Mainz rescinde contrato de El Ghazi, após publicação sobre conflito entre Israel e Hamas
O jogador havia sido reintegrado após suspensão, mas voltou às redes sociais com uma nova mensagem se distanciando de um comunicado do Mainz
O Mainz anunciou nesta sexta-feira que rescindiu o contrato do atacante holandês Anwar El Ghazi, que havia sido suspenso após uma publicação nas redes sociais sobre a guerra entre Israel e Hamas. O jogador de 28 anos havia sido reintegrado ao elenco no começo desta semana, mas na última quarta-feira se recusou a recuar no que havia dito. A mensagem trazia uma forte condenação das ações israelenses na Faixa de Gaza e também uma frase que pode ter conotação antissemita.
A publicação foi apagada. Segundo prints tirados pelo Bild e pelo Daily Mail, El Ghazi disse que quando um lado “bloqueia água, comida e eletricidade (…) tem armas nucleares (…) é financiado com bilhões de dólares (…) usa inteligência artificial para disseminar desinformação (…) e usa as redes sociais para censurar conteúdo do outro lado (…) não é um conflito e não é uma guerra, é um genocídio e uma destruição em massa que estamos testemunhando ao vivo”.
Essa é uma crítica legítima à violência da resposta israelense aos ataques terroristas do Hamas em 7 de outubro. No entanto, o problema é que El Ghazi terminou a mensagem com a frase “do rio ao mar, a Palestina será livre”. Ela se refere ao território entre o Mar Mediterrâneo, ao oeste de Israel, e o Rio Jordão, na fronteira leste com a Jordânia. Como os limites abrangem todo o território israelense, o slogan pode ser interpretado como uma rejeição da existência do Estado de Israel, ou até pior, sugerir a eliminação ou retirada dos judeus que vivem no país.
O Mainz tem uma sensibilidade adicional à questão judaica porque um de seus fundadores era Eugen Salomon, um judeu alemão que foi assassinado pelos nazistas no campo de concentração de Auschwitz.
Mainz suspende e reintegra El Ghazi
No dia seguinte, em 17 de outubro, o Mainz anunciou a suspensão de El Ghazi, após uma “profunda discussão com o jogador”, porque considerou que a posição que ele adotou sobre o conflito era “inaceitável”, citando que, embora “respeite que há diferentes perspectivas no complexo conflito no Oriente Médio”, o “clube claramente se distancia do conteúdo da publicação porque ele não reflete os valores do nosso clube”.
Em outra publicação naquele momento, El Ghazi escreveu que havia recebido “algumas mensagens negativas” e que queria deixar claro que sua posição era “paz acima de tudo”, pedindo “mais empatia” e um conhecimento mais profundo “sobre a história desse conflito”. Em 27 de outubro, quando ficaram fortes os rumores de que teria o contrato rescindido, voltou a se pronunciar condenando “o assassinato de todos os civis inocentes na Palestina e em Israel” e “simpatizando com vítimas inocentes do conflito, independentemente da sua nacionalidade”.
– Estou comprometido com uma região do Oriente Médio pacífica e integrada. Na medida em que minhas declarações anteriores nas redes sociais foram mal interpretadas, eu gostaria de deixar claro que defendo paz e humanidade para todos – disse.
Três dias depois, em 30 de outubro, o clube alemão informou em nota que, desde a suspensão, “durante várias conversas com a diretoria, El Ghazi se distanciou da sua publicação no Instagram, a qual ele próprio deletou depois de alguns minutos”. Acrescentou que “ele se arrependeu da publicação do artigo e de seu impacto negativo” e que “nesse contexto, El Ghazi também claramente se distanciou de atos terroristas como os do Hamas, que levaram a uma nova escalada da violência no Oriente Médio duas semanas atrás”.
– Ele enfatizou sua simpatia pelas vítimas do ataque e também a todas as vítimas deste conflito. Ele deixou claro que não questiona o direito de existência de Israel. A diretoria do clube claramente enfatizou a Anwar El Ghazi nas discussões que exige que seus funcionários se comprometam com os valores do clube. Isso implica uma responsabilidade especial para o Estado de Israel e ao povo judaico, que deriva da história da Alemanha, mas também da história do clube, com seu co-fundador judeu Eugen Salomon. Pelo comprometimento de El Ghazi, e o remorso que ele mostrou, a cultura do clube em lidar com erros exige que o jogador tenha a chance de reabilitação – disse.
