É diferente fazer uma final na Champions e dominar a Europa

A tentação é grande. Já há uns anos, a Bundesliga tem despontado como a liga-modelo da Europa. Dá esperança de competição para a classe média (está ouvindo, Espanha?), estádios lotados (está ouvindo, Itália?), pouco dinheiro de origem suspeita (está ouvindo, Inglaterra?), incentivo ao desenvolvimento de jogadores locais (continua ouvindo, Inglaterra?) e um estilo de futebol atraente (continua ouvindo, Itália?). Assim, monopolizar a final da Liga dos Campeões soa como consequência natural, um sinal de que o domínio alemão realmente chegou.
Não tão cedo. Muitas das virtudes da Bundesliga ajudaram a impulsionar Bayern de Munique e Borussia Dortmund à decisão continental. Mas o surgimento de uma final doméstica – será a quarta da história – tem muito a ver com as circunstâncias de uma edição de um torneio. A análise sobre o real estado do futebol de um país tem de ser feita separadamente.
Basta conferir o que ocorreu nas vezes em que a final da Champions teve dois times de um mesmo país. Curiosamente, cada uma envolveu uma liga diferente: Espanha em 1999/2000 (Real Madrid x Valencia), Itália em 2002/03 (Milan x Juventus) e Inglaterra em 2007/08 (Manchester United x Chelsea). Vejam quantos times desses países chegaram às quartas de final da Champions e da Copa da Uefa/Liga Europa no ano da decisão local, nos dois imediatamente anteriores e nos dois posteriores.
Veja que a presença de times em uma decisão nem sempre tem a ver com um domínio geral. Os italianos pré-2003 não tinham presença massiva na reta final das copas europeias antes de dominarem a decisão da LC. Aliás, sequer haviam ficado entre os oito melhores nos dois anos anteriores. Foi como se a temporada 2002/03 surgisse de geração espontânea. Claro que não foi, mas por trás do Milan x Juventus de 2003 não havia uma superioridade da Serie A como liga em si, como ocorreu nos anos 80/90.
A Juventus acertou os ponteiros de um time que já era forte e havia decepcionado nos dois anos anteriores, enquanto que Milan e Internazionale investiram muito em reforços naquela temporada. Mas as campanhas dos times médios na Copa da Uefa seguiram discretas, e mesmo os grandes acabaram não se sustentando e, menos de dez anos depois, a liga italiana vivia um de seus piores momentos desde o início da década de 1980.
No caso da Inglaterra, a decisão doméstica de 2008 foi consequência de um processo real de domínio estrutural em relação aos demais países da Europa. Com Barcelona e Real Madrid em momento de transição, os ingleses conseguiram usar a riqueza da liga como um todo para montarem equipes muito mais estáveis e competitivas. Em três anos seguidos, a Premier League teve três semifinalistas da Champions. O modelo ainda é forte, mas foi minado quando até os zilionários investidores sentiram um pouco a crise mundial.
Os motivos que levaram os espanhóis a monopolizar a final da Champions em 2000 são outros. O Real Madrid vivia um momento de grande riqueza, mas o Barcelona tentava se encontrar. O que realmente fez a Espanha ganhar terreno foi o dinheiro que passou a jorrar nos times médios com o crescimento econômico do país. O Valencia chegou a duas decisões da LC, mas Deportivo de La Coruña e até o Alavés chegaram longe. Um sistema que não se sustentou, sobretudo quando mudou o método de negociação dos direitos de TV em La Liga.
O que diferencia Espanha de 2000 e Inglaterra de 2008 da Alemanha de 2013 é o motivo da força. As ligas espanhola e inglesa ganharam espaço quando o dinheiro se multiplicou em seus clubes. E caiu quando se reduziu. Os alemães têm duas equipes muito fortes, e Bayer Leverkusen e Schalke – que já estiveram em semifinais da Champions neste século – podem se somar a eles no topo na próxima temporada, mas o que estrutura a Bundesliga não é o excesso de dinheiro. É a distribuição dele.
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Para ter um campeonato sustentável, a Alemanha inibe a chegada de milionários excêntricos que tragam reforços galáticos. Preferem investimentos dentro da realidade de cada clube e revelação de jovens. É ótimo para o futebol local, mas diminui o poder de competitividade diante de outros países. Tanto que Schalke e Borussia Mönchengladbach foram eliminados na atual Liga dos Campeões por Galatasaray e Dynamo de Kiev, duas equipes longe de serem consideradas potências continentais.
Por isso, a final germânica da LC 2013 não deve se tornar regra. Ela ocorre agora porque o Dortmund e Bayern fizeram trabalhos eficientes e conseguiram avançar no torneio nesta temporada. Nem sempre isso ocorrerá, e não parece que haverá uma invasão nas copas europeias. E os alemães não estão se importando muito com isso, porque sabem que isso não desmerecerá o trabalho de estruturação da Bundesliga.
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