento de Scarpa atravessou perigosamente a área. Os alviverdes, porém, precisavam se concentrar mais na defesa e fazer o tempo passar. Vargas se tornou mais uma cartada ofensiva do Galo, aos 35, no posto de Keno. E num jogo que seguia pegado, o Palmeiras sofreu a segunda expulsão aos 37. Scarpa ia sofrendo a falta, mas na sequência deu uma entrada duríssima, com as travas da chuteira no tornozelo de Allan. Também recebeu o vermelho direto.
O Palmeiras pôde criar uma esperança logo depois da expulsão, quando ganhou uma falta no limite da grande área. Raphael Veiga bateu forte, mas carimbou a marcação. Era uma partida mais brigada que jogada, com nova confusão aos 43, numa sequência de lances mais firmes. Dudu e Hulk receberam o amarelo. O cenário ríspido era melhor aos alviverdes, que esperavam os pênaltis. E o time finalmente mudaria, com Mayke e Luan, saindo Dudu e Marcos Rocha.
O Atlético Mineiro precisava aproveitar os poucos minutos que restavam. Não conseguiu quando a sorte bateu à porta. O principal lance da noite ocorreu já aos 47. Numa roubada de bola, Vargas acelerou e entregou para Hulk. O atacante estava livre na esquerda, de frente com Weverton, mas tentou mandar no canto e bateu para fora. Erro doloroso aos mineiros. Logo depois, seria o azar que atrapalhou, num cruzamento de Hulk que passou por todo mundo e bateu na trave. O “quase” não era suficiente para evitar os pênaltis. No último minuto, os atleticanos também ficaram com dez homens, quando Vargas recebeu o segundo amarelo por reclamação. Wilmar Roldán não daria nem tempo para os palmeirenses cobrarem a falta rumo à área, o que gerou mais insatisfação.
A disputa por pênaltis apresentou um nível excelente nas cobranças. Um a um, os batedores iam convertendo – quase sempre com tiros indefensáveis. Hulk, Veiga, Nacho, Gómez, Jair, Zé Rafael, Sasha, Piquerez, Junior Alonso e Rony foram perfeitos nas dez primeiras batidas. Os goleiros não chegaram nem quando acertaram os cantos. A definição ficou para as alternadas. Rubens parou em Weverton logo no sexto chute do Galo, sem que o goleiro sequer desse rebote. A classificação então seria determinada por Murilo, num chute potente que permitiu a esperada explosão do Allianz Parque.
O Atlético Mineiro lamenta mais uma eliminação para o Palmeiras, num resultado que gera reflexão em Belo Horizonte. Se a derrapada no Mineirão não deveria ter acontecido, os problemas para aproveitar a vantagem numérica no Allianz Parque tornam tudo pior. O Galo está abaixo do que se viveu em 2021 e a Libertadores, o sonho da vez, fica pelo caminho. A derrocada atleticana, todavia, é a façanha do Palmeiras. O time não jogou bem, mas não é preciso amassar sempre para ser campeão. A superação vale muito mais e os alviverdes conseguiram isso de diferentes maneiras, em circunstâncias complicadas, lidando bem com as barreiras. A equipe de Abel Ferreira sai ainda maior para encarar Athletico Paranaense ou Estudiantes na semifinal.