Africa

Moçambique confiou nos ídolos locais e voltou à Copa Africana depois de 14 anos

Moçambique não disputava a CAN desde 2010 e se torna o quarto país lusófono na próxima edição do torneio, um recorde

A Língua Portuguesa será corriqueira na próxima Copa Africana de Nações, que acontecerá na Costa do Marfim a partir de janeiro. Moçambique garantiu sua classificação para o torneio e será o quarto representante lusófono na edição de 2024 – um recorde na história da CAN. Mesmo como berço de Eusébio, o país possui participações apenas pontuais na fase final da Copa Africana, chegando a cinco aparições, mas não disputava o torneio desde 2010. A vaga desta vez acabou confirmada num confronto direto pela última rodada do Grupo L: em Maputo, os moçambicanos fizeram sua parte com a vitória por 3 a 2 sobre Benin. Os Mambas dependiam apenas do empate, mas ainda assim buscaram o triunfo com um gol nos acréscimos do segundo tempo. O time é treinado pelo idolatrado Chiquinho Conde, que disputou três CAN's nos tempos de jogador, e capitaneado por Domingues, que segue na ativa aos 39 anos, como um dos remanescentes do time de 2010.

A comunidade lusófona na África já tinha garantido presença na CAN 2024 através de Cabo Verde, Guiné-Bissau e Angola. Moçambique engrossa a lista. A única ausência entre os lusófonos será de São Tomé e Príncipe, que ainda chegou à fase principal das eliminatórias, mas era o time de pior ranking entre todos os classificados e ficou na lanterna de sua chave. Diante da falta de força dos insulares, a classificação para o torneio não parece palpável no curto prazo.

Até então, nunca a Copa Africana de Nações tinha visto mais do que duas seleções lusófonas se classificarem para a mesma edição. O aumento no número total de participantes no torneio auxilia, claro. Mas a ampliação atual reflete o fortalecimento de Cabo Verde e Guiné-Bissau desde a última década, bem como a recuperação de Angola e Moçambique. O detalhe é que os Mambas concentram seu elenco em jogadores nascidos no próprio território, com uma presença mais limitada de descendentes de moçambicanos de outros países.

A história de Moçambique na Copa Africana

Moçambique disputa as eliminatórias da Copa Africana de Nações desde os anos 1980, após sua independência. Até então, os principais talentos nascidos no território moçambicano brilhavam com a seleção de Portugal, com os exemplos mais célebres de Eusébio e Mário Coluna. Em 1986, os Mambas se tornaram os primeiros lusófonos a estrearem em uma edição de CAN. Moçambique tirou a Líbia nas eliminatórias e caiu na fase de grupos, com três derrotas. Entre os destaques do time estava Chiquinho Conde, o atual treinador da equipe nacional. O então atacante de 20 anos se projetava numa carreira que o levaria posteriormente a clubes tradicionais de Portugal – como Belenenses, Vitória de Setúbal e Sporting. O atacante também brilhou nos primórdios da MLS.

A volta de Moçambique à Copa Africana aconteceu em 1996 e 1998. Foram edições especiais aos lusófonos, com as primeiras aparições de Angola no torneio. Os Mambas se classificaram ao lado dos Palancas Negras para a CAN 1996, num grupo das eliminatórias em que desbancaram Guiné e Mali. Os moçambicanos caíram na fase de grupos, mas conquistaram seu primeiro ponto num empate com a Tunísia na estreia. Já na CAN 1998, Moçambique ficou zerada na lanterna em sua chave. Chiquinho Conde novamente era a referência naquelas equipes moçambicanas. O time de 1998 ainda tinha os jovens atacantes Tico-Tico, um dos grandes ídolos do Jomo Cosmos na África do Sul, e Dário Monteiro, importante na história da Académica de Coimbra.

Por fim, a participação mais recente de Moçambique aconteceu em 2010. Era uma edição particular da Copa Africana por acontecer pela primeira vez num país lusófono, Angola. Moçambique passou na mesma chave das eliminatórias em que a Costa do Marfim liderou. Porém, de novo o time terminou na lanterna de seu grupo na fase final, com o único ponto conquistado num empate contra Benin. Tico-Tico e Dário Monteiro continuavam como medalhões no ataque, num elenco com mais jogadores em atividade fora do Campeonato Moçambicano. O lateral Paíto (Sion) e o volante Simão Mate (Panathinaikos) eram outros destaques.

