Alemanha

‘Não teve explicação’: Nagelsmann fala sobre suicídio do pai, espião do Serviço de Inteligência

Julian Nageslamann, técnico da Alemanha, perdeu o pai ainda jovem

Atenção! O texto a seguir aborda assuntos que podem ser sensíveis para algumas pessoas, como depressão e suicídio. O CVV (Centro de Valorização da Vida) está à disposição para ajuda em casos de pensamentos autodestrutivos pelo telefone 188 e pessoalmente em postos de atendimento em todo o Brasil.

O técnico Julian Nagelsmann, hoje na Seleção da Alemanha, foi muito corajoso ao abordar o suicídio do pai em entrevista ao jornal alemão Der Spiengel nesta sexta-feira (23). O ex-comandante de Bayern de Munique e RB Leipzig contou que como foi complexa e dolorosa a perda, comunicada quando ele estava em um curso de treinadores.

– Tudo isso foi difícil e me marcou. Penso muitas vezes naquele dia. De repente tive que assumir o comando da família e tomar decisões difíceis, também para aliviar minha mãe. Naquela altura eu estava fazendo um curso de treinador em Oberhaching, perto de Munique. De repente, o diretor do curso me disse que o meu pai tinha cometido suicídio.

O pai de Nagelsmann, Erwin, trabalhava como espião no Serviço Federal de Inteligência alemão. Pela complexidade do trabalho, não podia abordar o assunto com a família, o que o sobrecarregou, como conta o técnico da seleção alemã.

– Meu pai tinha que tomar decisões repetidas vezes no trabalho, sabendo que todo o plano poderia dar errado. Ele não tinha permissão para falar sobre seu trabalho e essa também era a razão pela qual ele frequentemente disse que tudo era demais para ele. No seu trabalho não era possível compartilhar preocupações. No final, isso lhe causava muito estresse.

– Meu pai era um cara engraçado, que fazia piadas e estava sempre rindo, que gostava de estar com amigos, tocar violão e cantar. Mas eu acho que foi uma combinação da carga de trabalho com a sua condição geral. A pressão pela carreira dele era perceptível – relembrou Julian.

Nagelsmann, que só soube o trabalho de seu pai aos 16 anos, contou que Erwin não deixou nenhuma mensagem antes de partir.

– Ele não deixou bilhete de suicídio, não teve explicação. Mas a maneira como ele levou a vida deixou claro para mim que sua decisão era absolutamente clara para ele. Tudo isso é fatal para a família, mas me ajudou a entender que ele realmente queria morrer e não foi um pedido de ajuda ou um sinal. Acho que tenho que respeitar essa decisão.

Ironicamente, Erwin não era a favor do filho ser treinador, preferia que estudasse administração. Nagelsmann carrega do pai a importância de tomar decisões.

– Isso definitivamente me deu coragem para tomar decisões. A pior coisa na vida é quando você não as toma.

O técnico da Alemanha terá muitas decisões a tomar nos próximos meses. Após dois amistosos no próximo mês, a seleção começa a preparação para Eurocopa 2024, disputada em solo alemão entre junho e julho. Vale citar que o contrato do treinador finaliza ao fim do sétimo mês desse ano.

Uma oferta de ajuda

Caso você sofra de depressão ou possui algum entrave ligado à saúde mental, procure ajuda. Também o faça se você se sentir depreciado, com a autoestima baixa, desesperançoso com a vida e/ou se isolar das relações sociais. Não hesite em buscar auxílio ou o atendimento com um profissional – por exemplo, no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) de sua cidade ou região, ligado ao SUS, ou mesmo na Unidade Básica de Saúde mais próxima. Você também pode procurar o CVV, o Centro de Valorização da Vida. O canal realiza apoio emocional e prevenção ao suicídio. Através do número 188, atende gratuitamente pessoas que desejam conversar, sob total sigilo. O contato também pode ser feito pelo site oficial, por e-mail ou mesmo por Skype. Quando você pede ajuda, você: “é respeitado e levado a sério; tem o seu sofrimento levado em consideração; fala em privacidade com as pessoas sobre você mesmo e sua situação; é escutado; é encorajado a se recuperar”.