Segundo uma fonte alemã com conhecimento do assunto consultada pelo site inglês The Athletic, El Ghazi se recusou a gravar um vídeo pedindo desculpas a pedido do Mainz. Talvez porque alega que grande parte do comunicado do clube não é bem verdadeiro.
El Ghazi volta às redes sociais
Um dia depois, na última quarta-feira, El Ghazi voltou às redes sociais com uma nova mensagem no Instagram, que segue no ar, esclarecendo a sua posição e se distanciando de vários pontos afirmados categoricamente no comunicado do Mainz.
– Para evitar dúvidas, meu comunicado em 27 de outubro de 2023 foi minha única e final declaração tanto para o Mainz quanto para o público em relação às publicações nas redes sociais feitas por mim nas últimas semanas. Qualquer outro comunicado, comentários ou pedidos de desculpas contrários a ele e atribuídos a mim não são factualmente corretos e não foram feitos ou autorizados por mim.
– Minha posição continua a mesma de quando tudo começou: sou contra guerra e violência, contra o assassinato de todos os civis inocentes, contra todas as formas de indiscriminação, sou contra islamofobia, sou contra antissemitismo, sou contra genocídio, sou contra apartheid, sou contra ocupação, sou contra opressão.
– Eu não me arrependo ou tenho remorso pela minha posição. Eu não me distancio do que eu disse e defendo, hoje e até meu último suspiro, pela humanidade e pelos oprimidos. Não devo responsabilidade especial a qualquer Estado. Eu não acredito que pessoas ou Estados estão além de questionamentos e responsabilidade, nem que estejam acima da lei internacional. Eu não tenho escolha a não ser continuar firme pela Justiça e testemunhar a verdade e faria isso mesmo se fosse contra mim mesmo, meus pais e meus parentes.
– Não pode haver qualquer justificativa para o assassinato de mais de 3.500 crianças em Gaza nas últimas três semanas. Como podemos, como mundo, permanecer em silêncio quando, de acordo com a caridade “Salve as Crianças”, uma criança está sendo morta a cada 10 minutos em Gaza? São nove crianças mortas enquanto eu disputo um jogo de futebol.
– Esse número está crescendo todos os dias. Eu, e nós como mundo, não podemos continuar calados. Precisamos pedir o fim das mortes em Gaza imediatamente – completou.
Mainz demite El Ghazi
O Mainz foi às redes sociais com outro comunicado dizendo que “não conseguia entender” e “estava surpreso” com os comentários de El Ghazi em relação ao clube e que “examinaria os fatos do ponto de vista legal e avaliaria a situação”. Acrescentou que o jogador não estava treinando porque havia pedido uma licença médica na última segunda-feira.
1. FSV Mainz 05 statement regarding social-media post by Anwar El Ghazi. pic.twitter.com/dLgFgwgl8C
— Mainz 05 English (@Mainz05en) November 1, 2023
Nesta sexta-feira, anunciou a rescisão de contrato de El Ghazi com um curto comunicado.
– O Mainz terminou o contrato de Anwar El Ghazi, com efeito imediato, nesta sexta-feira. O clube tomou essa medida em resposta aos comentários e publicações do jogador nas redes sociais – disse.
Ex-jogador de Ajax, Lille, Aston Villa, Everton e PSV, El Ghazi foi contratado sem taxa de transferência pelo Mainz e disputou três rodadas da Bundesliga, da qual o clube é lanterna, com três pontos em nove jogos.
O agravamento do conflito entre Israel e Hamas começou em 7 de outubro, quando soldados do grupo islâmico cruzaram a fronteira de Israel e mataram 1.400 pessoas, a maioria civis, e tomaram 200 reféns. Israel retaliou com fortes bombardeios e uma operação por terra que, segundo autoridades sanitárias de Gaza, matou mais de 9.000 pessoas incluindo 3.760 crianças e 2.325 mulheres.