- - Continua após o recado - -

Assine a newsletter da Trivela e junte-se à nossa comunidade. Receba conteúdo exclusivo toda semana e concorra a prêmios incríveis!

Já somos mais de 3.200 apaixonados por futebol!

Ao se inscrever, você concorda com a nossa Termos de Uso.

Como chega o time atual

Moçambique vinha de seis edições da Copa Africana de Nações sem se classificar para a fase final. Os Mambas chegaram perto em 2013, quando venceram Marrocos por 2 a 0 na ida do confronto decisivo, mas tomaram de 4 a 0 na volta em Marrakech. Já em 2019, os moçambicanos levaram a pior no confronto direto com Namíbia, igualados em pontos no mesmo grupo. Na rodada decisiva, um empate com Guiné-Bissau na visita aos irmãos lusófonos custou a vaga dos Mambas e garantiu a passagem dos Djurtus, ao lado da Namíbia.

Já na atual edição das eliminatórias, Moçambique estava no Grupo L, ao lado de Senegal, Benin e Ruanda. O empate dos Mambas na estreia em casa contra Ruanda era ruim, mas o time venceu Benin na rodada seguinte em Cotonou. As duas derrotas para Senegal eram esperadas, até que os moçambicanos vencessem também Ruanda por 2 a 0 em Butare. Antes da rodada final, Moçambique vinha com sete pontos, contra cinco de Benin. Um empate bastaria aos Mambas para garantirem a classificação na chave, ao lado de Senegal já garantido na fase final.

Neste sábado, Moçambique tomou um susto aos 20 minutos, quando Benin abriu o placar em Maputo, num pênalti convertido por Steve Mounié. A virada dos Mambas veio de maneira rápida. Witi empatou aos 27 minutos, com um chute seco na gaveta, e também serviu Guima no segundo, aos 31, com uma boa infiltração. Benin voltou a igualar o marcador aos cinco do segundo tempo, num míssil de Jodel Dossou no cantinho. Os moçambicanos precisavam segurar o resultado e tomaram alguns sustos, enquanto também perderam jogadores por lesão. O alívio veio mesmo aos 50, com a confirmação da vitória por 3 a 2. Clésio Baúque entrou sozinho na área e anotou o gol que leva de volta os moçambicanos para a Copa Africana de Nações.

O elenco atual de Moçambique tem seus principais jogadores no Campeonato Português. O volante Guima defende o Chaves, onde também atua o lateral Bruno Langa. O ponta Witi é nome frequente no Nacional da Madeira. Olho ainda no ala Geny Catamo, que começa a temporada como titular do Sporting, aos 22 anos. Já o herói Clésio Baúque faz sua fama no Honka, da Finlândia. Vale lembrar que a principal estrela moçambicana na atualidade está ausente: o lateral Reinildo Mandava, que se recupera de lesão. O jogador do Atlético de Madrid faz de tudo um pouco nos Mambas, entrando até no meio-campo e também no miolo de zaga.

Além do mais, Moçambique se escora na experiência de outras aparições na Copa Africana de Nações. O elenco atual conta com dois veteranos presentes na CAN 2010: o zagueiro Edson Mexer e o meia Domingues. Aos 39 anos, Domingues fez sua carreira praticamente inteira no Campeonato Sul-Africano. Conquistou quatro títulos da liga local, por três clubes diferentes, e chegou a ser eleito o melhor da competição em 2008. Dono da braçadeira de capitão dos Mambas, o armador também é o único moçambicano da história a superar as 100 partidas pela seleção. É um gigante, que desde 2021 tem a orientação do lendário Chiquinho Conde como treinador. Duas figuras fundamentais à história do futebol no país, que terão mais uma CAN para elevar seus nomes. Quem sabe, para buscar a primeira vitória dos moçambicanos no torneio.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
Botão Voltar ao topo