E se você conhece alguém em uma situação de risco, não deixe de procurar essa pessoa e de oferecer ajuda. O Ministério da Saúde também possui uma página em que orienta como identificar, agir e prevenir o suicídio. Reconheça os sinais, conforme a indicação da Superinteressante e do Ministério da Saúde: “frases ou publicações nas redes sociais que falem de solidão, culpa, apatia, autodepreciação, desejo de vingança ou hostilidade fora do comum; isolamento, não atendendo a telefonemas, interagindo menos nas redes sociais, ficando em casa ou fechadas em seus quartos, reduzindo ou cancelando todas as atividades sociais, principalmente aquelas que costumavam e gostavam de fazer; preocupação com sua própria morte ou falta de esperança, com sentimento de culpa, falta de autoestima e visão negativa de sua vida e futuro; diminuição ou ausência de autocuidado; aumentar o uso de álcool ou drogas, mudanças drásticas de peso, dirigir perigosamente; perguntas sobre métodos letais, como facas, armas ou pílulas; enaltecer e glamorizar a morte; desfazer-se de objetos pessoais e dar adeus”. Vale ressaltar que, embora não seja a maioria das pessoas doentes que cogita ceifar a própria vida, os transtornos mentais são um fator de risco ao suicídio. Em compensação, há sempre uma saída. O avanço da medicina ligada à saúde mental é significativo e a atenção dada pelo sistema público de saúde ao tema cresceu nos últimos anos.

Diante da possibilidade de ajuda, o Ministério da Saúde orienta “a encontrar um momento apropriado e um lugar calmo para falar sobre suicídio com essa pessoa. Deixe-a saber que você está lá para ouvir, ouça-a com a mente aberta e ofereça seu apoio. Incentive a pessoa a procurar ajuda de profissionais de serviços de saúde, de saúde mental, de emergência ou apoio em algum serviço público. Ofereça-se para acompanhá-la a um atendimento. Se você acha que essa pessoa está em perigo imediato, não a deixe sozinha. Procure ajuda de profissionais de serviços de saúde, de emergência e entre em contato com alguém de confiança, indicado pela própria pessoa. Fique em contato para acompanhar como a pessoa está passando e o que está fazendo”.

Segundo dados da OMS, “mais de 800 mil pessoas morrem por suicídio a cada ano em todo o mundo, o que equivale a uma morte a cada 40 segundos, sendo que a cada três segundos uma pessoa atenta contra a própria vida. No Brasil, foram 11.821 suicídios oficialmente registrados em 2012, o que representa, em média, 32 mortes por dia. Estima-se que o número de suicídios seja maior do que o registrado, devido ao estigma. Milhões de pessoas são afetadas pelo luto ao suicídio a cada ano. Estudos indicam que cada caso de suicídio tem sério impacto na vida de pelo menos outras seis pessoas de forma direta. Sentimentos ambivalentes são comuns em relação ao ente querido que faleceu de suicídio, como luto, raiva, culpa e outros. É importante aceitá-los como naturais, conversar com familiares e amigos, além de buscar atendimento médico e/ou psicológico, se necessário”. Não deixe de se abrir, se você enfrenta o luto por suicídio.

Este texto foi escrito seguindo orientações da Associação Brasileira de Psiquiatria e do Ministério da Saúde à imprensa, apoiado também em reportagem da BBC. Você, colega jornalista, pode se informar sobre a maneira de noticiar um suicídio através dos links.

Foto de Carlos Vinicius Amorim

Carlos Vinicius AmorimRedator

Nascido e criado em São Paulo, é jornalista pela Universidade Paulista (UNIP). Já passou por Yahoo!, Premier League Brasil e The Clutch, além de assessorias de imprensa. Escreve sobre futebol nacional e internacional na Trivela desde 2023.
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